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A única coisa melhor do que uma revisão do ano que passou é a projeção do que aí vem assim que baterem as doze badaladas. E 2024 promete ser um ano decisivo para o futuro da indústria tecnológica e a forma como lidaremos com o seu impacto na sociedade. Depois de um ano que fica para a história por causa da ascensão da Inteligência Artificial generativa, 2024 trará testes muito importantes. Vai avançar a regulamentação europeia do segmento? Vamos assistir a uma transformação do mercado de trabalho? Como se irá combater a epidemia de deepfakes? Quantas vezes se poderá dobrar um smartphone?
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Essas são algumas das tendências fortes da indústria tecnológica para o ano novo, que começa com a maior feira de eletrónica de consumo do mercado a nível mundial: a CES em Las Vegas, nos Estados Unidos, que decorre já na segunda semana de janeiro.
1 Inteligência Artificial Generativa em todo o lado
Se já foi difícil escapar ao buzz em 2023, no novo ano a IA generativa irá tornar-se omnipresente, passando do entusiasmo inicial para alterações concretas na forma de trabalhar e no que é possível fazer. Os analistas Mike Bechtel e Bill Briggs, da consultora Deloitte, consideram que a tecnologia de IA generativa consegue imitar a cognição humana, tornando inútil a discussão sobre se as máquinas são ou não verdadeiramente inteligentes.
“Cada vez mais, as máquinas que possuem inteligência pelo menos de uma forma funcional e prática criam a oportunidade de enormes ganhos de produtividade e eficiência em ambientes empresariais, bem como a oportunidade de trazer produtos e serviços inovadores a novos mercados”, salientam. “Em muitas instâncias, ferramentas IA têm um desempenho pelo menos tão bom, senão melhor, quanto os humanos em testes de capacidades cognitivas.”
Uma pesquisa recente da consultora com a Fortune mostrou que 37% dos CEO inquiridos estão já a implementar IA generativa, e 55% estão a avaliar ou a fazer experiências com ela.
Isto está a levar a uma “corrida ao ouro”, com investidores a atirarem dinheiro para cima de toda e qualquer startup envolvida no segmento da IA generativa. A automatização chegará em breve a todas as áreas: revisão de contratos, extração de insights, geração de código, campanhas de marketing, resumos de reuniões, assistência ao cliente, e por aí fora. A IDC reviu em alta a sua previsão de investimento das empresas nesta área para 19,4 mil milhões de dólares e, 2023, com expectativa de duplicação em 2024.
A rapidez com que a tecnologia está a ser adotada levanta várias questões adjacentes, tais como a possibilidade de que postos de trabalho sejam extinguidos em massa e que as capacidades sejam usadas para fins nefastos sem a regulamentação adequada.
Esse foi um dos motivos pelos quais argumentistas e atores de Hollywood passaram vários meses em greve, pedindo aos estúdios garantias de que não serão substituídos por máquinas e versões artificiais nestes empregos criativos.
Até agora, não há evidências de que as empresas estejam a tentar reduzir os seus quadros e substituí-los por “trabalhadores” sintéticos, havendo maior foco no aumento da produtividade e eficiência. Tal não afasta desafios futuros no mercado laboral, algo que deverá ser testado já em 2024.
No campo da regulamentação, a União Europeia está a trabalhar no AI Act e nos Estados Unidos o presidente Joe Biden assinou uma ordem executiva nesse sentido – embora a sua concretização no longo prazo esteja dependente do que acontecer nas eleições presidenciais de 5 de novembro. A maioria dos especialistas concorda na necessidade de algum tipo de salvaguardas, que deverão ser implementadas a nível internacional.
2 Lojas de aplicações IA
Com a adesão recorde a ferramentas de IA generativa, uma das grandes tendências do ano é o surgimento de lojas de aplicações IA. Da mesma forma que a App Store da Apple revolucionou a utilização de smartphones em 2008, estas lojas permitirão experimentar todo o tipo de aplicações envolvendo Inteligência Artificial. A OpenAI, que desencadeou tudo isto com o ChatGPT em novembro de 2022, pretende ser a referência com a GPT Store. A loja devia ter sido lançada no mês passado, mas a turbulência na liderança da organização, com a demissão e regresso do CEO Sam Altman, atrasou os planos. Está agora prevista para o início de 2024. Podemos esperar, à semelhança do que aconteceu após a inovação da Apple em 2008, que uma série de empresas lhe sigam o exemplo.
