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As grandes tecnológicas foram das principais beneficiadas da disrupção que tomou a economia de assalto por causa da covid, apesar dos problemas causados pela escassez de componentes e atrasos logísticos. Entre 2020 e 2021, os cinco titãs da tecnologia norte-americana – Amazon, Apple, Microsoft, Google e Facebook – surfaram uma onda que lhes trouxe incrível crescimento e muito cash flow. O índice tecnológico Nasdaq bateu recordes em novembro de 2021, altura em que registou ganhos de 23% no total do ano.
Mas este boom pode ter acabado. Na temporada de resultados que culminou nesta semana, os números foram mistos e a reação do mercado também. Das cinco big tech, a Meta, dona do Facebook, foi a mais castigada pelo desempenho dececionante no último trimestre. Para lá do núcleo duro, Netflix e Spotify tiveram trimestres desastrosos, a Intel reportou subidas mas foi fustigada pelo mercado, e a IBM deixou dúvidas quando não deu orientações de lucro por ação, apesar da boa performance.
O que se pode, então, concluir? A análise de Therese Poletti no MarketWatch indica que o crescimento exponencial bateu no teto. O Nasdaq está a sofrer alguma correção, tendo caído 12% desde o pico, em novembro, as estimativas para muitas tecnológicas em 2022 são mais baixas e o curto prazo apresenta desafios para os quais os CEO não têm soluções imediatas.
Foi o que ficou claro na apresentação de resultados da Meta, em que Mark Zuckerberg não conseguiu aliviar os receios dos investidores. A dona de Facebook, Instagram e WhatsApp reportou a subida de 20% na receita, para 33,6 mil milhões de dólares, com quebra de 8% nos lucros, para 10,28 mil milhões. Ambos foram piores do que esperado. Os números caíram tão mal em Wall Street que as ações afundaram mais de 22% nas trocas fora de horas e fecharam com uma incrível derrapagem de 26% na quinta-feira. A queda limpou 240 mil milhões de dólares do valor da empresa e arrastou consigo os maiores índices da bolsa norte-americana. Em causa esteve também uma série de avisos quanto aos obstáculos que vão abrandar a expansão da Meta num futuro próximo. Zuckerberg, sempre otimista, disse que a empresa está no bom caminho mas que há “ventos contrários” que vão atrofiar o crescimento – nomeadamente as mudanças que a Apple fez na plataforma iOS e reduziram de forma significativa a capacidade de monitorização dos utilizadores e recolha de dados sobre os mesmos, essencial para a personalização de anúncios. Novas regras de privacidade na Europa agravaram este problema e estão a obrigar a Meta a reconstruir a sua estratégia de venda de publicidade, o que significa que a precisão dos anúncios e o volume de impressões estarão reduzidas no curto prazo. Uma vez que a publicidade é a esmagadora maioria das receitas da Meta, o trimestre não parece rosado.
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Além disso, referiu Zuckerberg, a Meta está a redirecionar o seu foco para o segmento dos jovens adultos e elegeu o formato de vídeo Reels como o centro da sua estratégia. Mas monetizar os Reels é uma empreitada mais demorada que a monetização dos Stories e do Feed, e isso significa, novamente, que o crescimento de curto prazo será menor. Para completar o quadro, a divisão Reality Labs – que concentra os esforços para o metaverso – teve um prejuízo de 10,2 mil milhões no global de 2021.
O índice tecnológico Nasdaq caiu 12% depois de ter atingido um pico em novembro de 2021. As estimativas são mais baixas para muitas das tecnológicas em 2022.
Tudo somado, o tombo que a Meta deu em bolsa indica que os investidores estão pessimistas, algo que não aconteceu com a Amazon apesar de esta também ter falhado as previsões dos analistas no que toca a vendas. A retalhista registou uma subida de 9% para 137,4 mil milhões de dólares, abaixo do consenso e crescendo pela primeira vez desde 2017 apenas a um dígito. E deu orientações para o primeiro trimestre que ficam aquém da expectativa (112 a 117 mil milhões, contra 120 mil milhões).
Mas o lucro praticamente duplicou, para 14,3 mil milhões, fruto do investimento na construtora de carros elétricos Rivian Automotive, que teve uma dispersão em bolsa bem sucedida. E o mercado ficou satisfeito com os fortes indicadores da unidade de serviços na cloud, AWS, e a revelação de que o negócio de publicidade da Amazon disparou 32% para 9,7 mil milhões.
Google excede previsões, Netflix e Spotify desiludem
Foi também o bom desempenho da publicidade que entusiasmou os investidores quando a Alphabet, dona do Google, apresentou os números nesta semana de altos e baixos. A Alphabet teve certamente um alto com resultados sólidos: os lucros aumentaram 36% para 20,64 mil milhões e as receitas deram um salto de 32% para 75,32 mil milhões. Ambos superaram as expectativas, o que levou as ações a valorizarem 8% nas trocas fora de horas. A Alphabet saiu relativamente incólume das alterações de privacidade no iOS, com a publicidade a subir 32% e a valer 61,2 mil milhões. A empresa reportou ainda um forte desempenho da sua unidade de serviços na nuvem, com uma subida de 45% para receitas de 5,5 mil milhões.
E foi precisamente na nuvem que a Microsoft brilhou, com o crescimento de 26% para 18,33 milhões de dólares da unidade Intelligent Cloud, onde se insere a Azure. As receitas totais incharam 20% para 51,73 mil milhões e os lucros deram um salto de 21% para 18,77 mil milhões. Acima do esperado pelos analistas, o trimestre foi considerado muito robusto para a mais antiga de todas as big tech.
No entanto, foi a Apple que mais impressionou – e, de longe, a que mais lucrou – nesta temporada. A fabricante reportou o seu maior trimestre de sempre com vendas de 123,9 mil milhões (+11%), bem acima do consenso, e lucros de 34,6 mil milhões de dólares (+20%). Todas as categorias de produtos cresceram, salvo o iPad, e o iPhone voltou a ser o smartphone mais vendido do mundo, pondo a Apple no número um e destronando a Samsung. A empresa tem agora 785 milhões de assinantes dos seus serviços, mostrando aos investidores que a estratégia de diversificação está a ter bons resultados.
A Apple reportou o maior trimestre de sempre com vendas de 123,9 mil milhões (+11%) e lucros de 34,6 mil milhões (+20%). O iPhone foi o smartphone mais vendido no mundo.
O mesmo não pode ser dito para Netflix e Spotify, duas plataformas que ganharam bastante proeminência durante o confinamento. O Netflix reportou um abrandamento no crescimento do número de subscritores e previsões que deixaram os investidores aos gritos. Depois de ter adicionado 8,3 milhões de novos assinantes, atingindo 221,8 milhões no final de 2021, a empresa disse que só antevê ganhar 2,5 milhões de subscritores no primeiro trimestre de 2022. É menos de metade do que os analistas projetavam, o que levou as ações a tombarem 21,8% a seguir à previsão quase catastrófica.
E o Spotify não conseguiu melhor. A plataforma, que teve prejuízos de 7 milhões de euros, até obteve uma subida de 24% das receitas, para 2,16 mil milhões. Com 180 milhões de assinantes premium (+8 milhões no quarto trimestre), disse que prevê adicionar apenas 3 milhões neste trimestre, o que será um crescimento de 1,7%. Foi essa fraca perspetiva que assustou os investidores e levou as ações a cair 12% nas trocas fora de horas.
Descrita como “montanha russa”, esta temporada de resultados mostrou que a bonança de uns é o desastre de outros e que, dissipada a disrupção pandémica, podem emergir novos vencedores.
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