António Tomás Correia não recua perante o aumento da pressão para que saia da presidência da Associação Mutualista Montepio. Numa grande entrevista ao Dinheiro Vivo/TSF, cuja segunda parte é hoje publicada, Tomás Correia defende-se das acusações do Banco de Portugal e censura a atuação dos políticos, de comentadores e dos media.
Sobre a adenda legislativa feita pelo governo, para clarificar que cabe ao regulador dos seguros avaliar Tomás Correia, diz que se trata de uma lei dirigida a si em exclusivo e que a vai analisar. Mas que vai lutar para permanecer no cargo.
Estamos a assistir a um jogo do empurra entre o governo e a Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF) para saber, afinal, quem é que tem de avaliar a sua idoneidade. Como tem assistido a este braço de ferro?
É algo que não me diz muito respeito mas tenho opinião. A minha opinião é que o Código Mutualista e o decreto que aprova o Código Mutualista, no sentido de justificar a posição do regulador de seguros… Agora o que se diz é que o governo, afirmando que há dúvidas, se propõe a fazer um decreto-Lei interpretativo desta matéria. Vamos aguardar com toda a serenidade.
Já o fez no Conselho de Ministros embora ainda não tenha o divulgado…
Eu não conheço. É uma matéria que iremos analisar e depois agiremos em conformidade com o que se concluir em relação a essa matéria. Há uma coisa que o legislador, que é o governo, tem de ter em conta: as associações mutualistas são associações cuja autonomia dos seus associados deve ser respeitada. Aliás, o seu Código Mutualista apela muito à natureza e autonomia dos associados em relação a um conjunto de matérias e nós falamos da necessidade de termos uma sociedade civil forte, e esta exerce-se através das suas associações. Mas depois andamos sempre à procura de maneiras de fragilizarmos as instituições da economia social, aquelas que emanam da sociedade civil. Enfim, vamos ver. Esta é uma matéria que me preocupa pouco.
Diz que o preocupa pouco mas a questão da idoneidade é da maior importância. O presidente da ASF, que é o novo supervisor das mutualistas, diz que a avaliação da idoneidade dos gestores das mutualistas vai basear-se no crivo das seguradoras e que bastam indícios de irregularidades para o parecer ser negativo, nem é preciso acusação. Isso não significa que, estando já acusado pelo BdP, a sua idoneidade vai ser retirada?
Não significa isso. Espero para ver. Isso é um processo muito mais complexo do que parece e não se resolve com essa facilidade toda.
Como assim? Os critérios de avaliação de idoneidade das seguradoras estão bem definidos há muito tempo… e o que a intenção do novo Código das Associações Mutualistas e da avaliação de idoneidade é que as mutualistas caminhem para os crivos ao longo de um período transitório de 12 anos. É por causa das dúvidas de quem faz a idoneidade ao longo deste período de idoneidade que o governo prometeu uma clarificação e tê-la-á feito neste último conselho de ministros.
Eu não sei a clarificação que foi feita. O que sei é que no artigo 4º do decreto-Lei que aprova o Código mutualista é muito claro que os órgãos sociais em exercício ao momento das eleições mantinham os poderes, que estavam estabelecidos no antigo Código Mutualista, e também a Assembleia Geral e o presidente da Assembleia Geral, mantiveram esses poderes, e era o presidente da mesa da Assembleia Geral a quem cabia avaliar da idoneidade e legibilidade dos diversos órgãos sociais. O que foi feito. O que foi feito no quadro eleitoral que terminou no dia 7 de dezembro. Agora vamos atribuir essa responsabilidade à ASF. Vamos ver em que termos – eu não sei, não me posso pronunciar sobre isso, não li, não conheço o texto – atribuir essa responsabilidade à ASF. Então a ASF poderá – vamos ver se pode – abrir um processo de avaliação de idoneidade. A idoneidade está concedida, está concedida e bem concedida de acordo com o Código Mutualista, em vigor e aplicado no momento em que teve de ser aplicado. A partir daqui vamos ver. E depois seguem-se, se for caso disso, os processos de avaliação de idoneidade. E vamos ver em que condições isso pode acontecer. Agora não posso dizer mais nada do que isso.
