João Ferro Rodrigues é um economista que gosta de pensar além da economia. O também gestor, de 46 anos, licenciado na Universidade Católica e que fez o MBA pela Harvard Business School, tem dedicado a carreira às áreas de consultoria estratégica, energia e tecnologia.
Filho do ex-presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, pai de quatro filhas, não se cansou de dizer, nesta entrevista à Renascença, que é um otimista. É por isso que defende que o país não está estagnado, socorrendo-se do número de licenciados com entre 18 e 34 anos, que subiu de 13% para 50% em cerca de 20 anos.
Olhando para o Orçamento do Estado de 2023 (OE 2023), defende as opções tomadas pelo Governo, que diz não ter querido “jogar já as cartas todas”. Acredita que o documento é propositadamente conservador, para poder responder à incerteza do próximo ano. Uma coisa, contudo, é certa: os portugueses vão viver com menos euros na carteira já a partir de janeiro, diz Ferro Rodrigues.
Define-se como um homem de esquerda, mas nem por isso é menos adepto de contas certas. Defende mesmo que é um condição para esquerda moderna governar. Só com um défice controlado, argumenta, se pode reforçar os serviços públicos e não dar munições à direita para destruir o estado social.
Por fim, fala do mito da meritocracia e da necessidade de rebentarmos as bolhas em que vivemos. Autor do livro “A Era do Nós”, acredita que temos à porta o comunitarismo, que tomará o espaço do individualismo.
Vivemos num país em que a maior parte da população se queixa constantemente do Estado, seja o cidadão comum ou os empresários. No entanto, nas horas de crise olhamos sempre para o Estado como a entidade que vai resolver os nossos problemas. A que é que se deve esta atitude aparentemente antagónica?
Bem, penso que é a prova de que falta aqui um nível intermédio, mais comunitário, para resolver alguns dos problemas. Nós temos a sensação de que a nível individual há coisas que nos escapam e que precisamos de uma força coletiva para os resolver. Mas outras vezes sentimos que o Estado, enquanto poder central, se calhar é uma força demasiado opressora para esses mesmos problemas.
Acho que falta ao nosso país um pouco mais de capital social, mais capacidade de organização coletiva, quase de bairro a bairro, a nível do associativismo. Para podermos resolver as questões face às quais, muitas vezes, sentimos impotência a nível individual e opressão a nível do Estado.
“Chegámos a uma estagnação económica que é perigosa, porque cria um desânimo em relação ao que a democracia pode trazer. Isto tem perigos muito grandes e evidentes; quando uma pessoa já não tem nada a perder, muito mais facilmente abraça propostas mais radicais, em que na realidade tem muito mais a perder, mas nem imagina.”
Portanto, diria que é esse “layer” intermédio que, enquanto sociedade civil, é necessário cada vez mais organizar.
Essa é uma das críticas que se aponta à sociedade portuguesa, a fraca participação na vida comunitária. Isso deve-se a quê?
Tem raízes históricas. Antes de mais, a nossa história sempre foi um bocado centralizadora a nível do poder político e, portanto, foi tarde que começámos a criar relações mais horizontais, relações mais normais, mais transversais, que não dependem de alguém que é o nosso superior a nível hierárquico ou de poder.
Mas eu sou otimista por natureza. Acho que temos feito um caminho muito interessante. Muitas das críticas que referiu inicialmente da sociedade civil a rebelar-se contra aquilo que acha que são serviços que não têm qualidade, há quem veja a parte negativa disso, que é o facto de estar a ser criticado.
Mas também podemos ver a face positiva, que é a de já haver sociedade civil organizada para refilar, porque exige mais e, muitas vezes, já a organizar-se para trazer soluções também.
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