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Quinze anos depois da grande crise financeira (que começou em 2007/2008) e mais de dez anos após Portugal ter entrado em bancarrota e sido submetido a um programa de ajustamento e resgate (2011), o País ainda não se livrou do fardo das ajudas aos bancos (os casos mais salientes são BES e BPN, como se sabe).
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Portugal continua a carregar uma das maiores faturas da Europa (UE – União Europeia) por conta dos chamados apoios ao setor financeiro concedidos por vários governos do PS e do PSD durante estes anos, aponta o Banco Central Europeu (BCE), num estudo divulgado no mais recente boletim económico.
De acordo com a autoridade presidida por Christine Lagarde e um levantamento de dados do Eurostat feito pelo Dinheiro Vivo, Portugal e os contribuintes residentes (a maioria) ainda têm para pagar a quarta herança mais pesada da Europa em termos de dívida pública (passivos financeiros).
Segundo os números oficiais vertidos no último reporte dos défices e da dívida enviados à Comissão Europeia, há uma semana, estamos a falar em 29,7 mil milhões de euros que continuam em dívida face aos credores (fundos oficiais europeus, bancos e fundos privados), o equivalente a mais de 12% do Produto Interno Bruto (PIB) no final de 2022.
Pior estão três países apenas: Chipre, Grécia e Irlanda. Por esta ordem.
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Pressão para mais consolidação orçamental
Dito de outra forma, sem estes passivos públicos – que serviram, em grande parte, para salvar bancos privados (o caso mais avultado é o do BES, o banco que foi liderado por Ricardo Salgado até ao seu colapso) – o rácio da dívida pública portuguesa estaria hoje nos 100% do PIB ou até abaixo disso.
Se Portugal tivesse menos dívida, isso aliviaria a pressão para entregar excedentes orçamentais sucessivos, a forma mais usada para tentar reduzir o indicador (hoje a trave mestra do Pacto de Estabilidade) até à meta de 60% do PIB.
Este desígnio, perfilhado pelo governo e pelo ministro das Finanças, implica que não haja uma “disponibilidade ilimitada para reduções fiscais e dar tudo a todos”, como avisou recentemente Fernando Medina.
Mas uma coisa é certa: sem os mais de 12% do PIB que os portugueses devem só por causa dos bancos que foram salvos no passado recente (todos eles casos de polícia e justiça), o ajustamento do rácio do peso da dívida poderia estar quase três anos adiantado.
Assim é porque as últimas projeções (as do Conselho das Finanças Públicas) preveem que dívida caia abaixo dos 100% apenas em 2025. E isto num contexto de excedentes orçamentais anuais consecutivos.
No estudo “Impacto orçamental das medidas de apoio ao setor financeiro 15 anos após a grande crise financeira”, o BCE afirma que o impacto orçamental das medidas avançadas “difere consideravelmente entre os países da zona euro”.
“Alguns países não tomaram qualquer medida, ou quase nenhuma, tendo o impacto máximo no rácio da dívida face ao PIB sido próximo de 10% ou mais em dez países da zona euro”.
Estamos a falar de “Alemanha, Países Baixos, Letónia, Áustria e Eslovénia”, por exemplo, destaca a autoridade monetária liderada por Lagarde.
Ruínas
Mas depois há os outros que quase foram à ruína. “Os quatro países da área do euro que necessitaram de um programa de ajustamento da UE/Fundo Monetário Internacional (FMI), caso de Irlanda, Grécia, Chipre e Portugal, mais Espanha, pediram assistência financeira ao Fundo Europeu de Estabilidade Financeira/Mecanismo Europeu de Estabilidade”.
Nestes, “o impacto da dívida era ainda superior a 10% do PIB no final de 2022 e nalguns casos muito superior”.
O BCE explica que o impacto das medidas de apoio “diminuiu consideravelmente, mas estas ainda hoje deixam uma marca nas finanças públicas”.
As medidas de apoio financeiro adotadas desde 2007 “aumentaram a dívida pública até 2012, ano em que o impacto atingiu um pico de mais de 6 pontos percentuais do PIB”.
“Desde então, o impacto da dívida diminuiu, uma vez que os governos puderam vender as participações de capital que adquiriram nos bancos durante a crise e alienar ativos (principalmente créditos não produtivos, como malparado) detidos pelos bancos em dificuldades”, explicam os peritos do BCE.
“No entanto, a dívida pública da área do euro ainda era mais de 3% do PIB mais elevada em 2022, em consequência do apoio ao setor financeiro”.
“O financiamento dos apoios veio de emissões de títulos de dívida (pouco mais de metade), empréstimos (17,7%) e outros passivos de entidades das administrações públicas (28,8%).
Esta última categoria consiste principalmente na dívida dos bancos que foram nacionalizados e reclassificados nas administrações públicas e dos bancos de má qualidade (bad banks)”. É o caso do BES, desde o início do resgate classificado como banco mau.
“Destruição de riqueza e mais desemprego”
Mas não é só o esforço orçamental pedido aos contribuintes. Salvar e apoiar bancos tem um “impacto direto e duradouro nas finanças públicas”, mas isso “é apenas uma parte do custo económico global de uma crise financeira”.
Além deste, o custo “também se materializou em perdas de riqueza produzida e num aumento do desemprego”, observa o BCE.
Em cima disto, “em alguns países, a evolução adversa do setor financeiro e das finanças públicas reforçou-se mutuamente, aumentando os custos de financiamento soberano e exacerbando a crise financeira e económica”.
Segundo o BCE, esta última situação “provocou um aumento do rácio da dívida face ao PIB que não está incluído nas estimativas deste estudo”.
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