//Neutralidade carbónica vai custar mais de um bilião. Bancos chamados a financiar

Neutralidade carbónica vai custar mais de um bilião. Bancos chamados a financiar

Mais de um bilião de euros. Este é o valor de investimento estimado pelo ministro do Ambiente e da Transição Energética, João Pedro Matos Fernandes, para que seja possível atingir a neutralidade carbónica em Portugal até 2050, tal como o governo estabeleceu como meta para o país. Outro objetivo do Executivo passa por reduzir as emissões de gases com efeito de estufa em mais de 85% face a 2005.

Para isso, serão assim 27 a 29 mil milhões de euros de investimento por ano, só de acordo com a dinâmica de mercado (930 mil milhões que permitirão reduzir as emissões em 60%), a que se somam mais 86 mil milhões, ou seja, investimento extra anual entre os 2,1 e os 2,5 mil milhões para chegar aos 85%, cabendo a grande maioria aos privados – “empresas e famílias”.

A meio do século XXI, Portugal terá nas contas do governo “uma capacidade de sequestro de CO2 de 13 mega toneladas (hoje é de nove), ter 100% de energia elétrica produzida a partir de fontes renováveis, uma dependência energética do exterior de 20% (hoje de 75%), ter 100% dos veículo ligeiros com zero emissões, ter o financiamento privado à descarbonização e economia circular incorporado no sistema financeiro”, disse o ministro.

“O Estado deve facilitar esta transição, mas o sistema financeiro também tem de assumir o seu papel, incorporando nas suas políticas de investimento e na oferta de novos produtos financeiros os incentivos adequados para que as empresas e famílias consigam aceder ao investimento que necessitam para soluções com menores emissões de CO2. É essencial chamar o sistema financeiro português a este desafio”, disse Matos Fernandes na abertura da conferência “Roteiro Nacional para a Neutralidade Carbónica 2050 – O papel do financiamento sustentável”, em Lisboa. “Há que financiar o verde, o azul e o circular”.

Durante muito tempo ausente do debate, “foi com o Acordo de Paris que o sistema financeiro foi chamado pela primeira vez a contribuir para a resolução dos problemas ambientais”, disse o ministro.

Por seu lado, o governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, alertou na mesma conferência para a transferência de custos de investimentos do setor financeiro “que deviam ser suportados pelas gerações presentes” para as gerações futuras, numa conferência sobre financiamento sustentável que teve lugar na Fundação Gulbenkian.

“Estamos a fazer transferir para as gerações futuras custos que deviam ser suportados pelas gerações presentes”, disse Carlos Costa sobre a sustentabilidade de investimentos atuais, acrescentando que “o sistema financeiro pode exercer um papel disciplinador, ao exigir um retorno”.

O ministro do Ambiente também admitiu a transferência de custos para as gerações futuras. “Já estamos hoje a pagar os erros de alguém no passado”.

O governador considerou ainda que a questão da sustentabilidade financeira “é uma tarefa dividida entre a área política” e os “supervisores e reguladores” e apelou para “que não se peça ao sistema financeiro aquilo que não pode fazer” neste campo. “O sistema financeiro é parte interessada e contribuinte. E vamos contribuir na medida do nosso interesse”, frisou o governador.

“Não há desenvolvimento sustentado sem uma política social, ambiental e de governo que também seja sustentável”, disse Carlos Costa, reconhecendo que esse caminho evolutivo “pode demorar muitos anos, mas alguém pode pagar depois”.

Já sobre a interligação entre a sustentabilidade ambiental e financeira, Carlos Costa afirmou que “só é possível estabelecer ponte entre os dois se a política regulatória e a política em geral espelhar os balanços e as externalidades” ambientais, sociais e de governo. Ou seja, os bancos querem conhecer bem os riscos, antes de financiar projetos “verdes”.

“O envolvimento do Banco de Portugal e do sistema financeiro tem de ser entendido como simultaneamente interessado e comprometido”, garantiu Carlos Costa, reforçando a ideia de que “a insustentabilidade (…) será paga pelas gerações futuras”.

A intervenção do ministro e do governador do BdP antecedeu a assinatura da Carta de Compromisso para o Financiamento Sustentável em Portugal por parte de representantes do Banco de Portugal, Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF), Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), Associação de Empresas Emitentes de Valores Cotados em Mercado (AEM), Associação Portuguesa de Bancos (APB), Associação Portuguesa de Seguradores (APS), Associação Portuguesa de Fundos de Investimento, Pensões e Patrimónios (APFIPP) e Bolsa de Lisboa (Euronext Lisbon).

“É uma coisa histórica. Nenhum país do mundo fez isto”, comentou Matos Fernandes à margem da conferência.

O documento foi assinado também por administradores do BPI, Banco Montepio, Barclays, Novo Banco e Santander Totta, bem como pelos presidentes executivos da Caixa Geral de Depósitos (CGD), Paulo Macedo, do BCP, Miguel Maya, do Crédito Agrícola, Licínio Pina, e da Instituição Financeira de Desenvolvimento (também conhecida como banco de fomento), Henrique Cruz.

Pela parte do Governo, assinaram a carta o secretário de Estado da Defesa do Consumidor, João Torres, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, e o ministro do Ambiente e Transição Energética, João Pedro Matos Fernandes.

Com Lusa

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