//Empresas recrutam cada vez mais lá fora

Empresas recrutam cada vez mais lá fora

Chegam de Inglaterra, Alemanha, Itália, Irão, Colômbia, Lituânia, Ucrânia, França, Escócia, Índia, Turquia, Brasil, Espanha, Grécia, Dinamarca. São os novos imigrantes que vêm para Portugal pela experiência e pelo desafio profissional e pessoal. Têm qualificações de topo e muitas vezes são recrutados por consultoras de recursos humanos que, a pedido de empresas portuguesas ou de multinacionais instaladas no país, procuram qualificações que as universidades ainda não oferecem ao mercado.

“É algo que tem vindo a acontecer nos últimos anos”, refere Francisco Costa Reis, senior consultant da Michael Page. E por dois motivos: “Uma procura superior ao que o país consegue fornecer de perfis qualificados” e ainda a “qualidade de vida” e a facilidade de adaptação. “A procura acaba por surgir de uma forma muito orgânica, ou seja, existe maior facilidade na transição desses perfis, até pelo desenvolvimento do país, das infraestruturas e de tudo o que suporta a vida aqui em Portugal, e também uma procura do mercado”, indica, acrescentando que são “sobretudo nas áreas da informação e tecnologia, da engenharia aplicada e da investigação e desenvolvimento (I&D).

Só no último ano e meio, a Michael Page recrutou no exterior 140 trabalhadores altamente qualificados ligados às tecnologias e aos sistemas de controlo. “Só para um projeto que está a ser desenvolvido em Portugal, com mais de 400 pessoas, cerca de 80 foram recrutadas externamente”, exemplifica Francisco Costa Reis, que assume que “vender Portugal não é tarefa nada difícil.”

Ilustração: Vítor Higgs/Animação: Nuno Santos

Ilustração: Vítor Higgs/Animação: Nuno Santos

Jovens e sem filhos

O perfil destes novos imigrantes está bem definido e apanha as faixas etárias mais baixas, no início de carreira. “O perfil, a nível de idades, ronda entre os 25 e os 33 anos, tipicamente são solteiros e sem filhos, o que permite uma deslocação mais facilitada, e são pessoas que procuram o avanço pessoal e profissional”, refere Costa Reis, acrescentando que “procuram um desafio mais arrojado e esbate-se a barreira geográfica. Tipicamente, são pessoas que se adaptam muito facilmente” (ver testemunhos na página ao lado).

Mas também com a mesma facilidade que chegam também poderão sair para outro país. “Existe uma vontade de ficar cá a mais longo prazo, não diria que seja permanente”, acredita o responsável da consultora de recursos humanos.

Quanto às empresas que procuram trabalhadores no exterior, também é possível traçar um perfil. “Normalmente são grandes empresas, multinacionais, ou que, sendo portuguesas, têm como objetivo a internacionalização”, arrisca Francisco Costa Reis. Em relação aos setores de atividade, são empresas das áreas de tecnologia, engenharias com forte componente de I&D ou centros de serviços partilhados em que procuram conhecimentos linguísticos diferentes.

“São áreas muito técnicas que exigem conhecimentos muito técnicos, quer a nível de software, de tecnologias ou até mesmo de metodologias. Nós não temos um mercado tão virado para essa área tecnológica, em que não há um avanço tão grande, sobretudo em investigação e desenvolvimento como existe lá fora já há alguns anos”.

Atrair “cérebros”

Portugal tem tentado captar nos últimos anos “cérebros”, ou seja, profissionais altamente qualificados em atividades de elevado valor acrescentado. Desde 2010 que existe o regime fiscal para residentes não habituais (RNH) que dá um desconto de 20% no IRS a pagar durante dez anos. Para isso, o governo selecionou um conjunto de profissões que acredita serem mais necessárias ao país. E, tirando os quadros superiores (administradores de empresas maioritariamente estrangeiras), até março deste ano, a categoria profissional com maior relevância era, de facto, a engenharia, com mais de 390 trabalhadores a beneficiar do regime especial de desconto em sede de IRS. É preciso também ter em conta que os portugueses que emigraram durante a crise também podem beneficiar do desconto, desde que não tenham residido em Portugal em qualquer dos cinco anos anteriores ao pedido de residente não habitual.

