Num país envelhecido, há setores da economia em que o peso da idade se faz sentir mais do que noutros e onde não é necessariamente a reduzida taxa de natalidade que o justifica, mas antes questões de natureza orçamental. Foram constrangimentos de ordem financeira que ditaram a restrição de entradas de novos trabalhadores na administração pública e o congelamento de salários. Resultado: em menos de uma década (entre 2011 e 2017) a idade média dos funcionários públicos avançou de 43,6 para 47 anos – bem acima da média de 43,1 anos da população ativa portuguesa.
Recuemos a 2011. No final desse ano, os trabalhadores da função pública com mais 55 anos eram 16% dos mais de 727 mil funcionários existentes, enquanto os que tinham menos de 34 anos eram um quinto. Seis anos volvidos, o retrato é bem diverso. O universo global encolheu para 669 mil e, destes, um em cada quatro tem mais de 55 anos. Já os mais novos são agora pouco mais de um em cada dez.
João Cerejeira, professor na Universidade do Minho, vê vários impactos negativos nesta evolução da estrutura etária – que é transversal a todas as carreiras.
Descontinuidade
Há, desde logo, a questão de a administração pública ter maior dificuldade em se adaptar às mudanças e às novas tecnologias, mas não só. “O facto de se estar a deixar concentrar muita gente numa idade mais avançada, que se reformará dentro de alguns anos, pode levar a que haja uma descontinuidade na transmissão do conhecimento”, afirma João Cerejeira.
Esta descontinuidade será um tema especialmente sensível nas carreiras e funções em que são necessárias quase duas décadas para que a pessoa atinja o seu rendimento máximo. Exemplos? Áreas de inspeção, de licenciamento, saúde ou justiça.
Não acautelar esta situação de passagem de conhecimento, antecipa, “poderá levar a uma rutura”. A evolução da estrutura etária e do número de trabalhadores da administração pública está a sofrer os efeitos da política de admissões nas décadas de 1980 e 1990. Nessa altura, lembra o economista e professor da Universidade do Minho, a administração pública foi um motor de criação de emprego e redução do desemprego. O número de trabalhadores aumentou, mas são pessoas que estão a aproximar-se agora da idade da reforma.
No mais recente Boletim de Estatística do Emprego Público – uma das publicações regulares da Direção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP) -, o envelhecimento dos trabalhadores não passa despercebido. “Todos os subsetores das administrações públicas apresentam um índice de juventude inferior a 100, isto é, o número de trabalhadores com menos de 40 anos é inferior ao número de trabalhadores com 40 e mais anos, situação que tem vindo a agravar-se desde 2011”, precisa o documento.
E o mesmo se passa em relação ao índice de renovação, com a DGAEP a sublinhar que a quebra tem vindo a acentuar-se: era de 25,9 em 2016, tendo caído para 22,2 no final de 2017. “Em 31 de dezembro [de 2016] o índice de renovação era de 25,9, o que significa que no último ano agravaram-se as condições de rejuvenescimento nas administrações públicas. Este índice de renovação reduz-se para apenas 12,5 quando excluídos os trabalhadores das Forças Armadas e de Segurança, com maior número de jovens”, é referido.
Fisco e bombeiros
O peso da idade faz-se sentir em todos os setores da função pública, mas nuns é ainda mais evidente. É caso da Autoridade Tributária e Aduaneira, com os dados a revelarem que a idade média dos funcionário da máquina fiscal estava no final de 2017 (últimos dados disponíveis) nos 51,5 anos. Há mais setores em que esta idade média supera a barreira dos 50 anos, como acontece entre os trabalhadores dos Registos e Notariado (52,5 anos) e entre os conservadores e notários (50,4 anos).
Mesmo entre os assistentes operacionais (que concentram as funções de auxiliar da ação médica e de saúde, telefonistas, motoristas, rececionistas, entre outros), a idade média supera os 50 anos, apesar de esta ser a carreira mais numerosa. Nos professores do ensino secundário a idade média ronda os 46 anos, sendo esta uma das justificações para que Portugal surja entre os países onde as remunerações dos docentes são mais elevadas, no conjunto da OCDE.
Inversamente, os enfermeiros ostentam uma média etária das mais baixas (40,9), mas os bombeiros são quem regista o valor mais reduzido (39,9 anos).
A queda do universo de trabalhadores mais jovens é um dos efeitos da política de contenção de entradas que começou ser aplicada no início da década e que apenas há um par de anos começou ser timidamente invertida.
O governo tem dado sinais de que pretende dar mais força às novas admissões, ainda que apenas em algumas áreas, e espera-se que o programa de integração dos precários também tenha algum impacto positivo.
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