O ex-ministro das Finanças Fernando Teixeira dos Santos assumiu quarta-feira que “todos” falharam na Caixa Geral de Depósitos (CGD), incluindo gestão e políticos, apontando ainda à “informação insuficiente” e a sistemas pouco robustos.
“No geral, todos falhámos. Todos nós tivemos as nossas falhas no meio disto tudo”, reconheceu Teixeira dos Santos ao responder à última pergunta da última audição da segunda comissão parlamentar de inquérito à recapitalização e gestão do banco público.
Em resposta ao deputado Paulo Sá (PCP), que tinha perguntado “quem falhou” e manifestado esperança de que o ex-ministro das Finanças não se refugiasse na crise durante a sua resposta, Teixeira dos Santos acabou por admitir responsabilidades e falhas, mas partilhadas. “Em primeiro lugar, porque tínhamos informação insuficiente ou deficiente. Em segundo lugar, porque se calhar não tínhamos modelos ou sistemas tão robustos – como hoje felizmente temos na governação das entidades – que permitissem uma melhor deteção, alertas prévios mais cedo (…) de situações de risco, para as prevenir”, afirmou o ex-ministro das Finanças.
“Não estávamos equipados com esses modelos e falhámos também por isso”, considerou Teixeira dos Santos, acrescentando que “a falta de experiência” de “nunca” ter vivido uma crise como esta também constituiu um fator de falhanço, pois “saber o que fazer numa situação de crise como esta é problemático”.
Fernando Teixeira dos Santos, ex-ministro do Governo liderado por José Sócrates (PS), considerou que houve falhas “em todos os domínios: na gestão e políticas também”. “Assumo-as, senhor deputado”, respondeu a Paulo Sá, dizendo não querer “acreditar que alguém tenha querido falhar de propósito para causar dano”.
Teixeira dos Santos assegurou também ter procurado pautar o seu posicionamento e conduta “invocando a Lei”, e seguindo o seu entendimento das “obrigações de não ingerência e não interferência” no “papel autónomo e independente de uma administração de um banco”.
“Não devo nada ao engenheiro Sócrates”
O ex-ministro das Finanças afirmou no parlamento que não deve nada a José Sócrates e revelou que não fala com o antigo primeiro-ministro há seis anos. “Eu não devo nada ao engenheiro Sócrates. Sejamos claros quanto a isso”, respondeu Fernando Teixeira dos Santos ao deputado do PSD Duarte Marques no final da audição na comissão parlamentar de inquérito à recapitalização e gestão da Caixa Geral de Depósitos (CGD).
“Não falo com o engenheiro Sócrates há seis anos. E praticamente estivemos de relações cortadas desde o dia 6 de abril [de 2011], que foi o dia de pedido de ajuda [externa]”, acrescentou o ex-ministro das Finanças.
O atual presidente do banco EuroBic revelou que depois de sair do Governo, o ex-primeiro ministro “fez uma abordagem ‘vamos um para cada lado, escusamos de estar zangados'”, mas que só se cruzou com Sócrates “uma vez, num jantar promovido pelo Jornal de Notícias no Porto, em que ele foi apresentar o seu livro”. “Foi a única vez desde que saí do Governo que eu me cruzei com o engenheiro Sócrates. Falámos nesse período meia dúzia de vezes ao telefone. Quando ele regressou de Paris e tinha um programa em que intervinha e comentava na televisão, telefonou-me para perguntar a minha opinião sobre isso”, revelou Teixeira dos Santos.
O ex-ministro de Sócrates acrescentou que “desde o dia 23 de outubro [de 2013], que foi o dia em que ele lançou o livro dele aqui em Lisboa, fiz-lhe um telefonema e nunca mais lhe falei desde aí”.
Na audição de hoje, Fernando Teixeira dos Santos reiterou o que tinha dito na fase de instrução na Operação Marquês, afirmando novamente que José Sócrates o tinha alertado para as repercussões políticas da escolha de Armando Vara para administrador da CGD.
Teixeira dos Santos é uma das cinco testemunhas arroladas por José Sócrates para prestar esclarecimentos nesta fase do processo, apesar de ter sido uma das mais de 200 inquiridas pelo Ministério Público na fase de inquérito. Sócrates está acusado de corrupção passiva de titular de cargo político, branqueamento de capitais, falsificação de documentos e fraude fiscal qualificada.
Entre outras imputações, o Ministério Público acredita que o antigo primeiro-ministro recebeu cerca de 34 milhões de euros, entre 2006 e 2015, a troco de favorecimentos a interesses do ex-banqueiro Ricardo Salgado no Grupo Espírito Santos e na PT, bem como para garantir a concessão de financiamento da CGD ao empreendimento de luxo Vale do Lobo, no Algarve, e por favorecer negócios do Grupo Lena.
A audição a Fernando Teixeira dos Santos foi a última da segunda comissão parlamentar de inquérito à recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e à gestão do banco, como é oficialmente designada. Segue-se agora o período de elaboração do relatório por parte do relator, o deputado João Almeida (CDS-PP), com data de entrega indicativa de 15 de julho, e posterior debate sobre o seu conteúdo, no dia 19.
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