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Foi a segunda vez em menos de três meses que a CEO da TAP se sentou em frente aos deputados para prestar justificações sobre os factos e a cronologia que levaram ao pagamento de meio milhão de euros a Alexandra Reis. Mas, se a 18 de janeiro a gestora francesa estava convencida de que reunia todas as condições para continuar a liderar a empresa pública, devido à sua “boa fé” em todo o processo, desta vez foi diferente. A CEO apresentou-se ontem na comissão parlamentar de inquérito à tutela política da gestão da TAP já com uma ordem de saída da transportadora, que deverá acontecer nos próximos dias.
Christine Ourmières-Widener não poupou críticas ao governo que acusou de ter levado avante um “despedimento ilegal”. “Com tantas pessoas envolvidas não percebo como é que chegam a esta conclusão, para a minha demissão com justa causa. A minha demissão não só é ilegal como também é desajustada, não existindo qualquer respeito por uma executiva sénior como eu, lamentou.
A presidente executiva disse sentir-se “um bode expiatório” do governo. Sobre o assunto, revelou ainda ter reunido com o ministro das Finanças, Fernando Medina, um dia antes de este ter anunciado publicamente a sua exoneração e a do chairman, Manuel Beja, não tendo informado a gestora desta decisão. “Eu tive uma reunião com o ministro das Finanças no domingo à noite antes da conferência de imprensa e durante essa discussão ele expressou que a situação estava complicada, mas ele não me deu a informação que seria demitida com justa causa no dia seguinte”, informou.
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A gestora adiantou que o ministro lhe pediu que se demitisse. “O tom da reunião foi muito triste, dizendo-me que os meus resultados eram fenomenais e que eu tinha feito um trabalho fantástico, que era a pessoa certa para o cargo e que este processo [de indemnização a Alexandra Reis] tinha sido conduzido por mim com boa-fé, mas perante toda a pressão de diferentes partes, não restava ao Governo outra opção, não vendo a continuação do meu mandato”, afirmou Ourmières-Widener.
A CEO, que irá enfrentar agora uma batalha judicial com o governo para contestar a sua demissão, não tem dúvidas de que merece sair com o bónus de performance que lhe foi prometido há pouco mais de ano e meio, quando assumiu o cargo e que poderá chegar aos três milhões de euros. A gestora entrou na TAP em junho de 2021 para liderar o plano de reestruturação aprovado pela Comissão Europeia. Com as contas da companhia a descarrilar, foi prometido à CEO que se cumprisse os objetivos traçados por Bruxelas levaria, no fim do contrato, em 2026, um prémio para casa. Mas a demissão pelo governo por justa causa levanta dúvidas nesta matéria.
Como adiantou O Jornal Económico em fevereiro, esse pagamento estará sujeito a aprovação pela assembleia geral da transportadora, o que nunca chegou a acontecer. Fernando Medina adiantou, quando anunciou a exoneração pública da CEO e do chairman, no seguimento das conclusões do relatório da Inspeção-Geral de Finanças, a 6 de março, que não estavam previstas “indemnizações, apenas as compensações devidas no âmbito da lei”. Christine Ourmières-Widener faz uma leitura diferente dos seus direitos e acredita mesmo que irá receber o cheque pelo cumprimento do plano de reestruturação da companhia.
“Mereço receber o bónus porque apresentei resultados. Esse bónus é merecido porque apresentei resultados em 2022 e é completamente desassociado da minha saída em 2023. Esta é a minha interpretação”, assegurou aos deputados. A presidente aufere um salário anual de 504 mil euros e ao qual acresce um subsídio de alojamento de 30 mil euros. Recorde-se que a companhia apresentou lucros de 65,6 milhões de euros em 2022 e receitas históricas de 3,5 milhões de euros, antecipando em dois anos as metas definidas por Bruxelas, motivo pelo qual a gestora acredita ter direito ao prémio.
Governo e CFO tinham conhecimento
Sobre os acontecimentos que conduziram à indemnização de Alexandra Reis, a presidente executiva assegurou que que existiram “muitas pessoas” envolvidas num processo que, garantiu, apenas “coordenou” uma vez que não tinha conhecimentos jurídicos sobre a lei portuguesa.
“Não me parece que se possa dizer que tomei a decisão [da indemnização de Alexandra Reis]. Coordenei, mas nunca tomei e nunca a tomaria com um conhecimento que não tinha. Por isso mesmo recrutei advogados”, explicou. A ainda presidente executiva, que deverá deixar a liderança da companhia de bandeira nos próximos dias, referiu ainda que o então secretário de Estado, Hugo Santos Mendes, confirmou que o ex-ministro, Pedro Nuno Santos, autorizou o montante da indemnização de 500 mil euros a Alexandra Reis dando instruções para fechar o acordo.
Já sobre os motivos que levaram à saída da administradora da empresa, a CEO assegurou que “não foi nada pessoal”. “É verdade que Alexandra Reis não estava ajustada com a comissão executiva. Foi um desalinhamento que tinha a ver com a estratégia da companhia”, adiantou. A presidente executiva da TAP desmentiu ainda o administrador financeiro da companhia, Gonçalo Pires, que tinha garantido, na semana passada, na mesma comissão, só ter sabido da saída de Alexandra Reis numa fase tardia do processo.
“Ele [o Gonçalo Pires] estava ciente do projeto para a nova organização [da TAP], esteve envolvido em alguns domínios, estava ciente das discussões porque lhe prestava informação”, garantiu a CEO que, adiantou, no entanto, “não se lembrar” se o CFO sabia ou não dos montantes envolvidos no cheque passado a Alexandra Reis para abandonar a companhia.
*Com Lusa
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