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Após a revelação do novo alinhamento do iPhone 14, composto por quatro modelos distintos, a filha mais nova do cofundador Steve Jobs publicou uma piada sobre o lançamento. “Eu a fazer um upgrade do iPhone 13 para o iPhone 14 depois do anúncio da Apple”, lia-se no “meme” que Eve Jobs partilhou numa história do Instagram. A imagem mostra um homem a segurar uma camisa que é exatamente igual àquela que ele tem vestida.
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A piada apontou para algo que ficou evidente durante a apresentação dos novos telefones, cujos preços começam nos 799 dólares antes de impostos nos Estados Unidos e nos 1039 euros em Portugal: são muito semelhantes aos modelos do ano passado. A Apple apresentou o refrescamento que era esperado e que calcula ser suficiente para manter a sua posição, num mercado que está em grande travagem. Melhorou as câmaras e a capacidade do processador e da bateria, adicionou funcionalidades inéditas e não mexeu nos preços – o que até foi considerado uma surpresa.
“Havia muita especulação em relação ao preço dos telefones e a Apple mais uma vez está a seguir a estratégia premium”, explicou ao Dinheiro Vivo Francisco Jerónimo, vice-presidente associado da divisão de dispositivos na IDC EMEA, que esteve na sede da Apple para o evento. “Embora haja muita preocupação com o custo de vida e as economias a entrarem em recessão, o certo é que o segmento premium foi o único cresceu no segundo trimestre”, referiu. “Apesar do mercado de smartphones estar todo a cair, o segmento premium cresceu e a Apple tem cerca de 60% a 70% desse mercado.”
Isso não deve mudar muito nos próximos tempos, mas há dúvidas sobre se o segmento premium vai continuar a crescer. “O certo é que muitas pessoas vão perguntar quais são as diferenças deste telefone para o anterior”, indicou Francisco Jerónimo.
Em termos de formato, muito poucas. A Apple introduziu o iPhone 14 e iPhone 14 Plus com os mesmos tamanhos da versão do ano passado (6,1 e 6,7 polegadas, respetivamente), com ecrã Super Retina HDR e o mesmo design. Os telefones herdam dos modelos 13 o chip A15 Bionic, com CPU de seis núcleos e motor neural de 16 núcleos, e prometem bateria para o dia inteiro. Em termos de câmara, há uma melhoria significativa na captura de imagem com baixa luminosidade e no auto foco.
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Mas as joias da coroa de Cupertino são, obviamente, os novos modelos 14 Pro e 14 Pro Max. É aqui que se vê o maior esforço de atrair os clientes que estão dispostos a pagar mais por um produto super premium, cujos preços começam nos 1349 euros e vão até aos 2149 euros (no caso do 14 Pro Max com 1 Terabyte de armazenamento).
“O que eles estão a fazer é continuar a expandir o telefone e as funcionalidades com mais performance e uma melhor câmara”, resumiu Francisco Jerónimo, referindo o novo “chipset” A16 Bionic e a câmara traseira de 48 megapíxeis, mais a qualidade do auto foco.
“São melhorias que não são propriamente radicais nem únicas no mercado, mas são necessárias para poderem ter um produto premium, porque a câmara é das coisas a que as pessoas mais valor dão e mais experimentam quando estão a decidir se vão comprar ou não”, explicou o responsável da IDC. “Vai atrair muitos designers e fotógrafos”, considerou.
A outra inovação relevante é a comunicação por satélite, uma novidade baseada numa parceria entre a Apple e a empresa norte-americana Globalstar. Todos os iPhones 14 terão SOS de emergência via satélite, para que o utilizador possa comunicar com serviços de emergência quando estiver em áreas remotas e sem cobertura de rede.
Para Francisco Jerónimo, este lançamento sinaliza um investimento de futuro. “Acho que a oportunidade está naquilo que a Apple poderá vir a desenvolver ao nível de novas funcionalidades nos próximos telefones”, referiu. “Há aqui uma grande oportunidade de poder oferecer acesso a dados e internet a cerca de 3,5 mil milhões de pessoas no mundo que ou não têm acesso à internet porque vivem em localidades sem cobertura, ou a internet é muito fraca”, indicou.
A Apple indicou na sua apresentação que o serviço SOS por satélite será gratuito nos primeiros dois anos, dando a entender que este passará depois a ser pago ou a fazer parte de um pacote por subscrição.
“Isto provavelmente vai fazer parte de mais algum serviço”, sugeriu o analista da IDC. “Estamos aqui a assistir a uma nova funcionalidade que até agora não era possível nos smartphones e que a Apple e outros fabricantes – a Huawei também lançou algo semelhante – vão começar a oferecer”, continuou.
O analista referia-se ao anúncio da Huawei que os novos telefones Mate 50 e Mate 50 Pro terão comunicações de texto por satélite, conectando-se ao sistema chinês BeiDou.
“É uma coisa bastante interessante porque estamos a falar eventualmente de um serviço pago e, mais importante, um produto de alto valor, que pode ser oferecido a pessoas que não têm conectividade em muitas localidades.” Não será apenas para zonas remotas, indicou, mas também para situações em que os utilizadores estão no meio do oceano ou de uma montanha e não vão ter cobertura de rede.
O serviço SOS arranca em novembro nos Estados Unidos e Canadá e baseia-se na comunicação entre antenas do iPhone e satélites da Globalstar, com compressão de mensagens para acelerar a sua entrega numa estação terrestre, que depois as passarão aos serviços de resposta a emergências.
