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O BE acusou hoje o Governo de ter permitido “um esquema da EDP para fugir aos impostos” da venda de barragens e anunciou que vai chamar os ministros das Finanças e do Ambiente à Assembleia da República.
Esta posição foi transmitida pela dirigente do Bloco de Esquerda (BE) Mariana Mortágua, com base na análise do contrato de concessão de seis centrais hidroelétricas do Douro Internacional, ao qual disse ter sido acrescentada uma adenda para “dar a forma de reestruturação empresarial – cisão e fusão – a um negócio que é uma venda pura e simples” da EDP à Engie, com recurso a “uma empresa veículo”.
“Para que não restem dúvidas, o Governo, através da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), permitiu um esquema da EDP para fugir aos impostos, ao imposto de selo no valor de 100 milhões , abdicou de exercer os seus poderes de forma a proteger o interesse público”, acusou Mariana Mortágua, em conferência de imprensa, na sede do BE, em Lisboa.
A deputada e dirigente do BE criticou o ministro do Ambiente e da Transição Energética, João Pedro Matos Fernandes, por ter declarado no parlamento “que nem os contratos conhecia, apesar de ser obrigação do ministro conhecer este processo de ponta a ponta”.
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“Com intenção, propositadamente, ou por incúria, o facto é que o Governo desprotegeu o interesse público em favor da EDP. E por isso nós vamos voltar a chamar o ministro do Ambiente à Assembleia da República. E entendemos que há razões para chamar o ministro das Finanças à Assembleia da República, uma vez que há uma matéria fiscal envolvida neste negócio”, acrescentou.
Segundo Mariana Mortágua, o BE quer também “ter acesso a todos os contratos, inclusive os contratos estabelecidos entre a EDP e a Engie”, bem como “a todo o processo interno que a APA tem e toda a documentação que tem”, para conhecer os contornos deste negócio que, realçou, ainda “está em curso neste momento, não é um facto consumado”.
“Porque não nos parece plausível que ninguém tenha levantado dúvidas sobre um negócio onde as dúvidas são claras”, observou.
De acordo a deputada, atualmente a concessão destas seis barragens “é detida por uma empresa que tem apenas um trabalhador e que é apenas um veículo” numa “estrutura que foi montada” para “mascarar esta operação de venda sob a forma de uma fusão”, para “não pagar imposto de selo”.
No seu entender, “ao não pagar imposto de selo sobre uma operação em que o imposto de selo é devido, é óbvio que a EDP incorre numa infração fiscal, e esse é um processo que terá de correr”, porque “pretendeu utilizar abusivamente um benefício fiscal que se aplica às fusões e cisões” recorrendo a “uma construção fictícia”, o que se enquadra “na norma geral antiabuso”.
Mariana Mortágua referiu que foi o Movimento Cultural da Terra de Miranda a alertar para este processo e que o BE requereu os respetivos contratos, mas teve acesso somente ao contrato de concessão, enviado ao parlamento pela APA.
Nesse contrato “foi introduzida uma adenda para permitir este negócio de venda de barragens da EDP à Engie” sob a forma de “cisão e fusão”, através da constituição de “uma nova sociedade”, para a qual foi “transmitida a concessão das barragens, assim como a propriedade das barragens”, e cujas ações “seriam depois vendidas a uma empresa chamada Águas Profundas que está associada ao consórcio da Engie”, descreveu.
A dirigente do BE assinalou que “todo este negócio foi aprovado pela APA”, “foi aprovado pela Direção Geral de Energia e Geologia, e no dia 14 de dezembro foi incluído no contrato de concessão celebrado entre a APA, a REN, a EDP e a Águas Profundas”.
“O negócio realizou-se no dia 17 de dezembro. No dia 16 de dezembro, um dia antes de o negócio ser realizado, a EDP constituiu a tal nova sociedade, a empresa veículo, a que chamou Camirengia Hidroelétricos, S.A.. No dia 25 de janeiro essa empresa fundiu-se com a Movhera, antiga Águas Profundas, que entretanto mudou a sua denominação, transferindo para esta nova sociedade todo o seu património”, especificou.
Mariana Mortágua sustentou que, “no momento da venda da concessão à Engie, o Estado tem direito de preferência” e o Governo “poderia ter interrompido o contrato” para “rever a rentabilidade” ou decidido “fazer um leilão, com o preço base da venda à Engie”, para “procurar o melhor comprador”.
“Nenhuma dessas possibilidades ficou em cima da mesa, porque o Estado aceitou esta ideia de que se trata apenas de uma transmissão da concessão e não de uma venda”, lamentou, alegando que “o Governo conhecia o negócio” e “tinha poder para alterar as condições em que este negócio foi feito, e não o fez”.
“É um negócio que está em curso e temos o dever de não deixar que mais uma vez a EDP leve a melhor sobre os direitos dos contribuintes e sobre os direitos dos consumidores. E por isso queremos todos os esclarecimentos enquanto ainda é tempo de o travar, ou pelo menos de obrigar a EDP a pagar os seus impostos, como todos os contribuintes”, reforçou.
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