As Finanças fizeram uma “revisão profunda” ao conjunto de atividades de “elevado valor acrescentado”. Da lista dos residentes não habituais saíram profissões como psicólogos, designers ou arqueólogos e entram outras como diretores de hotelaria e restauração, agricultores e trabalhadores qualificados da agricultura e da produção animal.

As Finanças justificam esta revisão com as “dinâmicas da criação de emprego”, mas também com as “dificuldades” das empresas “na contratação de trabalhadores com perfis de competências e qualificações diversificados”.

DOIS TESTEMUNHOS

1. O poder do referendo do brexit

Claudia Spallarossa, 31 anos, natural de Pavia, Itália.
Habilitações: Licenciada em Engenharia Elétrica e com mestrado em Energia Sustentável

“Final de junho de 2016, o dia do referendo no Reino Unido. Apenas um convite para que jovens profissionais britânicos não saiam. Recebemos dois generosos anos para decidirmos o que fazer antes que um país inteiro começasse a desmoronar.

Expliquei a mim mesma, primeiro, e aos outros apenas mais tarde, que Portugal foi o resultado de uma análise rigorosa de custo-benefício que fiz para escolher o próximo país para emigrar. Mas não foi. Portugal era apenas um pressentimento, uma intuição que acabou por estar certa. Mudar-se sozinho para um novo país nunca é fácil, como na área do Porto, tem os seus altos e baixos, coisas que sempre foram triviais tornam-se desafios, mas rostos sorridentes, uma atitude amigável, uma abordagem útil aos problemas e boa comida estão a facilitar.

Portugal dá-nos as boas-vindas antes de desembarcar, os portugueses ajudam-no antes que perguntemos, o progresso tecnológico é rápido e o ambiente cultural é vívido. É um país disposto a acolher pessoas de diferentes origens. É um país atlântico na fronteira da Europa, com um passado interessante e um carácter assertivo que se tornou naturalmente um caldeirão, cujos ingredientes têm origens europeia, africana e americana. Na maior parte dos dias acordamos sorrindo ao nascer do Sol enquanto digerimos a francesinha da noite anterior.”

2. A comida, a bebida, o surf e as pessoas

Alexander Duncan Giles, 30 anos, natural de Glasgow, Reino Unido
Habilitações: Licenciado em Engenharia Elétrica e Eletrónica com mestrado em Física e Astronomia.

“A minha experiência até agora tem sido fantástica. O Porto tem muitas características atrativas: uma grande variedade de comida, que pode adequar-se a quaisquer requisitos dietéticos, cuja qualidade pode despertar o apetite mesmo com o estômago cheio; uma grande variedade de bebidas produzidas localmente; uma comunidade local amigável que fará que você se sinta em casa e capaz de falar em inglês, se tal for necessário; muito sol. Além disso, está perto do oceano. A proximidade com o oceano torna possível praticar desportos como a vela e o surf, enquanto o bom tempo permite a prática de desportos como o ténis, para os quais há muitos courts locais. Viajar pela cidade é muito fácil. Se a caminhada não é da sua preferência, existem ligações de metro e serviços de autocarro que são facilmente acessíveis.

Comecei a trabalhar para a Vestas Wind Systems na região do Porto em fevereiro. Depois de trabalhar na área de investigação em engenharia de turbinas eólicas durante seis anos, fiquei interessado em trabalhar com a Vestas, dado o passado da empresa e o alinhamento com os meus valores. A Vestas é uma empresa que promove a colaboração entre colegas, à medida que se esforça para produzir fontes cada vez mais baratas de energia renovável. Em resumo, recomendo viver em Portugal? Sim.”

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