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O fundador de uma organização ocupará sempre um lugar central cujo impacto se fará sentir na gestão atual e futura. Alguns investigadores defendem que a influência do fundador na organização restringirá a próxima geração, enquanto outros asseguram que é apenas uma narrativa mitificada que desaparecerá ao longo das gerações. Porém, uma coisa é consensual – a influência do fundador não se restringe à sua presença no dia-a-dia da organização, o seu impacto é duradouro, com efeitos sentidos por gerações.
Quando pensamos em empresas familiares, pensamos em tradição e sustentabilidade – na medida em que o seu objetivo passa por deixar um negócio saudável para a geração seguinte – porém, para o conseguirem, elas têm de fomentar negócios que permitam criar boas perspetivas para o futuro de várias gerações, através de ações empreendedoras. Para obter essa competitividade, é essencial uma visão focada na inovação. Um estudo da Forbes de 2017 revelou que mais de 50% das empresas mais inovadoras da Europa são controladas por famílias.
A inovação é a busca de novo conhecimento, enquanto que o passado é visto como fonte de resistência, geradora de inércia e rigidez, no sentido em que o conhecimento antigo pode tornar-se obsoleto e não atender às necessidades atuais, diminuindo assim o valor e utilidade de novos produtos que incorporem tal conhecimento.
Há diversos benefícios potenciais da utilização de conhecimento adquirido, nomeadamente maior confiança, legitimidade e menor risco de erro, os quais assumem maior importância se em contexto de grande incerteza: os consumidores olham para o que é conhecido e familiar em busca de orientação.
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A tradição envolve a acumulação de know-how, artefactos simbólicos e culturais e práticas transmitidas de geração em geração, contribuindo assim para moldar a identidade dos indivíduos, organizações e territórios. Pode inclusivamente ser vista como um recurso distinto e único. Está impressa de tal forma na cultura de uma organização que se torna inimitável, contribuindo para a sua diferenciação e raridade. As empresas que conseguirem desenvolver capacidades alavancadas na sua tradição, tornam-se capazes de criar e capturar valor da inovação e assim criar e nutrir vantagens competitivas.
O grupo CUF incorpora a missão de inovar através da tradição. Um grupo familiar fundado antes do regime de Salazar, nacionalizado com a Revolução e reconquistado pela família quando, em 1997, os netos do fundador Alfredo da Silva constituem os grupos José Manuel de Mello e Jorge de Mello, sob o lema do avô, “mais e melhor”. Os negócios do grupo inicialmente focados no setor químico, têm atualmente outro foco (o primeiro com a CUF, a Brisa, a Bondalti, entre outras e o segundo com a Nutrinveste, a Sovena e a Oliveira da Serra, entre outras).
Apesar de os negócios serem de naturezas diferentes, existe uma identidade coletiva que deriva do fundador e que é o fio condutor da autenticidade do grupo. Uma história com mais de 120 anos de uma família comprometida em seguir a visão do fundador, cuja influência permanece viva, muito além da própria empresa, criando ondas de impacto em toda a comunidade à sua volta.
O lema da CUF, era “O que o país não tem, a CUF cria”. Em 1974, a CUF tinha 180 empresas, cerca de 50 mil colaboradores e representava 4% do PIB nacional. A sua mentalidade de que tudo se aproveitava, levou à criação de vários negócios à volta do negócio principal de então, os produtos químicos. O Barreiro tornou-se assim o local de maior concentração operária de um país fundamentalmente rural durante décadas. Antigos trabalhadores da CUF ainda se referem com carinho ao grupo: “Nós não precisávamos de sair daqui, tínhamos tudo.”
Novos negócios inspirados nesta família e na sua história, assim como o desejo da própria comunidade local em preservar a memória do fundador, geram resultados organizacionais positivos em termos de identidade organizacional, produzindo e reforçando valores, normas e crenças partilhadas ao longo do tempo, criando um vínculo emocional entre o passado e o presente, que promove a sobrevivência e sustentabilidade, não só da empresa como da própria comunidade local.
A CUF ilustra bem como o passado pode ser valioso, como é possível desenvolver capacidades distintas que permitem fazer a ligação entre o passado, o presente e o futuro de maneiras significativas. Construindo sobre a tradição, é possível reinterpretar know-how adquirido. Este, combinado com soluções tecnológicas atuais, permite a adaptação às necessidades e expectativas do mercado atual, abrindo a porta à criação de oportunidades únicas para a inovação e consequente vantagem competitiva.
PhD Candidate & teaching assistant, Nova SBE
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