//“Temo que se estejam a fazer cedências a grupos profissionais que possam comprometer o sistema de saúde”

“Temo que se estejam a fazer cedências a grupos profissionais que possam comprometer o sistema de saúde”

Eurico Castro Alves, diretor do Departamento de Cirurgia do Centro Hospitalar do Porto teme que se estejam a fazer demasiadas cedências a grupos profissionais “fortemente reivindicativos” que, no futuro, possam vir a comprometer a sustentabilidade do sistema de saúde, até porque, alertou “a despesa no setor não vai deixar de aumentar”.

Eurico Castro Alves lembrou que o aumento da despesa no SNS assenta em grande parte nos recursos humanos e na aquisição de medicamentos e dispositivos médicos a “preços proibitivos” para doenças para as quais no passado não existiam terapêuticas. O diretor do Departamento de Cirurgia do Centro Hospitalar do Porto recordou a sua passagem pelo Governo e em particular ” a guerra da hepatite C” para garantir que “veem aí muitas mais”. Castro Alves assegura que “veem aí medicamentos disruptivos, ou seja, que mudam completamente o paradigma, curam doenças que até à data não eram curadas, nomeadamente do foro oncológico, mas veem a preços verdadeiramente proibitivos”. Para o ex-secretário de Estado da Saúde é necessário encontrar novas soluções, pois “as formulas que temos utilizado para negociar com a industria, com os fornecedores em geral da saúde estão esgotadas”.

E uma das alterações que vê como prioritária passa pelos orçamentos e acordos plurianuais das unidades de saúde, pois em seu entender “faz sentido começar a pensar de maneira diferente” porque o atual modelo de financiamento poderá não funcionar nos próximos anos.

De acordo com Castro Alves “praticamente até ao ano passado tem havido um progressivo desinvestimento” com a percentagem do PIB que os Governos têm alocado à saúde a baixar sucessivamente.

Outros dos aspetos apontados pelo ex-secretário de Estado é o modelo dos hospitais que, na sua opinião, está esgotado. Castro Alves defende uma maior autonomia e pede atenção particular “ao modelo de atendimento nos hospitais” que “está ultrapassado” sugerindo a quem tiver dúvidas” que vá neste momento a um qualquer hospital do pais”. Na sua opinião ” há que pôr quem sabe e quem trabalha a pensar numa nova forma de atender os doentes porque é uma área crucial e estratégica para o bem estar e para o sector da saúde”.

O responsável pelo Departamento de Cirurgia do Centro Hospitalar do Porto assegura que “temos um bom sistema de saúde, mas temos necessariamente de o melhorar porque se não vai ficar insustentável e incapaz de cumprir a sua missão”.

Castro Alves considera “absolutamente necessário” investir no SNS, dado que “a despesa no sector da saúde seja ela prestada pelo sector privado, publico ou social não vai deixar de aumentar significativamente”. E o especialista persente que “a disponibilidade financeira não vai aumentar na mesma proporção”, o que coloca o risco de “daqui a muitos poucos anos termos um fosso enorme entre o dinheiro disponivel e as necessidades que temos para cumprir com a missão do serviço nacional de saúde”. Castro Alves não tem dúvidas de que “precisamos de mais financiamento”, mas alerta para a possibilidade “de podermos pôr o dinheiro todo do Orçamento do Estado na saúde e se não fizermos mais nada nunca vai chegar”, para concluir que ” precisamos verdadeiramente é de dirigentes e de governos que percebam que temos de fazer ganhos de efeciciencia e sobretudo apostando na inovação, na criatividade e na imaginação e nas tais soluções que até agora ainda não foram utilizadas”.

Para o ex-governante “o desígnio do Estado não é ser um prestador de serviços de saúde, mas garantir que todos os cidadãos, onde quer que vivam, tenham acesso aos mesmo cuidados”.

Para Eurico Castro Alves, o setor público tem de trabalhar cada vez mais em rede e não em compartimentos separados, destacando a possibilidade de as câmaras municipais poderem vir a ter um papel importante neste setor. Depois, o especialista refere que “o sector privado tem progressivamente vindo a ganhar peso”, o que implica duas necessidades muito importantes. “Há que fortalecer o sector da regulação”, diz Castro Alves, ao mesmo tempo que recorda que “o regulador é o agente que protege os interesses dos consumidores” o que implica “a existência de uma entidade verdadeiramente independente que distribua e que vigie as regras de funcionamento do sector e que possa assegurar a protecção dos interesses do cidadão”.

O ex-secretário de Estado não esquece o desafio provocado pela esperança de vida em Portugal que num prazo de 20 anos ” não parou de crescer”, dando o exemplo de que “em 1990 a esperança média era de 67 anos, sendo hoje de mais 20 anos”.

Apesar das críticas, Castro Alves admite que “comparado com o resto do mundo, temos razões para estarmos satisfeitos”. O Director do Departamento de Cirurgia do Centro Hospitalar do Porto garante que “nós estamos a conseguir fazer muito e muito bem gastando muito menos”, o que só tem uma explicação: ” Portugal tem conseguido formar recursos humanos na saúde de excelência que fazem todos os dias pequenos milagres”. Castro Alves assegura que “há milhares e milhares de horas extraordinárias que o Estado está a dever aos profissionais e que não consegue pagar e eles nem assim deixam de cumprir com a sua função”. “Este é se calhar um dos melhores ouros que nós temos”, conclui.

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