//Quem tem medo de ceder os seus dados? Grandes empresas sugerem que a solução é “humanizá-los”

Quem tem medo de ceder os seus dados? Grandes empresas sugerem que a solução é “humanizá-los”

A solução para dar a volta à tendência mundial de má fama das empresas que se dedicam ou incorporam departamentos de “big data” pode ser simples. “Temos de humanizar os dados”, disse à Renascença Joaquim Bretcha Boix, diretor de negócios internacionais da Netquest, uma empresa espanhola de pesquisas de mercado.

“O bom, o mau e o futuro da ‘big data’”: foi este o sugestivo nome de um painel desta terça-feira da Web Summit, em Lisboa. No palco, estavam representantes de empresas de publicidade, estudos de mercado, venda de produtos farmacêuticos e comunicações, de gigantes da publicidade estática como a JCDecaux e das comunicações, como a AT&T.

Pode parecer uma solução paradoxal: afinal de contas, o termo “big data” inclui em si mesmo a noção de que os dados recolhidos são de tal forma gigantescos que dependem da informatização e da automatização – ou seja, falamos dos famosos algoritmos, que são capazes de nos sugerir mil vezes umas férias na República Dominicana se ousamos “googlar” o país.

Joaquim Bretcha Boix pede uma subida do “nível ético do tratamento de dados”, que dê “mais controlo” aos utilizadores, responsabilizando também as empresas que surgiram nos últimos anos na Internet pela queda dos padrões. Talvez o exemplo mais conhecido seja o da Cambridge Analytica, que em 2016 utilizou dados de milhões de utilizadores do Facebook para fins políticos, nomeadamente para a campanha presidencial de Donald Trump nos Estados Unidos.

O catalão também é presidente da ESOMAR, uma organização internacional que representa várias empresas do setor, sediada na Holanda. “Estas novas empresas não nos conhecem, não nos contactam, vêm de outro mundo. Quando o fazem, fazemos com que compreendam que, quando utilizamos os dados de outras pessoas, temos de seguir uma determinada conduta”, esclareceu.

Uma segmentação mais fina

Joaquim Bretcha Boix explicou melhor o conceito de humanização, que implica “interagir com os consumidores”, ser claro e adicionar valor ao que é proposto.

“O que a investigação de mercado tradicionalmente fez foi interagir com pessoas e, a partir disso e de amostras, segmentar, tirar conclusões e obter atributos dados a cada segmento. A ‘big data’ baseia-se em dados que refletem um comportamento: uma viagem, uma compra, um clique, um envio de uma mensagem, uma chamada. Falta o porquê: porque faço uma opção e não outra”, sublinhou.

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Na opinião deste catalão, que também é professor da Universidade Autónoma de Barcelona, há que estudar grupos muito mais reduzidos e introduzir o fator humano, interagindo com “as pessoas reais”.

“Grande parte dos consumidores de muitos países acreditam que as empresas beneficiam mais dos dados do que eles próprios. A curto prazo há um benefício, a pessoa pode consultar um mapa ou uma informação que interessa, mas depois vê que há interesses que lhe escapam e que não lhe agradam. Defendemos que haja muito mais controlo pessoal dos dados que deixamos”, avançou.

Bretcha Boix deixou o exemplo de uma situação “perversa”, resultante do rasto que deixamos na Internet: “Nesse âmbito funciona o ‘real time bidding’, a publicidade automática, via máquinas e algoritmos. Imagine que pesquisamos por serviços funerários e recebemos durante muito tempo publicidade sobre isso. A última coisa que queremos é que nos recordem de um familiar que morreu”.

Se os dados foram bem usados, os consumidores veem a utilidade de os cederem: por exemplo, quando ligam para uma linha de apoio e a chamada cai, voltam a ser contactados, frisou-se no painel.

Porém, os maus exemplos surgem mesmo do próprio Estado. “Em Espanha surgiu agora um escândalo: o Governo comprou dados de empresas de telecomunicações para uso próprio. Os clientes não deram permissão e as empresas tiraram benefício deles. O Governo tem de me assegurar que isto é para meu bem, caso contrário não vou permitir que acedam aos dados.”

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