A falta de mão-de-obra continua a agravar-se na construção. Patrões e sindicatos estimam que sejam necessários 70 mil operários, como eletricistas, montadores de ar condicionado e outros técnicos especializados. O Centro de Formação Profissional da Indústria da Construção Civil e Obras Públicas do Norte (CICCOPN) “reforçou o número de formações” para responder à “elevada procura” das empresas. Mas conta, apenas, com 2800 formandos, uma gota de água face às necessidades. Atrair os jovens é urgente. “Há ainda trabalho a fazer, por parte das entidades oficiais, para reforçar a ideia de que a formação profissional, com a sua forte componente prática realizada nas empresas, é uma opção válida em termos de aprendizagem e de percurso profissional”, defende Rui Valente, diretor do centro.
A informática e a eletricidade são as áreas mais procuradas pelos jovens. Já as empresas pedem medidores-orçamentistas, técnicas de obra e desenhadores, entre outros. O maior desafio do CICCOPN, admite Rui Valente, é “ajustar, qualitativa e quantitativamente, a oferta” às necessidades, “prementes e imediatas”, das construtoras. Há inscrições a decorrer para técnicos de instalações elétricas, de obra, de informática, administrativo e instalador de sistemas térmicos de energias renováveis, cursos que arrancam no início de setembro e terão uma duração aproximada de dois anos e meio. Atribuem dupla certificação, ou seja, equivalência ao ensino secundário e o nível 4 de qualificação profissional.
Além disso, estão, também, abertas inscrições para cursos de educação e formação para adultos nas áreas das medições e orçamentos, técnicos de instalações elétricas e técnicos ou condutores de obra. Destinam-se a quem tem o 12º ano concluído e pretenda uma qualificação profissional. Outra das vertentes em que o centro tem vindo a apostar é naquilo que designa por ‘Iniciativa Vida Ativa’, através da qual, e em articulação com os centros de emprego, procura “potenciar o regresso ao mercado de trabalho” de desempregados inscritos no IEFP, através de uma “rápida integração” em ações de formação de curta e média duração. Estes cursos são “ajustados” em função quer das “necessidades manifestadas pelas empresas, quer do perfil dos desempregados”.
O êxodo da mão-de-obra mais qualificada, seja por via dos que emigraram, no pico da crise, e não regressaram, seja devido à crescente internacionalização das construtoras portuguesas, que deslocalizam os mais qualificados, é uma das causas da falta de trabalhadores. Mas não só. Há, também, um problema de “estigma social” que afasta os mais jovens, diz Rui Valente.
Associações patronais e sindicato concordam. Para o sindicalista Albano Ribeiro é preciso “valorizar as categorias profissionais” e acabar com classificações como a do trolha, visto como pejorativo. Estes profissionais terão de chamar-se qualquer coisa como trabalhador especializado multifacetado, diz. Mas não só. Albano Ribeiro reclama, ainda, a adaptação da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) às novas realidades. “A maioria dos inspetores não são engenheiros ou técnicos de segurança”, argumenta. E lamenta que esta entidade se centre mais numa intervenção punitiva, com a aplicação de multas, em vez de adotar uma atitude pedagógica. “Temos desafiado sucessivamente a ACT a acompanhar-nos às obras, mas não temos sido bem-sucedidos”, diz.
Ricardo Gomes, líder da Associação de Empresas de Construção, Obras Públicas e Serviços (AECOPS), reconhece a falta de atratividade do sector, mas lembra que não é um exclusivo português. “É assim aqui e em toda a Europa. Uma das razões pela qual não temos trabalhadores é precisamente porque os mercados do Norte da Europa, onde a construção está a bombar, atraíram os nossos operários porque os seus jovens há muito não querem ir para o sector. E os nossos nunca mais vão voltar porque, além de ganharem mais, estão em países que lhes oferecem condições de vida para a família que Portugal não oferece”, sublinha.
Já para não falar na revolução que as companhias aéreas low cost vieram introduzir. “Um eletricista em Portugal ganhará 1500 euros. Em Dublin ganha 3 mil. E gasta menos para ir a casa ao fim de semana, se for do Norte, do que se estiver numa obra em Faro”, refere Ricardo Pedrosa, lembrando que “há uma série de fenómenos novos com que a construção se confronta e que põem uma pressão acrescida sobre a mão-de-obra”. Como o crescimento do Turismo, sector que se defronta, também, com necessidades crescentes de trabalhadores que não existem.
Para este dirigente associativo, a resposta está na criação de um sistema de vistos específico para permitir a entrada em Portugal, de forma simplificada, de operários dos PALOP e outros países onde as construtoras portugueses estão, há anos, a operar e a formar. “Temos de captar os recursos humanos onde eles existem e não estão a ser aproveitados”, argumenta. Mas está, também, na introdução de mudanças na forma como se constrói, nas técnicas e nos materiais usados.
Ricardo Pedrosa dá o exemplo do que já se faz nos países nórdicos, em que as casas são fabricadas numa lógica modular, “em ambiente industrial”, mais atrativo para os jovens. O exemplo disso é a BloKlok, uma parceria dos suecos Ikea e Skanska (uma das maiores construtoras do mundo), e que se especializaram na construção de habitação low cost, que entregam em quatro meses. Uma solução ideal para os programas de construção a custos controlados, mas que, em Portugal, é “impraticável” porque “é incompatível” com os procedimentos e regulamentos de licenciamento existentes.
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