Ainda é cedo para medir a intensidade do abanão que a epidemia de coronavírus provocará numa economia como a portuguesa, cada vez mais dependente do turismo. Há porém um efeito imediato, já visível, ainda que a fatura deva tardar um pouco mais: as perdas certas decorrentes do cancelamento de reservas e eventos.
Pode tardar, mas o contágio ao turismo vai chegar, assegura o economista Augusto Mateus, e cairá com mais peso sobre a Europa, “principal destino turístico do mundo”. A violência do golpe em cada país, essa, vai depender da evolução da epidemia no território. “Portugal é uma potência turística, está entre os 15 maiores mercados mundiais e é a área em que somos mais competitivos e relevantes. Nesse ponto de vista teremos um impacto muito semelhante ao da Espanha, França e Grécia”, defende.
No Sul da Europa, Itália deverá ser, pelo menos para já, o país mais castigado. “Teremos eventualmente menos impacto do que Itália, que tem um nível maior de exposição à epidemia e portanto vai sofrer mais. As próximas semanas ditarão se haverá europeus mais afetados do que outros. Para já, se as coisas permanecerem como estão, é lá que haverá maior redução da procura”, acredita Augusto Mateus.
Um dos principais pontos turísticos do globo, Itália recebe todos os anos milhares de turistas – havendo até queixas de que há excesso de viajantes a lotar cidades como Roma ou Veneza. O coronavírus veio mudar essa imagem, conforme as enchentes deram lugar a ruas desertas: o setor do turismo estima já perdas na casa dos 7,4 mil milhões de euros, cortesia do Covid-19.
Regressando a Portugal, há também sinais de alerta visíveis. Lembrando que a recuperação económica do país aconteceu muito graças ao turismo, o economista Pedro Brinca sublinha que esta epidemia não é o único desafio que o setor enfrenta. “A crise colocou Portugal no mapa e ao mesmo tempo houve” questões geopolíticas que afetaram os destinos do Norte de África; “tudo isso ajudou a desviar turismo para aqui. Agora, temos um duplo desafio: o brexit e o coronavírus”.
O facto de ainda estarmos na chamada época baixa, apesar de tudo, joga a favor da nossa economia, lembra o também professor da NovaSBE. “Tudo depende de como o vírus evoluirá daqui para a frente”, diz, acrescentando que se nas próximas semanas se verificar uma acalmia e o regresso à normalidade, o efeito no turismo “será apenas mau”, já vez que o calendário permite ainda gerir muitas futuras reservas.
Alojamento teme quebra
Com a cascata de cancelamentos e adiamento de eventos nacionais e internacionais a ganhar intensidade nos últimos dias, o risco atinge já todo o tipo de ajuntamentos capazes de trazer estrangeiros ao país – do Fantasporto ou da Meia Maratona, neste mês, aos Santos Populares, passando por eventos como o congresso Planetiers (patrocinado pelo governo e pela CML no Altice Arena), à Queima das Fitas ou às peregrinações a Fátima, em maio. Ainda esta semana a Bolsa de Turismo de Lisboa, que devia arrancar quarta-feira, foi adiada para final de maio.
A hotelaria já assume ter recebido cancelamentos, embora ainda não quantifique perdas. E Eduardo Miranda, presidente da Associação do Alojamento Local em Portugal, assume que “até ao final de fevereiro houve casos pontuais sem efeitos significativos, contudo desde os primeiros dias de março que houve um aumento de pedidos de cancelamento e pedidos de informação sobre como anular reservas”. Dentro do alojamento local, é nas hospedagens tipo guest houses e hostels que há mais preocupação. “Em apartamentos e moradias tem havido cancelamentos mas não em número exagerado”, sublinha, acrescentando que a grande preocupação é “a redução das reservas para os próximos meses. Estima-se que março vá ser um mês de queda de receitas de ocupação. A gestão para a frente é feita de semana a semana”.
Adiar feiras e congressos tem sido uma das opções das organizações, penalizando os hotéis de cidade, mas essa não a única opção. O Programa de Captação de Eventos Corporativos e Congressos Internacionais, do Turismo de Portugal tem 62 eventos sinalizados até junho, sem registar qualquer cancelamento, apenas um adiamento, assegura fonte oficial. O valor do investimento total associado a estes eventos supera os 800 mil euros, dos quais 677 mil são do Turismo de Portugal.
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