Oi com apoio da Sonangol ganha braço de ferro com Isabel dos Santos na Unitel. Miguel Geraldes, escolhido pela operadora brasileira para liderar Unitel, é o novo diretor-geral.
Miguel Geraldes é o novo diretor-geral da Unitel, um nome nomeado pela Oi/PT Ventures para o conselho de administração da operadora angolana. O português, antigo quadro da Portugal Telecom, promete uma “transição suave” na maior operadora de telecomunicações em Angola.
“Tenho conhecimento do profissionalismo da equipa da Unitel e certamente encontraremos a melhor forma de termos uma transição suave mantendo o foco no que é importante: servir os angolanos”, disse Miguel Geraldes, em declarações à Lusa. “Da minha nomeação, fiquei muito honrado e com grande entusiasmo poder contribuir para a continuidade do desenvolvimento da Unitel. Quero agradecer aos acionistas que me nomearam, bem como os felicitar a gestão cessante que tão bem desempenhou o seu trabalho”, disse o novo diretor-geral da operadora, que conta com 11 milhões de clientes no país e cerca de 4 mil colaboradores.
O gestor era até aqui o representante dos chineses da Huawei na África do Sul, mas antes disso, e durante 9 anos, foi diretor-geral da Mobile Telecommunications (MTC) Namibia. Entrou na operadora de telecomunicações namibiana através da Portugal Telecom, quando a empresa portuguesa comprou em 2006 uma participação de 34% do capital social da MTC, assumindo o controlo de gestão da operadora africana. Ativos que, com a combinação de negócio entre a PT e a Oi, transitaram para o universo da operadora brasileira. A posição acabou por passar em 2016 para o fundo Helios (sócio da PT na holding Africatel) que através da filial Samba chegou a acordo com a Oi.
No ano seguinte, Miguel Geraldes, que antes da MTC tinha estado durante cerca de 10 anos na TMN (hoje Meo), passa para a Huawei na África do Sul, sendo responsável por outros oito países da África subsaariana. “E tudo isso me dá a convicção para enfrentar este desafio com segurança”, afirma o gestor.
Português foi escolha da brasileira Oi
O português foi a escolha da brasileira Oi para o novo conselho de administração da Unitel, colocando-o na liderança executiva da companhia da qual detém uma posição de 25%. Depois de um longo braço de ferro com a operadora angolana, sob a presidência executiva de Isabel dos Santos (também acionista através da Vidatel), em que a Oi exigia poder nomear administradores para a companhia da qual detinha um quarto do capital. Desde 2006 que a PT Ventures/Oi não tinha um representante na administração da companhia.
Um conflito que se arrastava do tempo da PT. As relações entre os acionistas angolanos e a PT estavam em rutura desde 2007, altura em que foi criada a Africatel, empresa para onde a Portugal Telecom passou a participação na Unitel e que tinha como sócio o fundo Helios. Em março de 2017, em plena combinação de negócio entre a PT e a Oi, o na altura presidente da PT, Henrique Granadeiro, tornou pública a falha de pagamento de dividendos da Unitel à PT, na época na ordem dos 245 milhões. Desde 2011 que não eram pagos.
As relações não melhoraram com a combinação de negócio entre PT e Oi. A operação foi vista pelos acionistas da Unitel como uma quebra do acordo parassocial celebrado em dezembro de 2000 entre os acionistas e motivo para a compra da posição pelo seu valor patrimonial.
A tensão com a PT transitou assim para a Oi. E nunca se reduziu a intensidade, com a brasileira a levar o conflito entre acionistas e a falta de pagamento de dividendos para tribunais arbitrais internacionais.
A nomeação de um novo conselho de administração da Unitel ocorrida nesta semana foi o culminar de um braço de ferro que opunha a Oi à liderança da companhia. A assembleia-geral extraordinária que tirou da presidência Isabel dos Santos e levou à substituição do antigo diretor geral, Antony Dolton, foi precipitada por uma providência cautelar interposta pela PT Ventures (subsidiária da Oi) em fevereiro, solicitando a “nomeação urgente de um Administrador Judicial para atuar como órgão de administração da Unitel, em substituição do atual Conselho de Administração”, informou a Unitel em comunicado.
Mas outros acionistas de referência, como a angolana Sonangol, já davam sinais públicos de desconforto. Em fevereiro, o jornal Público noticiava que a Sonangol acusava a Vidatel, de Isabel dos Santos, e a Geni, de Leopoldino do Nascimento, de impedirem a nomeação de um novo conselho, quando o seu mandato já tinha caducado há um ano. “Em violação da lei, do contrato de sociedade e de obrigações contratuais, a Vidatel e a Geni, de forma intencional, impediram e continuam a impedir a eleição do novo conselho de administração da Unitel”, acusava a MSTelcom numa carta enviada ao então diretor-geral da Unitel, Antony Dolton, citada pelo Público.