Mas é possível, então, que nem sequer seja legal a mera existência de um processo de reavaliação de idoneidade, dado que já obteve…
Eu não sei. A única coisa que tenho assistido é que há todo um conjunto de intervenções, muito pouco precisas, se quiser, dirigidas a uma pessoa, exclusivamente dirigidas a uma pessoa, que pode desembocar aqui numa publicação de um diploma, ao que parece, vai ser. Vamos ver.
Essa pessoa…
Sou eu.
É o doutor Tomás Correia. Mas o que está a dizer é que isto é uma lei feita para um homem só?
Não sei. Vou ver. É isso que eu vou ver.
Porque as leis não podem ser feitas para casos únicos…
Eu não sei. Acha que consegue encontrar algum caminho de razoabilidade na execução que temos tido? A discussão que temos na praça pública, no Parlamento, a partir de membros do Governo, é uma discussão razoável? Tem alguma razoabilidade? Desculpe, mas não tem.
Não sei se se está a referir à discussão pública em torno do novo Código Mutualista e em torno da possibilidade da avaliação da idoneidade dos gestores das mutualistas, tem sido na verdade a discussão em torno da sua idoneidade. É isso que está a dizer que é uma lei feita a pensar em si, especificamente…
Eu não estou a dizer. Eu tenho de ver o diploma e perceber o que está aqui em causa. Agora, não há dúvida nenhuma, olha do para aquilo que sai na comunicação social, que parece que sim. O meu nome é o nome que aparece enfim, como sendo o mal, a consequência de todos os problemas. Enfim, parece que não existem outros problemas. O problema, de facto, é ver aqui a idoneidade desta pessoa. Enfim, quando eu não tenho nenhuma condenação – muito longe disso – enfim, quando eu… Quando o próprio Banco de Portugal não me inibe do exercício da profissão. Porque, vamos lá ver. Podíamos ter aqui um problema se o Banco de Portugal dissesse assim “o senhor tem esta coima, tem aqui uma sanção acessória de inibição do exercício da profissão por não sei quantos anos, tem aqui uma outra sanção acessória que consiste na publicação da pena definitiva”. Bom… mas essa primeira sanção que eu referi não existe. Não existe. Enfim, e é estranho que não exista perante uma coima de uma magnitude destas, até é estranho que não exista. Quer dizer. Não foram tão temerários assim, não é? Vamos ver. Eu fico curioso. Fico curioso para ver.
Mas, independentemente dos desfechos destes processos que estão em curso, do Banco de Portugal, do Ministério Público e da própria idoneidade, considera que está em condições para continuar a liderar a Associação Mutualista?
Eu… vamos lá ver, eu considero. Estamos perante factos novos? Não estamos.
Ou seja, não vê que esta decisão do Banco de Portugal seja um facto novo?
Não. Esta matéria, de uma forma absolutamente estranha, nunca vista em Portugal, estas matérias foram amplamente discutidas, quando da campanha eleitoral recente. Alguma coisa destas não foi discutida à exaustão durante a campanha eleitoral?
Mas não era ainda conhecida a decisão do Banco de Portugal…
Não, desculpe. Foi discutido exaustivamente. Ainda assim os associados votaram. Bom, e aquilo que eu tenho tido de reações dos associados, e são muitas, são reações de perplexidade, relativamente a uma coisa destas. Perplexidade até, de momento, se quiser. A que isto aconteça. Eu não tenho perplexidade nenhuma. Porque, como já disse, em 2012, aí sim, eu fundei a minha convicção, que algum dia vinha a acontecer uma coisa dessas. E por virtude da determinação que eu pus ao longo do tempo na defesa dos interesses do Montepio, e portanto, as pessoas não gostaram. Provavelmente gostavam de ter alguém mais cordato. Apliquem cá as regras de Basileia, em termos prudenciais a Associação Mutualista. E eu não estive disponível para isso.
Está a ser castigado então?
É todo um conjunto de coisas. Não é muito normal andar-se a fazer uma investigação, com base nos anos de 2008 e 2014, juntar 100 volumes, concluir que ninguém obteve ou tentou obter vantagens em virtude dos atos que praticou, concluírem que são apenas erros procedimentais e depois aplicarem uma coima brutal, não inibirem do exercício da profissão. É um bocado estranho. Com coimas destas, a inibição tinha de ser por uma montanha de anos. Senão para todo o sempre. Não acha?
Não ponderou, até ao momento, sair.
Eu não. Eu quero ver. Eu estou cá para ver. Até onde é que chega. Até onde é que isto chega. Estou para ver.
