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Os dados são de abril e desiludem. O volume de negócios das atividades do turismo terá ficado, no primeiro mês passado integralmente em desconfinamento, bem aquém do necessário para uma recuperação. Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) conhecidos ontem, o índice de volume de negócios na restauração e no alojamento não representou mais que 47% dos níveis do mesmo mês de 2019, empurrando para baixo o índice dos serviços.
“É um dado um bocadinho sofrível”, reconhece o economista Pedro Afonso Fernandes, do NECEP, o laboratório de previsões económicas da Universidade Católica, que só a 7 de julho avança cálculos para o segundo trimestre. À partida, a economia irá “crescer um pouco aquém daquilo que se esperaria”, antecipa nesta fase.
“Toda a parte do alojamento e restauração está a crescer, mas muito pouco. Continua muito abaixo do que seria desejável. Isso vê-se também noutro indicador, o das dormidas, que continuam muito fracas”, nota. “Podemos dizer que a culpa é dos ingleses ou não é. Acho que não é. Acho que é um problema geral, uma questão que extravasa até a própria conjuntura”, diz o economista da Católica, lembrando que a fileira turística “gera pouco valor acrescentado e ordenados baixos”. Apesar do peso importante no emprego, tem fraco poder na retoma.
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“Vai haver uma melhoria no segundo trimestre, mas não é uma melhoria nem completa nem espetacular”, antecipa Pedro Afonso Fernandes, economista da Universidade Católica.
Noutra instituição, o ISEG, a última síntese de conjuntura continua a apontar fortes incertezas quanto à recuperação deste setor. “A procura turística, no imediato, não volta aos níveis que tinha em 2019. Na melhor das hipóteses, irá voltando. Mas não sabemos se não vão existir alterações da procura por parte das pessoas, alguma mudança de atitudes”, acautela o economista António Ascensão da Costa, responsável pelas previsões económicas da instituição.
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© Infografia: Pedro Panarra
Haverá melhorias em maio, em junho, tendencialmente, mas não é do turismo – o mais frágil setor da pandemia – que se pode esperar crescimento. Para o ISEG, o segundo trimestre dará até mais 15% ao PIB face ao afundamento da primavera de há um ano, e um ganho que pode ir aos 4,4% face ao primeiro trimestre. Mas é ganho relativo de quem muito caiu. “Há um impulso de crescimento, que é o impulso de retoma devido ao efeito de base”, resume Ascensão da Costa.
Embora a produção industrial permaneça abaixo do desejável, o volume de negócios da indústria avança. Tem melhorias, sobretudo, nos bens que são fornecimentos também ao setor industrial: preparados farmacêuticos, minerais, borracha, metalurgia. E na frente das exportações, em abril, as vendas ao exterior foram já além dos patamares de 2019. “Nas exportações que têm que ver com a interação com a economia europeia, sobretudo, a reação de abril foi muito boa e é provável que tenha alguma sustentação”, diz o economista do ISEG.
Já Pedro Afonso Fernandes estranha o descompasso entre vendas e produção, e admite que estejam a arrastar-se ainda os efeitos do estrangulamento das cadeias internacionais de comércio. A produção industrial, diz, “está numa espécie de um planalto há quatro, cinco meses, o que é estranho”. “Porque é que a produção industrial não dá um salto? As exportações dão e a produção industrial não dá? O que pode estar a acontecer é estarmos a exportar coisas que tínhamos em armazém, stocks acumulados”, equaciona.
Depois, alerta, “há a questão de até podermos querer produzir mais, mas não sermos capazes porque não há matérias-primas suficientes”, num momento em que a produção industrial na China segue lenta e os fretes do transporte marítimo estão a preços elevados. A disrupção no comércio internacional “ainda não foi debelada”.
“Talvez mais para o final do ano, veremos se a economia portuguesa irá acompanhar o crescimento europeu”, diz António Ascensão da Costa, economista do ISEG.
Os dados dos negócios do retalho, por outro lado, mostram-se ao nível de 2019, mas se, no índice de abril publicado pelo INE, o retalho alimentar segue melhor que dois anos antes, tal não sucede nas vendas de produtos não alimentares, que se mantêm aquém.
Já a construção nunca travou nos longos meses da pandemia, e segue a apoiar os números de investimento. “O licenciamento para fogos novos recuperou bastante”, assinala António Ascensão da Costa. Para o economista, o impulso vai persistir positivo no investimento da construção, em maquinaria, transportes terrestres e em componentes como software.
Pedro Afonso Fernandes converge. “A construção e o investimento foram a grande surpresa do primeiro trimestre, e os dados apontam para que continue a ser assim. Vamos continuar a ter investimento – nomeadamente, oriundo da construção – e vamos ter mais consumo”, prevê. “Agora, aparenta não ser uma coisa pujante”.
No curto prazo, e visto a partir da Universidade Católica, “vai haver uma melhoria no segundo trimestre, mas não é uma melhoria nem completa, nem espetacular”, segundo Afonso Fernandes.
Mas, é cedo para ver mais longe, mesmo perante a revisão em alta das expectativas para o conjunto da Zona Euro. “Chegará ali um momento em que, talvez lá mais para o fim deste ano, veremos se de facto a economia portuguesa irá acompanhar o crescimento europeu. Tendencialmente, tende a acompanhar o crescimento europeu, a interdependência é muito forte. Mas neste momento atual tem o fator constrangedor do crescimento da atividade turística”, diz Ascensão da Costa.
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