//Subida do salário mínimo foi boa graças a “boom turístico e boa conjuntura”

Subida do salário mínimo foi boa graças a “boom turístico e boa conjuntura”

Um grupo de economistas defendeu, esta terça-feira, num debate em Lisboa, que a subida do salário mínimo (SMN) dos últimos anos (legislatura PS, 2015 a 2019) só não fez mal ao emprego e agravou o desemprego por causa do “boom do turismo” e às boas condições que durante algum tempo reinaram na economia mundial e europeia.

Quando a maré económica descer — o que pode já estar a acontecer — novas subidas do salário mínimo vão agravar o desemprego, alertaram esses economistas.

O debate foi promovido pelo Fórum para a Competitividade nas instalações da AESE Business School (escola de gestão) e versou sobre o Orçamento do Estado para 2020 (OE2020), apesar de ainda não haver proposta de documento, só em meados de dezembro.

Em todo o caso, os economistas convidados (Teodora Cardoso, Vítor Bento, Pedro Braz Teixeira e Luís Mira Amaral na plateia, entre outros) foram dizendo o que gostariam de ver nesse novo OE2020.

Vítor Bento, presidente da SIBS (a empresa que gere a rede Multibanco), defendeu que num “contexto de pleno emprego, um aumento administrativo do salário mínimo pode não ser necessariamente uma má medida porque obriga à reestruturação de empresas menos produtivas”.

Ou seja, pode forçar a reconversão do tecido empresarial, ainda que à custa de destruição de empregos menos produtivo, equacionou o economista.

Bento atirou esta ideia para cima da mesa do debate, mas disse logo que “não tenho grandes certezas quanto a isto, em todo o caso”.

Negociações do salário mínimo começam agora

Não sendo uma medida do orçamento, o SMN é um ponto central na definição das políticas para 2020. O debate sobre o salário mínimo do ano que vem arranca amanhã na concertação social.

A ideia do governo é subir a remuneração mínima mensal garantida (RMMG) dos atuais 600 euros brutos mensais para 750 euros mas só em 2023.

Os patrões não repudiam essa meta a quatro anos, mas pedem que os aumentos sejam de acordo com as possibilidades da economia e das empresas.

Relativamente a 2020, o discurso é mais fechado. A UGT diz que quer 660 euros. A CGTP não diz valores para o ano que vem, refere antes que quer 850 euros “a curto prazo”.

Em todo o caso, na AESE, Vítor Bento pareceu mais inclinado de que, a prazo, o desemprego piorar se o SMN continuar em ascensão. “Não tenho dúvidas de que o aumento do salário mínimo vai aumentar o desemprego”.

Segundo o chairman da SIBS, “45% do emprego está nas microempresas e é emprego muito mal pago”. Se não sairmos daqui, haverá problemas por causa dos salários, referiu.

Para Bento, “as microempresas não tem dimensão para dissolver custos fixos, só vão sair deste patamar quando fecharem portas, por exemplo”.

“Mas isto não quer dizer que as microempresas vão desaparecer, não vão, por que muitas se vão reconverter”. E deu exemplos de negócios tradicionais com perfis novos que progrediram na cadeia de valor, como “a Padaria Portuguesa e as oficinas certificadas para automóveis”.

Mas reiterou que a subida do SMN “pode ter um efeito de empurrão” e ajudar a limpar as más empresas e o emprego de fraca qualidade.

Na plateia estava Luís Mira Amaral, ex-ministro da Indústria (governos PSD). Segundo ele, “a subida do salário mínimo nacional (SMN) só não prejudicou o emprego por causa do boom turístico que absorveu os empregos de salários mais baixos”.

Mira Amaral disse, no entanto, que não entendeu muito bem a tese de Vítor Bento que defende que no fundo “vai ser o PS a reestruturar a economia menos produtiva com subidas do salário, que ajudará assim a limpar as microempresas” e a levar a mais investimento em inovação e tecnologia. Estas observações provocaram bastantes sorrisos e alguns risos na audiência.

Baixar a TSU: folga para aumentar ordenados ou ideia “tenebrosa”

Pedro Braz Teixeira, diretor do Gabinete de Estudos do Fórum para a Competitividade (uma plataforma de empresas), deixou uma visão bem mais negativa sobre a subida do salário mínimo.

Disse que “entre 2015 e 2019, o aumento acumulado do SMN foi de 14%, mas a produtividade subiu apenas 1,7%”, qualificando isto como “uma desgraça”

Para este responsável, “o SMN não se traduziu em desemprego porque a conjuntura internacional ajudou” e revelou que “está a sugerir às associações patronais” que nas negociações em concertação social defendam um mecanismo em que dê para “interromper a subida do SMN quando o desemprego subir acima de 7% da população ativa”. Na sua opinião, esta é a taxa de desemprego natural da economia.

Braz Teixeira disse também que “já se nota que estamos em grande dificuldade de baixar o desemprego” dos níveis atuais, que estão na casa dos 6%. A previsão do governo para este ano é de 6,3%. Em 2020, baixa para 5,9%, segundo o esboço orçamental enviado a Bruxelas em meados de outubro.

Esta quarta-feira, o INE atualiza os dados do inquérito trimestral ao emprego relativo ao terceiro trimestre de 2019.

O economista do Fórum para a Competitividade voltou à carga com uma ideia antiga, do tempo de Vítor Gaspar e do FMI e da própria Comissão Europeia (no tempo do programa de austeridade, chamava-se desvalorização orçamental, fiscal devaluation) que é reduzir o custo com salários com recurso a uma redução dos descontos das empresas para a Segurança Social (corte da Taxa Social Única), mas neste caso centrada apenas nas empresas do interior, as mais fracas do ponto de vista da produtividade.

Mira Amaral interveio uma vez mais para discordar. “A ideia de reduzir a TSU no interior é tenebrosa porque é estar a facilitar subidas de salários baixos mexendo num sistema que já tem problemas de sustentabilidade, que é a Segurança Social”. “É fácil de fazer no curto prazo, mas paga-se no longo prazo”, defendeu o antigo presidente do banco BIC, que comprou os restos do BPN.

(atualizado às 21h40)

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