Os novos iPhones, que estarão nas lojas a 16 de setembro (salvo o 14 Plus, só a 7 de outubro) também terão capacidade de detetar acidentes e alertar contactos e serviços de emergência. É uma funcionalidade que irão partilhar com o Apple Watch Series 8 e o Ultra, também anunciados no evento desta semana.
Dois novos Apple Watch
Os primeiros 50 minutos da apresentação da Apple, que foi pré-gravada mas teve um breve aceno em pessoa do CEO Tim Cook à audiência, foram dedicados ao Apple Watch e aos AirPods. Só isto permitiu entender como a marca está a encarar o atual momento do mercado de smartphones, que vai cair 6,5% em 2022.
“A Apple está a fazer com que a sua base de utilizadores expanda para novos produtos”, opinou Francisco Jerónimo. “Alguém que tem um iPhone passar a ter uns AirPods e um Watch é muito importante para eles, porque depois vêm os serviços atrás.”
A marca sabe que muitos consumidores não vão fazer upgrade dos seus iPhones para os modelos 14, mas podem ser atraídos pelos seu novos relógios ou auscultadores sem fios. “Isso depois vai levar a que haja maior consumo de serviços e fidelização no ecossistema da Apple.”
A proposta em termos de Watch foi das mais interessantes do evento. A Apple apresentou duas novidades, o Series 8 e o Ultra, com alvos bem diferenciados.
O Series 8 foi descrito pela executiva Deidre Caldbeck como “o dispositivo definitivo para uma vida saudável.” O foco está no exercício físico, bem-estar e saúde, com a adição de sensores de temperatura que monitorizam a temperatura do pulso constantemente e ajudam a detetar problemas de saúde. Esta função é deveras útil para quem está a monitorizar a ovulação e a tentar engravidar.
A outra adição importante é a deteção de acidentes. O acelerómetro do relógio deteta impactos severos e o sistema usa vários elementos, incluindo o microfone, o GPS e o barómetro, para fazer uma determinação de emergência. A partir daí pode notificar os serviços e contactos de emergência indicando a localização precisa do acidente.
Treinado durante um milhão de horas em ambiente real, o sistema só é ativado quando a pessoa vai a conduzir.
O relógio estará disponível a partir de 16 de setembro por 509 euros e promete 18 horas de bateria, com um modo de baixo consumo que pode esticar a vida até 36 horas.
No topo da categoria, a Apple passa também a ter o Watch Ultra. É um relógio virado para a aventura e condições extremas, resistente, com caixa em titânio e até 60 horas de bateria, GPS de dupla frequência e alta precisão. Foi “desenhado para ajudar a correr as corridas mais longas, explorar a natureza e os oceanos do mundo”, segundo descreveu o executivo Jeff Williams na apresentação.
O preço é bastante mais elevado que o dos outros Apple Watch: a partir de 1009 euros. Mas Francisco Jerónimo considera que a proposta vai interessar a vários tipos de consumidores.
“O Ultra é um relógio fenomenal, não só para quem faz desporto em ambientes muito difíceis mas também profissionais que trabalham em ambientes de alto risco”, considerou. “Os relógios resistentes estão a ter algum interesse por parte de profissionais, que precisam de um relógio com mais durabilidade, e a Apple está a ir ao encontro dessas necessidades.”
O reinado dos AirPods
Os auscultadores sem fios da Apple dominam o segmento e a segunda geração de AirPods Pro pretende manter esse poder. O CEO Tim Cook chamou-lhes “os melhores e mais populares auscultadores do mundo.” Aqui, o destaque é a capacidade de personalizar o áudio espacial, criando um perfil pessoal conforme o tamanho da cabeça e dos ouvidos. Trazem melhorias ao nível do cancelamento de ruído e da “transparência adaptativa”, que permite reduzir o som exterior, maior duração da bateria e resistência à água e transpiração (tanto dos AirPods como da caixa de carregamento).
“É uma categoria que a Apple continua a dominar e que vai continuar a crescer, porque continuamos a assistir à transição dos auscultadores com fios para os sem fios”, resumiu Francisco Jerónimo. “Vai continuar a crescer fortemente na Apple.” Os AirPods Pro 2 chegam a 23 de setembro por 299 euros.
O poder da marca
Sem novidades revolucionárias, esta apresentação num momento de retração do mercado mostra o poder que a Apple continua a ter. Francisco Jerónimo sublinha que a quebra é generalizada e inevitável: “os próprios altifalantes inteligentes estão a cair pela primeira vez na Europa, coisa que ainda não se tinha verificado.”
Com uma quebra das vendas à vista, a Apple está a agir para minimizar essa derrapagem, aumentando os incentivos de comprar um dos novos iPhones dando o anterior à troca. Nos Estados Unidos, um, iPhone 13 Pro pode valer 600 dólares na compra de um novo.
“A Apple é a marca que consegue reter uma grande parte do valor do produto passado 12 a 24 meses”, frisou Jerónimo. “Mais nenhuma marca consegue fazer isso. E como consegue, as pessoas sabem que quando compram o produto da Apple este vai valer mais.”
Isso pode ser suficiente mesmo num ano sem diferenças radicais e com melhorias incrementais. “Eles dizem todos os anos que é o melhor telefone de sempre e é para durar”, apontou Jerónimo. “Mas a realidade é que este é o melhor telefone que eles alguma vez lançaram, e que está a expandir para novas funcionalidades que não estavam disponíveis em nenhum telefone no mercado.”
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