Mas, desde os partidos políticos, que são muito críticos da sua atuação… O PSD, por exemplo, diz que não tem idoneidade, de forma muito clara. O próprio primeiro-ministro deixou subentendido que queria ver esta questão – da idoneidade – resolvida muito rapidamente
Eu acho bem. Eu também queria.
Parece ter poucos apoiantes, pelo menos na política. Sente-se encurralado, neste momento?
Não. Os políticos não me encurralam. Nem os políticos nem os reguladores. A única coisa que me poderia encurralar é a minha consciência. E a minha consciência é muito clara, muito transparente, está pacífica. Eu não tenho nenhum problema. Eu creio que hoje se faz muita política à conta do Montepio. O país tem muitas coisas importantes a tratar. Deviam preocupar-se é como é que têm malbaratado o património nacional, em vendas a fundos abutres e outros, ao longo desse tempo. Podiam preocupar-se com isso. Como é que foi possível trazer o país a uma situação em que a banco de retalho privada está praticamente toda nas mãos de capital estrangeiro? Isso é que devia preocupar. E devia preocupar porque um dia as empresas portuguesas e os agentes económicos portugueses, quando precisarem de recorrer à banca, têm de ir a Madrid ou a outro sítio qualquer negociar aquilo que são as suas necessidades. Isto é que é um grande entrave, para não falar do empobrecimento que foi, venderem por preços aviltados muitos dos ativos portugueses. Deviam preocupar-se é com aquilo que nos disseram, a propósito de muitas situações que o contribuinte não paga, que isto não sai nada, o contribuinte está livre de pagar seja o que for, o país não vai pagar… e quando todos nós sabemos que os bancos também são contribuintes. Os bancos quando vão contribuir para o Fundo de Resolução estão a pagar, são contribuintes que estão a pagar. Isso é que deveria preocupar. Os problemas do país não são esta discussão em torno do Montepio, que repito, não tem lesados, honrou os seus compromissos, cumpre com tudo o que são as exigências prudenciais. Teve alguns erros ao nível dos procedimentos, alegadamente pelo regulador e nós não concedemos que isso seja verdade. E estamos convictos que vamos demonstrar, na justiça e não no arbítrio que isso não é verdade. Isto é que é o grande problema. O grande problema. Este é que é o problema nacional? Não é com certeza absoluta. O problema nacional não é esse. O problema nacional é saber como é que nós temos hoje uma área seguradora que não pertence a capitais nacionais, como é que temos um sistema financeiro que está, do ponto de vista privado, em mãos estrangeiras e como nós com isto vamos resolver os problemas do financiamento da nossa economia, por exemplo.
Sente então o apoio todo, não só dos restantes membros do Conselho da Associação, mas também na Associação, no Conselho Geral, por exemplo? Sente-se apoiado?
Sim, sinto-me apoiado. Sinto-me apoiado sobretudo pelos associados. Pelas muitas manifestações dos associados que me têm chegado. E que não me perdoariam que eu abandonasse a Associação nesta altura. Não é possível que alguém, com o mínimo de decência, se tenha candidatado – e candidatei-me com a consciência tranquila, de que não cometi nenhuma irregularidade. Eu tenho consciência, não tenho meia dúzia de anos. Eu vou fazer 74 anos. Portanto, eu candidato-me por ter a consciência perfeitamente tranquila relativamente a essas matérias. Assisti à discussão destas matérias durante a campanha eleitoral. Mantive, por convicção, de que agi sempre bem, a minha candidatura. E agora, passados dois meses, depois da pose, eu saia? Isso era uma traição aos associados. Era ceder aos interesses. Quem perdeu nas eleições quer ganhar na secretaria e tem muitos agentes. E, comigo não contam para isso. Eu lutarei com todas as minhas convicções, com toda a minha força – e é muita, tomem nota que é muita. Quem os vai ouvir, podem tomar nota, que a minha convicção e a minha força é muita. Porque, quando os homens, que são homens, têm convicções fortes, não se deixam encostar à parede. Escolhem a espada. E eu não tenho dúvidas nenhumas acerca disso. Os interesses dos mutualistas, os interesses da economia social, os interesses do Montepio exigem alguém com uma grande determinação para defender o seu património. O património de uma instituição que vai a caminho de 200 anos. Que nunca criou problemas ao longo da sua história. Que resolveu todos os seus problemas, que atravessou todas as crises por que o país passou e que passou mais esta, que foi uma crise profunda, não pode ter alguém que deixe subjugar-se a estes interesses mesquinhos eleitorais, ou estes interesses de ganhar na secretaria, ou estes interesses que pensam que vale tudo. Porque hoje o indivduo conta pouco. O que é preciso é deixar o individuo de lado, nem sequer tomando em conta os ensinamentos do (Max) Weber, que, nos pronúncios do nazismo dizia “vamos cuidar do indivíduo para podermos cuidar da sociedade”. Vivemos um momento muito perigoso. Mas comigo não contam para isso. Eu estou aqui para me bater pelas minhas convicções, para me bater pelo Montepio, para me bater pelo património dos associados, e fá-lo-ei com grande determinação, com grande força, com grande capacidade de vencer esta adversidade.
