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O empresário português Armando Pereira, cofundador do grupo Altice, vai comparecer este sábado perante um juiz para primeiro interrogatório, na sequência da investigação do Ministério Público (MP), que suspeita que o Estado e a Altice terão sido lesados em mais de cem milhões de euros com a alegada simulação de negócios e ocultação de proveitos na venda de património imobiliário da antiga PT.
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Além do empresário, foram detidas para interrogatório outras duas pessoas. Segundo o Correio da Manhã (CM), trata-se de Jéssica Antunes (filha de Hernâni Antunes, parceiro de negócios de Pereira cuja a localização as autoridades ainda estão a procurar) e de Álvaro Gil Loureiro. Ambos serão donos de sociedades envolvidas nas operações suspeitas. Os três detidos serão ouvidos pelo juiz Carlos Alexandre, no Tribunal Central de Instrução Criminal, em Lisboa, segundo o CM e a CNN Portugal.
O Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) do MP confirmou na quinta-feira a realização de “cerca de 90 buscas, domiciliárias e não domiciliárias – designadamente a instalações de sociedades e escritórios de advogados – em diversas zonas do país”, nos dias 13 e 14 de julho, resultado de uma investigação iniciada “há cerca de três anos” pela Inspeção Tributária de Braga.
Está em causa a suspeita de práticas de crimes de corrupção, branqueamento, fraude fiscal e falsificação, incluindo, alegadamente, a “viciação do processo decisório do grupo Altice, em sede de contratação, com práticas lesivas das próprias empresas daquele grupo e da concorrência”, bem como a “lesão dos interesses do Estado, em sede fiscal e da verdade tributária”. O DCIAP acredita ter identificado uma “vantagem ilegítima” superior a 100 milhões de euros.
Na sequência das buscas, que também se realizaram na sede da Altice Portugal, em Lisboa, foram “apreendidos documentos considerados relevantes para a prova dos ilícitos indiciados bem como objetos representativos do resultado dos mesmos, tais como viaturas de luxo e modelos exclusivos com um valor estimado de cerca de 20 milhões de euros”, segundo o DCIAP.
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Um dos focos terá sido a alienação de quatro edifícios em Lisboa por 15 milhões de euros, envolvendo um circuito empresarial com ligações a Braga, à Zona Franca da Madeira e ao Dubai. Estes negócios terão passado também por Hernâni Antunes, reconhecido parceiro de negócios de Armando Pereira. A casa de Hernâni Antunes também foi alvo de buscas.
Em março de 2021, já a revista Sábado tinha noticiado quatro negócios imobiliários envolvendo a Altice, os empresários Armando Pereira e Hernâni Antunes, e o gestor Alexandre Fonseca (então CEO da telecom), precisamente, no valor de 15 milhões de euros.
Tal como o Dinheiro Vivo escreveu na sexta-feira, diferentes fontes do setor das telecomunicações ouvidas, e que não quiseram ser identificadas, avançaram que Hernâni Antunes é conhecido pela alcunha de “o comissionista”. As mesmas fontes descreveram Armando Pereira como um gestor discreto. Não obstante, não se mostraram surpreendidas com o sucedido ao afirmarem que o perfil de gestão do empresário passa por criar uma complexa “teia” de “empresas laterais” para realizar negócios com a empresa de telecomunicações.
Segundo o Nascer do Sol, também houve buscas no Porto, em Viana do Castelo, em Aveiro, em Vila Real, em Faro e no Funchal, dando conta que o processo terá tido origem na Operação Monte Branco e que poderá, também, estender-se à investigação de alegadas comissões relacionadas com a venda dos direitos de transmissão televisiva do Futebol Clube do Porto à dona da Meo. O semanário escreveu, ainda, que Armando Pereira e Hernâni Antunes são os principais suspeitos das autoridades, com o cofundador da Altice sob suspeita de ter desviado 250 milhões de euros.
Do Minho à detenção. A vida do cofundador da Altice
O Minho de Guilhofrei. Armando Pereira nasceu em março de 1952. Tem 71 anos. Natural de Guilhofrei, Vieira do Minho, Braga, vem de uma família numerosa com 18 filhos. Num perfil publicado pela revista Visão, em 2015, aquando da venda da PT à Altice, escrevia-se que o português sempre teve ambição para fugir à pobreza no Minho.
Emigrar, a única alternativa. Aos 11 anos, com a quarta classe, sai de casa. Foi para Fafe, depois Pevidém (Guimarães) e, mais tarde, Espinho. Trabalhou em feiras até que decide emigrar para França. Por lá viveu em bidonvilles, nos arredores de Paris e em Nancy, onde trabalhou na construção civil e como pomblier, a instalar canos nas ruas.
O início. Chegou a França com 14 anos com a roupa que tinha vestida e dois mil escudos no bolso. Casou com a filha de um empreiteiro da construção civil para quem trabalhava. Hoje, segundo a Visão, tem uma filha, dois netos, e fez do genro braço direito nos negócios. Foi aproveitando oportunidades até começar a lucrar.
O primeiro grande negócio. Viu uma oportunidade a abrir valas para as telecom e criou a Sogetrel, nos anos 80. Vendeu a empresa em 1999 ao banco holandês ABN e ganhou mais de 30 milhões de euros. À revista Sábado, em 2017, disse que começou com um empréstimo de 300 mil euros, e que vendeu para “segurar o trabalho feito”.
Junta-se a Patrick Drahi e cria a Altice. Conhecia Drahi há mais de 30 anos, dos tempos em que a empresa que criara fornecia a telecom do franco-israelita de origem marroquina, que tem nacionalidade lusa também. A relação cresceu e tornaram-se sócios, em 2002, na fundação da Altice. Foi pela mão de Armando Pereira que a Altice comprou a PT.
A detenção. Embora discreto, é visto como o responsável pelo “emagrecimento” da antiga PT e pelos call centers do operador. Na quinta-feira, foi detido na sequência de uma investigação do Ministério Público, que suspeita do envolvimento do empresário em negócios que lesaram a Altice e o Estado em mais de 100 milhões.
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