//Supervisores temem que novos fundos causem excessos nos preços dos imóveis

Supervisores temem que novos fundos causem excessos nos preços dos imóveis

Os fundos negociados em bolsa e que investem em imobiliário podem começar a ser criados em Portugal já a partir do próximo mês. Isto apesar de os supervisores financeiros, em particular o Banco de Portugal, terem avisado que estas novas sociedades de gestão e investimento imobiliário (SIGI, mais conhecidas pelos investidores como REIT) trazem o risco de aumentos excessivos nos preços dos imóveis e de tornarem o sobe e desce no valor de casas e escritórios mais imprevisível.

“A introdução das SIGI em Portugal, ao fomentar a procura de imóveis, poderá acarretar o risco de contribuir para o aumento excessivo dos preços no mercado imobiliário e, consequentemente, para uma correção/redução abrupta desses mesmos preços no futuro”, é referido num parecer entregue pelo Conselho Nacional de Supervisores Financeiros (CNSF) ao governo a que o Dinheiro Vivo teve acesso.

Esta entidade é composta por representantes do Banco de Portugal, Comissão do Mercado de Valores Mobiliários e da Autoridade de Supervisão de Seguros. E no documento, entregue ao governo em agosto do ano passado, pede prudência e “uma abordagem preventiva”, já que em outros países da União Europeia “têm vindo a ser apontados riscos associados a um potencial sobreaquecimento do mercado imobiliário”.

A ideia de se trazerem os REIT para Portugal surgiu ainda no anterior governo. Em 2014 existiram discussões com a troika para a criação desses instrumentos. Mas acabaria por não se avançar. A ideia foi retomada por Pedro Siza Vieira, ministro adjunto e da Economia, como uma forma de responder aos pedidos das entidades que atuam no setor imobiliário. O decreto-lei que permite a criação de SIGI foi publicado em Diário da República esta segunda-feira. E a legislação entra em vigor a partir de 1 de fevereiro.

Investidores estrangeiros podem causar instabilidade

O CNSF observou que a situação do mercado imobiliário “encontra-se, neste momento, numa fase do ciclo muito diferente da observada em 2014”, apontando a evolução dos preços. O Banco de Portugal tem avisado que existem já sinais de “sobrevalorização” no preço das casas e que isso pode criar riscos para a estabilidade financeira. Isto depois de subidas de mais de 30% nos preços da habitação. Em Lisboa, só no ano passado, houve crescimentos acima de 20%.

O CNSF conclui, assim, que “um dos motivos usualmente associado à introdução dos REIT, que se traduz na necessidade de dinamização do mercado imobiliário, terá menor pertinência na atual conjuntura em Portugal”. Apesar de qualquer pequeno investidor poder apostar no imobiliário via REIT, a maior parte dos fluxos de dinheiro poderão vir de entidades estrangeiras.

“Se os investimentos de não residentes estiverem associados, de forma significativa, a um movimento de search for yield [procura de rendimento num contexto de juros baixos], existe o risco potencial de que uma alteração das condições dos mercados financeiros internacionais possa levar a que esse investimento se reverta de forma algo abrupta”, diz o CNSF. Os supervisores temem que um cenário desse tipo provoque um contágio e impactos significativos “sobre os bancos e a economia em geral”.

Ainda assim, o CNSF admite que a introdução dos REIT “poderá trazer vantagens, disponibilizando um instrumento de investimento transparente e adaptado às necessidades dos agentes económicos e suscetível de dinamizar o mercado de capitais”. Mas pede que sejam tidos em consideração os “possíveis riscos para a estabilidade financeira”.

Banco de Portugal e CMVM discordam de limites à dívida

O modelo criado em Portugal prevê que os REIT possam desenvolver “projetos de construção e de reabilitação de imóveis”. Para o Banco de Portugal esse é um risco acrescido, apesar de admitir que novas entidades a construir e reabilitar podem aumentar a oferta de imóveis e servir como um contrapeso à subida dos preços.

No entanto, na parte do parecer do CNSF com a posição do supervisor bancário, defende-se que “é necessário ter também em conta o risco acrescido inerente aos projetos de construção”. Para desenvolverem essa atividade, os REIT podem recorrer a dívida. A legislação proíbe estes instrumentos de assumirem um endividamento superior a 60% do valor dos seus ativos.

Mas o Banco de Portugal recomendava um limite mais conservador. “O nível máximo de alavancagem das SIGI expostas a estes projetos deve situar-se abaixo dos 50%”, considera. Acrescenta que na Grécia o nível máximo de endividamento é de 40% e na Bélgica os “REIT não podem atuar como promotores imobiliários”.

Mas a CMVM tem opinião diferente. O supervisor do mercado de capitais, a quem caberá a vigilância das entradas em bolsa e da informação prestada ao mercado pelos REIT, diz que “o estabelecimento de limites de endividamento inferiores a 65% tornará o instrumento em causa inútil”.

Os REIT terão ações negociadas em bolsa e vão comprar ou desenvolver imóveis para arrendar ou para outras formas de exploração económica. Terão um regime fiscal favorável para os investidores e vão distribuir pelo menos 90% do lucro que conseguirem com os imóveis aos acionistas.

Em Espanha, que serviu de inspiração ao modelo adotado em Portugal, estes instrumentos controlam imóveis avaliados em 14,8 mil milhões de euros e têm tido forte procura por parte de grandes e pequenos investidores. Mas têm também sido alvo de críticas de que têm contribuído para a escalada nos preços das casas e das rendas em algumas regiões.

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