Portanto, o cenário de demissão está fora de parte. Mas, o que lhe pergunto é o seguinte. Se o doutor Tomás Correia, na sua avaliação, chegar a um ponto em que, embora absolutamente convicto de que não fez nada de errado, se chegar a um ponto que considera que a sua permanência na Associação pode, por uma questão de danos de imagem, trazer problemas à Associação não pondera, em cenário nenhum, sair?
Não, a Associação está à frente dos meus interesses. Eu só estarei no Montepio quando o meu juízo sobre essa presença para a Associação ser vista como positiva. Eu acompanho todos os dias aquilo que são as nossas relações associativas. O modo como os associados nos olham, o modo como os associados e clientes confiam em nós. E, aquilo que se passa hoje é que não há a mínima perturbação nessa relação. A perturbação é espalhada do exterior da Associação. É espalhada do exterior daquilo que são os clientes e os associados do Montepio. É espalhada por via de uma comunicação social, que fala muitas vezes daquilo que não sabe, dá voz a muitos que não sabem daquilo que estão a tratar, e por uma questão que tem muito a ver com uma luta política deste ano eleitoral em que estamos. Em que cada um diz pior do que o outro porque com isto pensam que ganham alguma coisa. Eu penso que, também nesse campo, estamos a caminhar para um quadro de descredibilização bastante significativa. E estamos aqui para ver. Eu falava no Weber há pouco e falei das consequências do desprezo dos direitos do indivíduo e depois como isso funcionou no nazismo. Temos outros exemplos. Eu acho que nós estamos no limiar em que ou arrepiamos caminho, em que consideramos que o indivíduo deve ser respeitado e responsabilizado por aquilo que faz, e há muita coisa a ter em conta nessa responsabilização, não se pode… todos são juízes hoje. Já viram que hoje tudo é juiz? Tudo é juiz, tudo condena. Isto tem algum sentido? Não tem sentido nenhum.
Sente-se condenado?
Eu não me sinto condenado. Mas, todos são juízes. Estamos a falar de arbítrio, estamos a falar de coisas que, numa vida em sociedade, nem sequer se traduzem no respeito pelas regras da sociedade. Agora, eu avaliarei sempre aquilo que é a conveniência da minha presença em função dos interesses dos associados. E esses interesses são medidos pelo modo como a relação de confiança se vai desenvolvendo. Não sinto qualquer perturbação. Se outros entendem que devem introduzir perturbação nesta matéria, criando aqui um quadro de instabilidade, assumam as suas responsabilidades.
Mas quem são? Vamos por nomes nessa acusação. Quem são esses outros?
São vários os agentes. A gente lê os jornais.
São os elementos derrotados nas últimas eleições?
Sem dúvida. Esses querem ganhar na secretaria aquilo que perderam pelo voto dos eleitores. Mas depois… Oiço declarações, nomeadamente no Parlamento, que me deixam estupefacto.
Pode dar algum exemplo? Está a falar de quê?
Não preciso. São tantos os exemplos que eu referindo algum estava a esquecer outros, e, portanto, eu não vou esquecer ninguém. Basta ler o Diário da Assembleia da República. Basta ler os noticiários dos jornais.
Mas está a falar de agentes políticos ou de outros que são ouvidos por agentes políticos?
