Partilhareste artigo
“Estou farto de andar pelos melhores restaurantes do mundo, folhear as cartas de vinho dos fine dinings e estrelas Michelin e não ver lá vinhos portugueses.”
Habituado a negociar os melhores do mundo e com garrafeiras de milhões de euros no currículo, Cláudio Martins assumiu a missão de pôr o vinho português a ombrear com os melhores entre os melhores. Em qualidade e em preço. E revela que até já identificou um que está posicionado nos quatro dígitos: “São mais de mil euros por garrafa de 75cl, e ainda sem os investidores verem ou provarem o vinho, nem mesmo terem qualquer tipo de informação sobre ele, exceto que é português, já vendi a maioria das garrafas”, assegura.
É mesmo assim: os seus clientes são investidores – ainda que muitos bebam o investimento. Esta colheita, de que mais não revela senão que vem do Alentejo, faz parte do novo projeto de Cláudio, que ainda está no segredo dos deuses. Para já, fala da estratégia para cumprir o sonho de pôr Portugal no mapa do que de mais qualidade se vende por aí. Não é chavão, nem nada que já tenha sido tentado. O wine advisor português que viveu 20 anos em Londres, onde conheceu e se tornou amigo dos maiores investidores da City, que frequenta iates e jatos privados de sheiks e é visita de honra de CEO de multinacionais com salas forradas a quadros de Picasso, tem um projeto único. E que foi gerado na vontade de trazer algo ao país onde nasceu há 43 anos, em São Romão, Serra da Estrela: pôr vinho aqui produzido nas garrafeiras e nas carteiras de investimento das maiores fortunas do mundo, valorizá-lo e catapultá-lo ao patamar das estrelas.
“O setor do luxo está a crescer brutalmente, as pessoas querem experiências de qualidade, personalizadas, e este projeto é pensado ao detalhe”, explica. Agora como embaixador do Oeno Group em Portugal – firma inglesa de investimentos financeiros em vinho, com a qual geriu a aquisição de uma garrafa de 18 litros do bordalês Liber Pater (o vinho mais caro do mundo), estimado em 200 mil euros -, conta como se faz essa viagem em que embarcou há um par de anos, quando regressou a Portugal. “Passou a ser a minha missão de vida pessoal e profissional. Quero fazer algo pelo país. Se nos balizarmos cá em cima, vai haver quem queira comprar. Há sempre mercado para o melhor, independentemente de onde venha – e isso tem efeito de arrastamento: quem não consegue chegar a esse preço mas passa a reconhecer os nossos vinhos como produtos de qualidade de topo, vai comprar no patamar a seguir. Não quero fazer subir a pique os preços de todo o nosso vinho mas posicionar alguns deles numa categoria de luxo que ainda não existe, a ombrear com grandes Borgonhas e Toscanos.”
Subscrever newsletter
Passos e bem medidos e ganho de confiança
Com cerca de 700 clientes e a média das carteiras de investimento no patamar dos 50 mil euros, fundado por Michael Doerr e Daniel Carnio em 2016, o grupo Oeno conta com Cláudio para ajudar a chegar aos mil investidores neste ano. Há quem queira pôr mais dinheiro de uma vez, mas o wine advisor aconselha moderação: “Prefiro que vejam como isto funciona e invistam mais quando estiverem confortáveis. O que queremos é fazer eventos bem feitos, dois ou três por ano, com bons vinhos, pessoas giras que queiram investir, e ir mostrando o que somos e como investimos.” Numa segunda fase abrirá escritório em Lisboa e depois em São Paulo. Para conquistar a confiança, a estrutura do grupo sediado em plena City londrina, no magnífico edifício do Royal Exchange – onde abre portas, no dia 24, a Oeno House, loja física que será quase um museu de vinhos únicos no mundo, de Romanée-Conti a Cros Parantoux (Borgonhas), para club members e alguns clientes -, é chave.
“O Oeno tem três áreas que formam o ciclo completo e por isso é tão interessante”, explica Cláudio. “Compramos para os clientes, vendemos a outros investidores mas também através do nosso canal horeca interno, a restaurantes e hotéis de topo, e temos a parte do retalho. No investimento, a ligação com os produtores é fundamental para comprar bem. Só conseguindo o melhor preço pomos todos a ter margens, a ganhar dinheiro – sobretudo o cliente, em termos de progressão do vinho. E quanto mais ganhar o cliente ganha, mais reinvestirá.”
Se os investidores são escolhidos a dedo e há até no grupo uma estrutura antifraude para garantir que o dinheiro envolvido nestes negócios não vem de fontes pouco recomendáveis, o trade também não está aberto a qualquer pessoa, é preciso ser selecionado pelos embaixadores do Oeno. “Lidamos com vinhos de topo e se não houver pedigree não será fácil vendê-los, por isso preferimos escolher restaurantes e hotéis onde sabemos que terão saída a entregá-los a quem fique com eles guardados. Queremos que haja rotatividade dos vinhos; e consumo: isso é que faz que os preços disparem, sobretudo quando se trata de séries limitadas. Se são mil garrafas de uma marca e não se pode reproduzir, o mercado funciona.”