3 Deepfakes e influenciadores sintéticos
O reverso da medalha é a dificuldade cada vez maior de distinguir entre o que é verdadeiro e falso, graças às super capacidades da IA generativa. A ascensão de deepfakes, sobretudo áudio e vídeo que imitam a voz e a parecença física de determinadas pessoas, é uma preocupação cada vez maior. Estão a aumentar as tentativas de fraude, extorsão e danos reputacionais a organizações e empresários, e teme-se que as campanhas políticas de 2024 sejam abalroadas por deepfakes fabricados para prejudicar candidatos ou lançar confusão. Várias tecnológicas estão a lançar formas de distinguir conteúdos verdadeiros dos criados artificialmente, mas mesmo marcas d”água poderão não ser suficientes para evitar consequências desastrosas.
Um outro aspeto desta era de conteúdos artificiais é o aumento do número de influenciadores digitais sintéticos, que se espera que dispare em 2024. Os mais impressionantes são os influenciadores com parecença humana (não os antropomórficos), que conquistam milhões de seguidores e se tornam lucrativos online – sem nunca ficarem doentes, nunca estarem envolvidos em escândalos e nunca correrem o risco de engordar ou envelhecer. Em 2023, a startup Superplastic, que desenvolve influenciadores sintéticos, levantou 20 milhões de dólares em financiamento e tem um acordo com a Amazon Studios para os levar à televisão.
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4 Nova era de computação espacial
Os Vision Pro que a Apple irá lançar na primeira metade do ano prometem abrir uma nova era de “computação espacial”, alargando as fronteiras do que foi possível até agora com óculos de realidade virtual e realidade aumentada. Um estudo muito recente da consultora IDC aponta que este mercado vai disparar 46,4% em 2024, depois de cair 8,3% em 2023. É uma “recuperação tremenda” do segmento graças ao Vision Pro e ao Quest 3 da Meta, embora com públicos e volumes diferentes. O Vision Pro, que deverá custar cerca de 3500 dólares, será focado no mercado empresarial e irá vender em torno de 200 mil unidades no primeiro ano. O Quest 3, que custa entre 550 e 580 euros na Europa, “está a empurrar os limites das carteiras dos consumidores tornando a realidade virtual um deleite para os mais afluentes”, segundo o analista Jitesh Ubrani da IDC.
Mas é o Vision Pro que deverá mover o mercado para a frente, trazendo novas ideias e apps de programadores que vão tirar partido das suas capacidades únicas.
5 Tablets dobráveis e smartphones triplos
Este é o ano em que deveremos ver o hardware da eletrónica de consumo mais pessoal que temos a ultrapassar novos limites. Estamos a falar dos primeiros tablets dobráveis, uma progressão natural após o sucesso de smartphones como o Galaxy Z Fold e Z Flip, e dos smartphones com dobragem tripla. Mais uma vez, é a Samsung que está na linha da frente destas inovações. A fabricante sul-coreana tem planos (e uma patente) para smartphones que se dobram em três, abrindo-se para tamanhos que há uns anos eram impensáveis nestes dispositivos. O “tri-fold” Galaxy Z Flex, se tudo correr como esperado, é um dos conceitos mais interessantes do ano.
6 Eletrodomésticos (mesmo) inteligentes
Se os primeiros vislumbres do que vai ser apresentado na CES 2024 em Las Vegas dão alguma indicação, este será o ano dos eletrodomésticos realmente inteligentes. Preparem-se para uma infusão de IA em todo o tipo de dispositivos para a casa, principalmente os mais pequenos – dos aspiradores robóticos aos grelhadores e aos fazedores de gelo. Há anos que os frigoríficos, fogões e máquinas de lavar aparecem na feira superdimensionados, com cada vez mais características avançadas. Talvez seja desta que o sonho de uma rede doméstica de dispositivos que comunicam e fazem o trabalho sozinhos se torne mesmo realidade.
7 Sustentabilidade, híper personalização e saúde
Nenhum destes temas é novo mas o foco neles é cada vez maior. A questão da sustentabilidade, que ganhou um grande alento com a pandemia de covid-19, tornou-se um imperativo que as marcas têm de integrar. Isso nota-se no destaque que a CES 2024 dará à tecnologia sustentável e aos painéis em torno do tema, incluindo economia circular. Até porque, com o avanço da IA e mais gadgets conectados, o uso de energia é maior e tem de ser pensado de forma integrada.
Outro foco do ano é a híper personalização, alavancada por um consumidor cada vez mais exigente e com um orçamento mais apertado e por ferramentas de IA que permitem endereçar cada cliente de forma individualizada.
Por fim, um dos pontos centrais continuará a ser saúde e bem-estar – gadgets e aplicações viradas para a monitorização individual de indicadores como ritmo cardíaco, saturação de oxigénio, qualidade do sono e outros. Em especial, os que são virados para o público feminino, uma área que tem crescido nos últimos anos e a que se tem chamado de “femtech.”
É uma via de autonomização dos consumidores, mas também uma aposta crescente das empresas. Gadgets e soluções que monitorizam e melhoram a saúde mental, numa era de incerteza e burnout, estão na ordem do dia.
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