//Quebra do diálogo social trouxe mais desigualdade

Quebra do diálogo social trouxe mais desigualdade

A redução do número de trabalhadores abrangidos pela contratação coletiva tem andado a par com o aprofundamento da desigualdade em vários países europeus nas últimas décadas. Não é coincidência, defende a federação sindical europeia UNI Europa, que representa sete milhões de trabalhadores europeus do setor de serviços, e que apela a novas políticas públicas para reativar o diálogo social.

“O que vemos em vários exemplos – os principais são os do Reino Unido, Irlanda, Alemanha – é que a partir do momento em que a negociação coletiva começa a cair assistimos também ao início de um aumento das desigualdades”, aponta Stan de Spiegelaere, investigador da Universidade de Ghent, na Bélgica, e autor do estudo, publicado nesta última semana, que põe em paralelo o recuo na negociação coletiva e o crescimento da percentagem de rendimentos detida pelos 10% mais ricos em vários países. A análise atravessa décadas, estacando antes da pandemia, por falta de dados para todos os países.

O caso do Reino Unido, ainda membro da União Europeia no período analisado, é onde a correlação é mais evidente. De uma taxa de cobertura de convenções coletivas de 75% em meados da década de 1980 passou a 27%, em 2019. A percentagem de rendimentos entre mais ricos passou de 31% para 36%. Na Alemanha, no mesmo período, passou-se de uma cobertura de 85% para 54%, enquanto a concentração de rendimentos passou de 29% para 38%.

França e Bélgica são exemplo oposto. A cobertura da negociação coletiva francesa passou de 90% para 98%, com o indicador de desigualdade a subir de 29% para 32%, mais contido. Já na Bélgica, a cobertura manteve-se inalterada ao longo das décadas em 96%, acontecendo o mesmo com a fatia de rendimentos do 10% mais ricos, nos 32%.

No caso de Portugal, está o exemplo de um país que ficou mais desigual ainda que sem grandes alterações na cobertura global da contratação coletiva. O estudo aponta uma quebra de cobertura de apenas 75% para 74%, com o indicador de desigualdade a escalar de 34% para 38% no mesmo período.

Se há razões estruturais que têm deprimido o diálogo social – como o crescente número de trabalhadores de serviços, com menor representação sindical do que os das indústrias – a UNI Europa defende que o fenómeno tem sido talhado pela mão dos governos e respetivas políticas. “Cabe por isso às políticas restaurarem a negociação coletiva se queremos pôr de parte sociedades desiguais”, advoga.