Em 2018, a tarifa social de energia em Portugal representou uma transferência de cerca de 85 milhões de euros das empresas produtoras de eletricidade e comercializadoras de gás natural para mais de 800 mil consumidores domésticos. Há um ano, o governo mandou o Observatório de Energia da ADENE – Agência para a Energia realizar um estudo sobre a aplicação da tarifa social com o objetivo de travar eventuais fraudes. Nessa altura, fonte do governo admitiu ao Dinheiro Vivo que a tarifa social poderia estar a ser mal aplicada e que o modelo atual poderia dar azo a erros, já que se trata de um processo automático que cruza os dados da Segurança Social com os dados das Finanças.
No espaço de apenas dois anos, o número de famílias abrangidas pela tarifa social de eletricidade passou de 80 para 800 mil. Isto porque o processo passou a ser automático a partir de 2016, cruzando também as informações com as bases de dados das empresas de distribuição de eletricidade. Na mira do governo estavam então suspeitas de situações de irregularidade na aplicação da tarifa social, que representa um desconto de 33,8% na fatura da luz face às tarifas aprovadas pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE).
O estudo garante, no entanto que “a experiência de mais de dois anos de automaticidade na aplicação da tarifa social de energia tem-se revelado eficaz e os casos de atribuição indevida do benefício, serão residuais”.
Afastadas as suspeitas de fraude, a ADENE – Agência para a Energia quer agora uniformizar os critérios de acesso à tarifa social entre eletricidade e gás natural, o que aumentaria ainda mais os beneficiários deste apoio no gás natural, e alargar a medida também ao gás de botija.
Esta “uniformização dos critérios de elegibilidade” para acesso à tarifa social teria um “impacto financeiro total de cerca de 9,5 milhões de euros”: 7,7 milhões de euros do ponto de vista do financiamento da medida, a que acresce a correspondente perda de receita fiscal na ordem dos 1,8 milhões de euros.
“A tarifa social de energia, tal como está concebida, não se destina especificamente a diminuir a pobreza energética”, conclui o estudo, recomendando a isenção do pagamento da componente fixa da tarifa aos beneficiários de tarifa social de eletricidade com a menor potência contratada (1,15 kVA), com impactos centrados nos consumidores mais pobres que tendencialmente consomem menos energia. Esta medida tem um encargo adicional estimado de financiamento na ordem dos 3 a 4,7 milhões de euros (a que acresce a correspondente perda de receita fiscal, entre 0,7 milhões de euros e 1 milhão de euros),
“Considerando que nem sempre são as freguesias com maior risco de pobreza energética as que apresentam maior número de beneficiários de tarifa social, pode-se depreender que a tarifa social não estará tão orientada para resolver problemas de pobreza energética como está para promover a universalidade e a acessibilidade aos serviços energéticos. Uma tarifa social orientada especificamente para problemas de pobreza energética deveria ter como objetivo promover a eficiência energética, direcionando-se para um horizonte temporal alargado”, pode ler-se no estudo.
Também é sugerida uma “extensão” da tarifa social ao GPL em garrafa para consumidores domésticos, que a ADENE diz que beneficiaria as franjas mais pobres da população, que residem essencialmente fora dos grandes aglomerados urbanos.
O estudo aponta ainda os benefícios de uma garantia do fornecimento de energia às famílias vulneráveis durante períodos sazonais críticos e a promoção de planos de reabilitação e de eficiência energética, com efeitos a médio e longo prazo, defendendo que “tenderão a produzir efeitos na redução da pobreza energética”.
De acordo com o Eurostat, a taxa de risco de pobreza em Portugal tem vindo a diminuir, fixando-se em 2017 nos 17,3% (cerca de 1 milhão e oitocentos mil pessoas).
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