Estou a falar também de declarações de agentes políticos. E estou a falar de muitas declarações, nos diversos órgãos de comunicação social a propósito desta matéria. Enfim, eu há dias ouvi um comentador, muito assíduo nas nossas televisões, a dizer que à socapa, eu à socapa, veja bem, cometi um ato fraudulento na tal Assembleia Geral de 16 de março. Como se trata de um advogado, de um sócio de uma firma de advogados muito importante, eu fiquei muito surpreendido. Porque, das duas uma: ou o senhor não sabe o que se passa na sua firma de advogados, ou então a sua firma de advogados não trabalha em áreas muito importantes da atividade empresarial, que é aconselhar e trabalhar para que haja mecanismos de proteção para que algum dos administradores das empresas ou diretores possam ser protegidos, quando acusados, ou quando envolvidos em qualquer ação que tenha a ver com o exercício da profissão.
Vamos falar de forma clara. Vamos por um nome a esse comentador. Quem é?
Este comentador é o doutor Marques Mendes. Ele falou à socapa de fraude. A Assembleia Geral decidiu na sequência daquilo que o Conselho Geral da Associação Mutualista decidiu. E decidiu bem. Num quadro de tranquilidade, de uma pessoa com quem, tanto quanto eu sei… e o seu Conselho de Administração, o doutor Marques Mendes tem excelentes relações. Até deve saber.
Há também notícias de eventuais problemas com a idoneidade dos restantes membros do Conselho de Administração. O cenário de eleições antecipadas, não seria melhor para clarificar toda a situação da Associação Montepio?
Seria melhor para permitir a vitória na secretaria de quem não ganhou. Introduzindo aqui mais um quadro de instabilidade durante meses, com campanhas nefastas, como aquela que nós assistimos no último novembro/dezembro. Se nós nos recordarmos, no fim de novembro, conseguiu-se, pela primeira vez neste país, e se calhar em muitos países, no âmbito de uma campanha eleitoral para os órgãos sociais de uma Associação Mutualista, veja bem, pôr três canais televisivos generalistas a falarem da mesma instituição com matérias diferentes. É uma coisa espantosa. Uma coisa absolutamente surpreendente. E ninguém se espanta com uma coisa destas? Ninguém acha isto estranho? Ninguém acha que há aqui uma coincidência, enfim… Os astros alinharam-se todos e um canal tratou da matéria A, outro canal tratou da matéria B e o outro canal tratou da matéria C. Fantástico. No mesmo dia, à mesma hora. Na abertura dos telejornais. Acham tudo isto normal? Claro que isto não é normal. Claro que isto foi tudo organizado. É evidente que estavam convencidos que ganhavam. É evidente que perderam. E é evidente que vão continuar a perder. Não é comigo, porque eu não serei mais candidato no Montepio, pela minha idade. Eu não me vou candidatar, no fim deste mandato, para acabar o próximo mandato com mais de 80 anos. Tenho de escrever as minhas memórias, tenho tanta coisa para fazer. Eu ainda tenho muita coisa para fazer. E coisas interessantes na minha vida, portanto não serei mais candidato. Mas vão continuar a perder. Eu não tenho dúvidas disso. Que vão continuar a perder. Porque não é assim que se assumem responsabilidades. Que são muito importantes numa candidatura a uma Associação Mutualista. Que é a maior Associação portuguesa. Alguém com sentido de responsabilidade não se porta desta forma. Ouviu-os falar do seu programa? Não ouviu. Ouviu-os estar a fazer campanha junto dos associados dizendo ao que vinham e mostrando o seu programa? Não viram. Porque estavam convencidos que mobilizando os órgãos de comunicação social, mobilizando um conjunto de opinadores nas televisões e na rádio. Não viram programas são em contraditório a esmo? Não viram que houve aqui uma mobilização de uma parte de pessoas que andam na comunicação social contra o Tomás Correia e contra a sua candidatura?
Mas acha que há uma cabala contra si?
Não, não há uma cabala. Há um conjunto de interesses muito grande. Que eu não consigo medir nem sei quem são. Agora, isto não é forma de fazer campanha. É normal nós assistirmos em todos os canais televisivos a programas sobre as eleições do Montepio em que há sempre um ataque frontal a uma candidatura e um apoio claro a outras candidaturas? Foi isso que se viu. Um alinhamento absolutamente inacreditável.
Em conclusão, e antes de falarmos um pouco mais em detalhe sobre a Associação propriamente dita, em conclusão, não vê razões para sair da liderança da Associação Mutualista?
