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António Ramalho vai deixar a liderança do Novo Banco em agosto, seis anos depois de ter assumido o cargo. A saída, a meio do mandato, foi anunciada ontem pelo CEO do banco ao Conselho Geral e de Supervisão (CGS). A instituição refere, num comunicado enviado ao mercado, que António Ramalho acredita ser este o momento certo para anunciar o seu desejo de deixar o cargo, após ter concluído o plano de reestruturação. No entanto, o anúncio surge numa altura em que o líder do Novo Banco tem estado sob pressão devido à sua alegada ligação a Luís Filipe Vieira, um dos maiores devedores do banco.
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Apesar de uma auditoria interna pedida pela acionista Lone Star ter concluído que António Ramalho agiu com “total integridade”, a idoneidade do banqueiro continua a ser analisada pelo Banco Central Europeu. Contactado recentemente, o supervisor da banca europeia disse ao DN/Dinheiro Vivo que ainda não existiam novidades sobre esse processo. No entanto, o comunicado do Novo Banco não faz qualquer referência a este caso, sublinhando apenas o “contributo” e “dedicação” de António Ramalho para os resultados do banco.
Em causa está a Operação Cartão Vermelho, investigação levada a cabo pelo Ministério Público sobre as relações do antigo presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira, com a banca. No âmbito deste processo, foram reveladas escutas telefónicas a indiciar que o CEO do Novo Banco terá tentado preparar o antigo presidente do Benfica, antes das audições no Parlamento a propósito das perdas registadas pelo banco e imputadas ao Fundo de Resolução.
António Ramalho sempre se mostrou tranquilo com as escutas, refutando quaisquer ligações ao ex-presidente do Benfica. “Não há nenhuma fotografia minha com Luís Filipe Vieira”, defendeu a 9 de março na apresentação das contas anuais, garantindo ainda que estava “comprometido com o banco até 2024”, data em que terminava o atual mandato.
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Sobre o sucessor para o cargo de presidente executivo, o Novo Banco informa apenas que vão ser desencadeados pelo órgão competente – o Comité de Nomeações do CGS – os procedimentos normais e as suas conclusões “serão anunciadas oportunamente, logo que concluído o processo”.
O gestor irá permanecer aos comandos do banco até à apresentação das contas semestrais “por forma a garantir uma transição tranquila e sem qualquer perturbação”. Mas a ligação de António Ramalho ao Novo Banco não vai terminar em agosto. O gestor irá permanecer como consultor da instituição tendo celebrado na quinta-feira “um acordo de serviços de consultoria e assessoria, com reporte direto ao presidente do CGS”, adiantou a instituição no mesmo comunicado.
Seis anos com polémicas
António Ramalho assumiu o cargo de presidente executivo do Novo Banco em 2016, vindo da Infraestruturas de Portugal, sucedendo no cargo a Eduardo Stock da Cunha.
Foi já durante o seu mandato que o banco foi vendido à Lone Star e avançou com um novo plano de reestruturação. A conclusão desta tarefa foi destacada pelo órgão de fiscalização do Novo Banco, que não poupou elogios ao gestor. Byron Haynes, presidente do CGS, destacou, em comunicado, o contributo do banqueiro para “garantir a viabilidade de longo prazo” do Novo Banco. E acrescentou que “António Ramalho foi o rosto da liderança de um processo de transformação do banco, que incluiu a concretização de todos os compromissos definidos no plano de reestruturação”.
A conclusão deste processo foi feita com o apoio dos contribuintes. Até ao momento, o Novo Banco recebeu cerca de 3,4 mil milhões de euros do Fundo de Resolução ao abrigo do mecanismo de capital contingente, criado em 2017 para vender o banco à Lone Star e proteger esta entidade de perdas relacionadas com ativos tóxicos herdados do BES. O teto máximo desta solução é de 3,89 mil milhões de euros. Estas injeções de dinheiro no banco têm gerado uma chuva de críticas dos vários partidos e levaram mesmo à constituição de uma comissão parlamentar de inquérito para passar a pente fino as vendas de ativos feitas pelo Novo Banco com perdas avultadas e que criaram uma fatura pesada para o Estado. Também os restantes bancos têm alertado para os valores elevados pedidos pelo banco liderado por António Ramalho, devido às responsabilidades que têm de assumir perante o Fundo de Resolução. Esta entidade é financiada pela banca, mas teve de recorrer a empréstimos do Tesouro e junto do setor financeiro para poder responder às necessidades de capital do Novo Banco.
Antes da saída, António Ramalho conseguiu que o banco tivesse o primeiro resultado anual positivo desde que foi criado na sequência da resolução do BES, em 2014. Em 2021, o Novo Banco lucrou cerca de 185 milhões de euros. Apesar disso, a instituição solicitou mais 209 milhões de euros ao Fundo de Resolução. Um pedido que já mereceu a discordância desta entidade e críticas por parte de responsáveis políticos.
Em tom de balanço e despedida, António Ramalho sublinhou, no mesmo comunicado, o “privilégio que constituiu a possibilidade de liderar uma vasta equipa num processo único e irrepetível, numa conjuntura adversa e em cujo sucesso poucos acreditavam, preservando um banco sistémico, milhares de postos de trabalho e um incontável número de empresas, e dessa forma o normal funcionamento da economia portuguesa”.
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