Desde a última assembleia geral, os dois acionistas, Oi e Sonangol, passaram a ter três dos cinco administradores que compõem o conselho de administração: Miguel Geraldes (também diretor-geral) e Luiz Henrique Soares Rosa são os dois nomes propostos pela Oi; João Boa Francisco Quipipa é o representante da Sonangol (através da subsidiária MSTelecom). Isabel dos Santos mantém-se no conselho de administração, tendo ainda transitado do antigo conselho Amilcar Safeca (apontado como próximo do dono da Geni, o general Leopoldino do Nascimento).
Os desafios de Miguel Geraldes
Em maio surge logo um dos primeiros desafios que Miguel Geraldes vai ter em mãos: a eleição do futuro presidente do conselho de administração da Unitel. No dia 6 decorre a primeira reunião do conselho, cabendo aos administradores escolher o responsável máximo da operadora.
A eleição decorre da maioria dos votos, mas com a atual distribuição de forças no conselho, tudo indica, dizem fontes ouvidas pelo Dinheiro Vivo, que Isabel dos Santos não será reconduzida no cargo, devendo ser igualmente afastada de funções executivas na companhia.
Fontes próximas do processo ouvidas pelo Dinheiro Vivo, indicam que o pelouro das finanças na operadora ficará como o homem Sonangol, João Boa Francisco Quipipa, antigo presidente do Conselho Fiscal da petrolífera angolana e ex-secretário de Estado do Tesouro de Angola.
Com esta reconfiguração de poder na Unitel, a expectativa é que haja um apaziguamento das relações com acionistas como a Oi. Em cima da mesa, Miguel Geraldes tem em mãos o pagamento de 585 milhões de euros (660 milhões de dólares) à PT Ventures/Oi decidido pelo tribunal arbitral, decisão conhecida em fevereiro.
Segundo a informação, enviada à CMVM pela portuguesa Pharol (um dos principais acionistas da Oi), o Tribunal Arbitral reafirmou os “direitos da PT Ventures como acionista detentora de 25% do capital da Unitel”, empresa liderada pela angolana Isabel dos Santos, incluindo “o de nomear a maioria dos membros do Conselho de Administração da Unitel e o direito a receber dividendos passados e futuros da Unitel”.
O tribunal decidiu que os acionistas da Unitel paguem à PT Ventures “de forma conjunta e solidária” 339,4 milhões de dólares (cerca de 298 milhões de euros) correspondente à perda do valor da sua participação na Unitel, assim como juros desde 20 de fevereiro até a data do pagamento integral. Terão ainda de pagar outra tranche de 314,8 milhões de dólares (276 milhões de euros) por danos de não ter recebido dividendos, e “acrescidos de juros simples a partir das diferentes datas em que a PT Ventures deveria ter recebido tais dividendos, a uma taxa anual de 7%”. Por fim, de pagar “uma parcela substancial dos honorários e custos legais incorridos pela PT Ventures”, num valor líquido superior a 12 milhões de dólares (10,5 milhões de euros), “bem como 80% das taxas e despesas administrativas e dos árbitros, correspondendo a um pagamento líquido à PT Ventures em valor superior a um milhão de euros”.
Outro dos temas em mãos no mandato que termina a 2021 será a conclusão da cobertura de rede nas 542 comunas de Angola, um investimento de mil milhões de dólares (870 milhões de euros) iniciado em 2008, que, dizia em agosto do ano passado a empresa, estará concluída nos próximos dois ou três anos.
A companhia tem ainda de endereçar o desafio do 5G, num momento em que poderá enfrentar mais concorrentes a surgir no mercado. Desde final de 2017, que o governo tem em curso a privatização da Angola Telecom – que alargará o serviço de comunicações de rede fixa para a rede móvel – e o concurso para a atribuição de uma quarta licença para a rede móvel nacional, de voz e dados.
Fica por determinar se ainda durante o mandato do novo conselho de administração não haverá uma nova configuração acionista na Unitel. A Sonangol chegou a dizer publicamente que iria vender a sua posição, mas em fevereiro o presidente, Carlos Saturnino, reviu a posição. “Não é do interesse da Sonangol, para já, alienar a participação na Unitel. Há muitos interessados na compra da participação da empresa na Unitel, mas temos de defender o interesse do Estado [angolano]”, disse Carlos Saturnino, citado pela Lusa.
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