Não, enquanto eu sentir o apoio dos associados, enquanto eu sentir que a relação de confiança entre os associados e a sua associação, entre os clientes do grupo e o Grupo Montepio, eu não tenho nenhuma razão para sair. Se, por ventura, alguém, por uma forma legal, der esse passo, terá que assumir as suas responsabilidades. Nomeadamente perante mim próprio.
Na Associação Mutualista, em todo o caso, tem aqui também algumas questões que tem levantado críticas e dúvidas. É o caso das contas. Fechou o ano 2018, excluindo questões fiscais – a questão doa ativos por impostos diferidos – fechou o ano com um prejuízo de seis milhões de euros, excluindo este efeito. Já em 2017 só teve lucros graças a estas questões fiscais, e, no ano passado o número de associados chegou a um mínimo de cinco anos. Há motivos para estar preocupado?
Não. Olhe, se for ver… Começando pelo número de associados. Se forem ver o número de associados no setor mutualista em 2010 e se olharem para o número de associados hoje vão verificar que os associados mutualistas, no conjunto do movimento mutualista, se reduziram em cerca de 150 mil. Bom, era natural que o Montepio representado praticamente mais de 90% do setor tivesse proporcionalmente essa redução. Não teve. O Montepio tinha, em 2010, 640 mil associados, números redondos, tem hoje 612, por aí. Portanto teve um comportamento muito significativo relativamente a esta matéria. Saíram muitos associados porque, uma das fontes de alimentação do movimento associativo, no Montepio, era o crédito habitação. O crédito habitação, como sabem, teve um decréscimo muito grande, o Montepio tinha uma carteira de crédito habitação muito antiga, à medida que essas operações foram vencendo o associado que apenas estava vinculado com uma espécie de seguro, um produto mutualista assimilável a seguro relativo à habitação, deixou de ter interesse e, portanto, perdeu o vínculo associativo. E isto representa mais de metade das perdas dos associados verificadas ao longo destes nove anos, praticamente. Por conseguinte isso não pode ser uma preocupação. A partir de agora, aquilo que nós sentimos, com todo o conjunto de medidas que estamos a tomar, é que há, sente-se… a poupança dos portugueses, que é também muito importante… a associação é uma associação de pessoas. Se a poupança dos portugueses cai, de uma forma brutal como está a cair, reparem na Europa as famílias europeias, a poupança, em termos médios, anda nos 12%. Em Portugal anda nos 4,6 / 4,7, no final do ano passado. O que quer dizer que as famílias portuguesas têm aqui um problema ao nível da poupança, e portanto, não há produtos mutualistas nem há associados se não houver uma classe média que poupe. E que poupe no sentido de preservar aquilo que é o seu futuro longínquo. E, portanto, é natural que haja aqui alguma limitação. Ainda assim no ano passado nós recebemos… entraram mais cerca de 25 mil novos associados para o Montepio. E, portanto, estando estancada a perda, ou as razões da perda, do nosso ponto de vista, nós vamos assistir a uma retoma muito razoável. À semelhança daquilo que aconteceu ao longo dos primeiros anos da minha presença no Montepio. Hoje toda a gente se esquece que o Montepio tinha 200 mil associados quando eu lá cheguei. Certamente não é por incompetência que eu cresci tanto, multipliquei por três vezes ou mais o número de associados e de repetente tornei-me um incompetente, juntamente com os milhares de homens que ali trabalham e com os meus colegas também, dos órgãos sociais, e deixámos de ter capacidade para captar associados. Provavelmente não é um problema subjetivo da capacidade de quem dirige, é um problema objetivo do país que inviabiliza estas coisas.
Mas o que explica os resultados? Estes prejuízos?
