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A primeira cimeira global sobre a adoção de soluções digitais sustentáveis que permitam cumprir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, Digital With Purpose Global Summit, chega hoje (das 9.00 às 17.00) ao Altice Arena. Luís Neves, CEO da Global Enabling Sustainability Initiative, que promove o evento, explica as prioridades.
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As empresas são muitas vezes acusadas de fazer greenwashing. A cimeira que acontece em Lisboa, junta várias empresas com o digital e a sustentabilidade na agenda. Preocupa-o esse facto: o ceticismo como estas iniciativas são recebidas?
O ceticismo tem razão de ser. Há muita comunicação à volta da sustentabilidade, mas – é um facto – a ação é reduzida, há muitas promessas que não são cumpridas. Esta cimeira é uma oportunidade para retomar um caminho de credibilidade e valores. Para cravar uma primeira estaca num novo caminho: de seriedade, de ação e de resposta aos problemas que estão a pôr em perigo o planeta.
É urgente cuidarmos da Terra onde vivemos, colocando o digital e a sustentabilidade no centro, ao serviço do bem estar da sociedade.
Qual o compromisso que sairá do encontro e como pode ser fiscalizado?
As perspetivas são muito positivas porque os compromissos são sérios. Vai ser apresentada uma carta com quatro pilares fundamentais.
Um primeiro para investir e inovar em áreas como a saúde e a educação digital, redes inteligentes, trabalho remoto e sistemas de transporte inteligentes, incluindo conectividade móvel e de banda larga, fundamentais para beneficiar todas as nações no caminho de uma vida próspera para todos e para diminuir o fosso digital. Estes objetivos pressupõem a concretização dos “Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas” e estabelecer soluções sustentáveis e compatíveis com um futuro não tão distante, onde vão viver quase 10 mil milhões de pessoas e, desejavelmente, com qualidade de vida.
Um segundo compromisso para adotar e comunicar ações concretas sobre mudanças climáticas, alinhadas com o Acordo de Paris, com foco em soluções transformadoras de baixo carbono baseadas em soluções digitais.
Um terceiro para apoiar a transparência, comunicar o desenvolvimento e adotar a metodologia já acordada para medir o impacto positivo das soluções digitais. E, ao mesmo tempo, reportando anualmente, de acordo com o “Digital With Purpose Framework” ( que contém as métricas para as grandes multinacionais e pequenas e médias empresas), o impacto das soluções digitais e o progresso alcançado para abordar as áreas mais críticas identificadas.
Para este objetivo, trabalharemos em colaboração com grupos internacionais relevantes, como o European Green Digital Coalition, UNFCCC-Secretariado Climático da ONU, Mission Innovation, World Business Council for Sustainable Development e a União Internacional de Telecomunicações para garantir uma estrutura e metodologia internacional comum.
Por último, desenvolver e implementar tecnologias digitais com impacto social positivo, com uma agenda de ação colaborativa para 2030 e um roteiro para adoção exponencial de soluções sustentáveis
Como avalia o desempenho real das empresas no que diz respeito à sustentabilidade? Se pensarmos que é uma realidade muito longínqua para a maior parte das PME… o balanço não pode ser muito positivo?
Há um longo caminho a percorrer. A grande maioria das empresas está a dar os primeiros passos no que diz respeito à sustentabilidade, sendo que o quadro relativo às pequenas e médias empresas é muito negro. Há muito “conversa” à volta dos chamados critérios “ESG”, muito “greenwashing” e falta de transparência. As empresas usam o poder da comunicação para prometerem objetivos que, na grande maioria das vezes, não são cumpridos. Mas a verdade é que também não existem mecanismos de verificação sérios e transparentes.
Por outro lado, criaram-se modelos de negócio à volta dos critérios ESG. O Digital With Purpose foi desenhado como uma ferramenta para ajudar as empresas a melhorarem processos, a transformarem-se internamente usando o digital e a sustentabilidade e a inovar para impactar de forma positiva os setores de atividade com os quais tem relações mais próximas. O modelo de certificação evolutivo que compreende 4 níveis, progressivos, obriga as empresas a competir e a ser “best in class”. A implementação de uma regra de exclusão do Digital With Purpose Framework para quem não progrida num determinado período de tempo e um sistema de auditoria e verificação das respostas das empresas por auditores externos que as obrigue a evoluir no processo de certificação.
Digital e sustentabilidade, como se comprometem. O digital é instrumental? Pode dar-me exemplos?
Desde 2007 que o GeSI tem vindo a desenvolver estudos (os chamados SMART reports) com grandes empresas consultoras, membros do GeSI, painéis independentes de verificação e validação dos resultados. Esses resultados têm evidenciado que o digital representa uma pegada positiva na sustentabilidade, gerando valor económico para as empresas. Por exemplo, tem o potencial de permitir reduzir 20% as emissões globais de CO2 até 2030 e, ao mesmo tempo, reduzir o consumo de recursos escassos. Representa também um efeito positivo para o crescimento. Numa avaliação de oito setores, que incluem saúde, educação, energia e alimentação, indica que pode gerar novas receitas no valor de mais de 6 biliões de dólares e cerca de 5 biliões de dólares em economia de custos, incluindo 2,3 biliões em eficiência energética. Estimativas tendo 2030 como horizonte temporal.
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O digital também tem consequências poluidoras. Não apenas os materiais usados, mas também o consumo de energia, como se compensa isso?
Como qualquer outra indústria, o digital tem consequências poluidoras. O valor global das emissões do digital está, no entanto, a diminuir relativamente às emissões globais. Há dois fatores que o explicam: as eficiências geradas dentro do próprio setor e o crescimento mais acelerado nos outros setores de atividade. O nosso relatório Digital With Purpose de 2019 estima que, até 2030, possa haver um benefício 9,7 vezes maior do que as suas próprias emissões e a pegada deve reduzir. O que representa uma melhoria considerável se compararmos com os benefícios de 2008 e 2012, de 5,5 e 7,2, respetivamente.
Diz-se que os consumidores estão mais atentos aos comportamentos das empresas. Descartam mais as empresas poluidoras. É mesmo assim?
Não tenho evidência que permita tirar essa conclusão. Vemos de tempos a tempos movimentos contra as empresas mais poluidoras mas são ações passageiras. Não partilho do ponto de vista que a resposta ao problema climático passe muito pelos consumidores. Tenho a convicção de que a resposta ao problema climático passa, sobretudo, pelas próprias empresas adotarem medidas consequentes, isto é, ao investirem em energias limpas, ao produzirem produtos mais sustentáveis, ao desenharem produtos de forma a serem mais bem reciclados e devolvidos ao mercado.
Esta é também a estratégia do movimento digital com propósito. Motivar as empresas a serem responsáveis e, para isso, oferecer-lhes a ferramenta que assenta em três pilares: redefinir o propósito, fazer o “walk the walk” – responsible business e investir e inovar para a sustentabilidade.
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