Mas há outros cuidados que garantem a credibilidade do grupo e a qualidade do investimento. Incluindo os três masters of wines exclusivos da empresa – só há 300 no mundo, sendo o grau atribuído desde 1960, mas Cláudio garante que está para sair do forno o primeiro português, o seu grande amigo Tiago Macena.
Há ainda uma estrutura de certificação independente que faz a verificação dos vinhos e educa quem os compra sobre a sua proveniência, propriedades e todo o tipo de detalhes minuciosos, de forma a assegurar que não há falsificações e falcatruas. Para proteger o valor do vinho, todas as garrafas que não são adquiridas para consumir são guardadas em condições ideais de conservação em bonded werehouses em Londres. “Se as levassem para casa, mesmo tendo o state of art das garrafeiras, não havia como garantir ao comprador seguinte que se mantinha o pedigree ou de fazer o tracking do vinho”, resume o wine advisor. É essencial que quem investe tenha a garantia de quanto vai valorizar-se daí a anos.
Quanto à escolha da carteira, à imagem dos produtos estruturados que a banca oferece, também aqui é preciso temperar um lado conservador – “ter os grandes nomes mundialmente reconhecidos, os Bordéus, os Borgonhas, os Toscanos, os Californianos” – com um olho para grandes produtos que vão surgindo. “E que podem até vir da China.”
Não é um exemplo casual, há mesmo alguns vinhos de topo a surgir nessa região, incluindo o Silver Heights e outros produzidos em Ningxia, que além da qualidade e das edições superlimitadas foram associados a uma boa estratégia de vendas: começaram fora do país, a ganhar medalhas, a ter boas críticas, a subir de preço… e os chineses, patriotas, querem-nos hoje a qualquer preço.
Levar Portugal ao mundo, trazer mundo a Portugal
Tornar-se embaixador do Oeno Group foi um passo importante no caminho que Cláudio Martins traçou e que passa por introduzir vinhos portugueses no portfolio. “Ainda somos conotados com o “bom, bonito e barato”, mas se fazemos tanta coisa bem feita, temos de nos posicionar. Não é sermos arrogantes, mas audazes, querermos sem ter medo de chegar a essa microcomunidade que não se importa de pagar por bons vinhos – e na qual felizmente estou muito presente. Temos imensa capacidade, diversidade de terroir, pessoas incríveis e podemos dar cartas. Se aceitei este desafio do Michael e do Daniel para trazer income ao grupo, também o fiz para poder introduzir vinhos portugueses tranquilos no portfolio.” Refere-se a Douros e Alentejos, por exemplo, que os Porto, sobretudo os grandes vintage, já ascenderam ao estrelato.
Tendo o grupo sido construído por dois investidores que haviam sido seus assistentes numa empresa de que era diretor de investimento, o wine advisor acompanhou o percurso do Oeno com orgulho acrescido a cada conquista, incluindo prémios como o de melhor empresa de investimento da Europa. O namoro foi crescendo com a apresentação de clientes seus ao grupo e virou casamento neste ano, no Dubai, quando o desafiaram a fazer algo mais em Portugal – com Lisboa a juntar-se a Londres, Nova Iorque, Bordéus, à Toscana, a Madrid e a Munique. E se por cá os investidores deste nível têm de se procurar com precisão cirúrgica, no Brasil, mercado que Cláudio vai acumular pela vantagem do idioma, “há-os como cogumelos”, pelo que o potencial se multiplica.
Conhecedores do mercado do luxo, os embaixadores do Oeno sabem que este negócio se faz na sala de estar dos clientes, a conviver com eles e com os vinhos. E não vão com demasiada sede à adega – uma estratégia que Cláudio aprendeu e segue há muito. “Ganho mais à mesa com um cliente, a beber um copo e com ele e os amigos, do que a ferir egos, a tentar ganhar muito de uma vez só. Se fizesse asneira, seria logo descartado, mas alimentando a confiança tornamo-nos amigos, próximos, imprescindíveis.”
Conta que um cliente cuja primeira encomenda balizou nas 150 mil libras – coisa pouca para a garrafeira que tinha – o questionou sobre a compra de vinhos de 30 euros – os preços baixos nestas lides desencorajam… Lá teve de explicar que se tratava de 24 garrafas de um produtor da Sicília que só tinha feito 600. A segunda encomenda desse multimilionário já ascendeu a 1,5 milhões. “Isto foi em 2014 e continua a pagar-me um fee mensal, apesar de já não o ver há três anos, porque estabelecemos uma relação de confiança e amizade.”
Nisto também conta a discrição a que este perfil de investidores obriga – e que o impede de revelar os sítios luxuosos onde faz negócio. Incluindo o escolhido para o primeiro evento em Portugal, que acontece na próxima semana, num local secreto. Mesmo aos convidados, ainda só foi revelada a cidade de Lisboa, para que possam aqui chegar e instalar-se. “O local está a ser construído para o evento e terá um chef Michelin a cozinhar para nós.” É o máximo que lhe arrancamos. Isso e que o core team do Oeno estará presente e até já fez encomendas. Mesmo sem conhecer os vinhos que Cláudio lá vai apresentar.
Deixe um comentário