Os resultados, veja bem: nós temos 2.400 milhões na Caixa Económica. Que não paga dividendos, tal como não paga os bancos portugueses. A Caixa Económica não viveu num ambiente amniótico, a crise passou ao lado e a Caixa Económica do Montepio continuou a ganhar dinheiro e a distribuir dividendos. É obvio que não. À semelhança do que aconteceu no sistema financeiro a Caixa Económica também está, hoje, numa situação em que não distribui dividendos. Portanto, nós temos ali um capital que, neste momento está improdutivo. Mas não nos preocupa. Porque nós sabemos que a situação da Caixa Económica se vai recuperar e, à semelhança daquilo que aconteceu ao longo da sua história, a Caixa Económica vai produzir, no futuro, muitos resultados para o Montepio. Ou seja, o Montepio… a Associação Mutualista tendo ali mais de metade do seu balanço, obviamente, com taxas de juro tão baixas, a outra metade não é suscetível de produzir tantos rendimentos como desejáveis. Agora, ainda assim, se eu estivesse no Montepio, a trabalhar para a fotografia, para ter bonitos resultados, podem ter a certeza que eu rapidamente arranjava resultados. Eu vou só referir-vos dois exemplos. O Montepio trabalhou, nestes anos, para vir a ter uma intervenção, na área da habitação, muito forte nos próximos anos. Nós temos hoje terrenos de grande qualidade em Lisboa, na Praça de Espanha, por exemplo, onde vamos construir 32 mil metros quadrados de construção. Bom, aquele terreno está no nosso balanço por 23 milhões de euros. Se tiverem em conta o preço que a Fidelidade comprou em Entrecampo, na antiga Feira Popular, comprou os terrenos a 1.500 euros o metro quadrado. Se eu avaliar 32 mil e qualquer coisa metros quadrados vezes 1.500 – e a Praça de Espanha se calhar é melhor do que Entrecampos – facilmente concluiremos que estamos ali perante um terreno de 50 milhões. Bastava-me, provavelmente, reavaliar isto e aquilo de que estamos a falar não existia. Mas eu não tenho, não tenho interesse em trabalhar para a fotografia. O único interesse que me mobiliza é trabalhar para a solidez da instituição. Mas, posso-lhe dizer, só ao nível do património imobiliário nós poderíamos ter feito reavaliações que nos conduziriam a qualquer coisa como 75 milhões de impacto positivo na conta de resultados.
Então está a dizer que tem ativos que estão subavaliados?
Subavaliados. Muitos ativos estão subavaliados. E vou-lhe dizer. Tenho ativos subavaliados em Lisboa, no Porto, em Faro, em Coimbra. Em zonas centrais.
É que a critica que ouvimos mais é de que, neste caso, na Associação, falando na Associação, é de que tem registados ativos sobreavaliados. E, portanto, a valer acima do seu valor.
Pelo contrário.
É o caso da avaliação que faz do Banco Montepio? Que aliás, teve um alerta por parte dos auditores.
Não tem alerta nenhum, tenha paciência que não tem alerta nenhum. O que o auditor explicou, através daquilo que se chama uma ênfase, não é nenhuma reserva. Foi explicar como é que nós avaliámos a participação na Caixa Económica. Vamos lá ver. A avaliação que se deve fazer nas participações, não é uma avaliação em função da situação líquida. Para isso não é preciso avaliar. A situação líquida da Caixa Económica é o que é. Está lá. Mas isso não é nenhuma avaliação.
Portanto insiste que não está sobreavaliado?
Não é um problema de insistência. É um problema de saber que não está sobreavaliado.
O banco Montepio voltou agora ao mercado, para tentar convencer investidores a subscrever dívida do banco, no montante de 150 milhões de euros, em dezembro já tinha tentado vender obrigações subordinadas, não teve sucesso, acabou por ser a Mutualista a financiar o banco em 50 milhões de euros. A Associação vai voltar a fazer o mesmo, se esta nova emissão falhar?
Não. Nem sequer discuti isso. O banco, como sabe, tem um rácio de capital total que ultrapassa os 14%, portanto é confortável
Tem de ter 13,6, em julho…
Está bem, mas, tem um rácio que ultrapassa os 14%. Tem um rácio de Core Tier 1 bastante folgado, também como sabem, o chamado capital puro, é um rácio muitíssimo folgado, quando comparado com o que se passa no sistema. Não tenho dúvidas nenhumas que a perceção daquilo que é risco país e da atividade financeira em Portugal com certeza que tem portas abertas para que a Caixa Económica possa fazer emissão de dívida subordinada. Gostava só de lembrar que o mercado fechou. O Montepio historicamente tinha … e estamos a falar de 2007, por exemplo, cerca de 500 milhões de dívida subordinada. Bom, entretanto, com a crise, a dívida subordinada, enfim, foi um instrumento que… ao qual não se pode recorrer. E a Associação Mutualista, obviamente, teve de substituir a dívida subordinada por capital.
Mas este ano pode voltar a fazê-lo?
Não. A ideia que eu tenho, e que me é transmitida, é que há condições e há investidores interessados em tomar dívida subordinada da Caixa Económica.
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