Diz o ditado que de génio e de louco todos temos um pouco. E os analistas e investidores questionam qual a característica que mais se adequa a Elon Musk. Até há bem pouco tempo era visto como um visionário e a Rolling Stone chegou mesmo a apelidá-lo do “arquiteto do futuro”. Mas, nos últimos meses, o líder da Tesla tomou decisões que prejudicaram as ações da empresa de carros elétricos.
Se as discussões com analistas nas conferências sobre os resultados trimestrais e as ameaças aos que apostam na descida das empresas já eram habituais, desta vez o líder da Tesla pisou o risco, segundo a SEC, o regulador dos mercados financeiros dos EUA. A 7 de agosto de agosto, Elon Musk escreveu no Twitter que iria tirar a Tesla de bolsa. Indicou mesmo que iria pagar 420 dólares por ação, cerca de 20% mais que a cotação da empresa naquela sessão. E garantiu que o financiamento estava assegurado.
Agora Musk enfrenta a mão pesada da SEC. O regulador classificou as informações veiculadas pelo líder da Tesla como “falsas e enganadoras”, na acusação divulgada na passada quinta-feira. E defende que “Musk sabia ou foi irresponsável em não saber” que estava a induzir os investidores em erro. Quer o pagamento de indemnizações e que o inventor fique impedido de ter cargos de administração em empresas cotadas.
Geralmente, quem comete ilegalidades no mercado americano e entra no radar da SEC opta por entrar em acordo. Paga-se uma multa avultada para o caso não chegar à Justiça e o assunto fica resolvido. Mas fontes citadas pela Reuters dizem que apesar de Musk estar disponível para entrar num acordo, está preparado para se defender em tribunal.
No entanto, em Wall Street as apostas são de que este caso acabará com Musk fora da Tesla e que o empreendedor irá cometer um “grande erro” se não aceitar um acordo com a SEC.
Um número para divertir a namorada
Musk defende que não fez nada de errado. A acusação da SEC reconhece que no início de 2017 o líder da Tesla teve reuniões com representantes do fundo soberano da Arábia Saudita para negociar um investimento de Riade. Musk garante que o principal responsável do fundo disse verbalmente que iria ser feito um grande investimento desde que fossem criadas fábricas no Médio Oriente.
Após meses sem reuniões, no final de julho Musk e o representante do fundo soberano saudita voltam a encontrar-se entre 30 a 45 minutos. É dito ao líder da Tesla que os sauditas compraram 5% da empresa e que poderão ter interesse em apoiar a saída de bolsa.
A partir daí, Musk descarrila. Sem confirmar a real disponibilidade saudita para a operação, os valores que poderiam estar envolvidos e sem documentação assinada o empresário assume que o negócio vai fazer-se, segundo a SEC. E envia mesmo um email ao administrador financeiro, a 2 de agosto, a dizer que há numa oferta para tirar a Tesla de bolsa 420 dólares.
As ações da Tesla valiam 298 dólares antes da reunião com o representante do fundo saudita. Musk explicou que os 420 dólares seriam uma forma de dar um prémio de 20% aos títulos, o que é usual nesse tipo de negociações. Mas a SEC nota que o valor correto seria de 358 dólares caso essa justificação fosse essa.
O regulador defende que Musk escolheu os 420 dólares devido ao simbolismo do número na cultura da marijuana (20 de abril é o Dia da Erva). Pensou que a namorada, a cantora Grimes, “acharia engraçado [o número], o que não é uma grande razão para escolher o preço”, disse o gestor segundo a acusação da SEC.
Acionistas divididos. Short sellers atacam
Apesar da imprevisibilidade de Musk, os acionistas da empresa têm receio de descobrir o que vale a Tesla sem o seu mentor. “O problema para os investidores é que um investimento na Tesla é um investimento em Elon Musk”, considerou, citado pela Reuters, John Wilson, analista da Cornerstone Capital, uma entidade que presta aconselhamento aos investidores.
Para os acionistas da empresa, o receio é descobrirem quanto menos vale a Tesla sem Elon Musk. Após a acusação da SEC, que pode culminar com a saída do presidente executivo da empresa, as ações tombaram quase 14% e o custo de comprar proteção par a dívida da Tesla atingiu máximos.
Esta incerteza tem sido um banquete para os grandes inimigos de Elon Musk, os short sellers, investidores que lucram com a queda das ações. Segundo dados da consultora S3 Partners, citados pela Reuters, há mais de dez mil milhões de dólares em apostas na desvalorização da Tesla, cerca de 26% do capital a empresa.
Esse número tem aumentado, apesar de a Tesla ser uma das empresas mais massacradas por este tipo de investidores. Mesmo com os prejuízos crónicos da construtora, a empresa chegou a ter em 2017 um valor de mercado superior a 60 mil milhões de dólares (um montante semelhante ao valor de todas as cotadas do PSI20).
Em 2017 a empresa perdeu quase dois mil milhões de dólares. E só no segundo trimestre deste ano, o prejuízo ultrapassou os 700 milhões de dólares. Na última década a Tesla fechou sempre no vermelho. Apesar das apostas na capacidade de Musk em mudar o futuro e de isso poder vir a render dinheiro, houve sempre muitos investidores a duvidar e a colocar pressão sobre as ações.
E Musk chegou mesmo a ameaça-los no Twitter de que iriam perder dinheiro porque iria ser revelada informação relevante sobre a Tesla que iria fazer as ações subir. Mas está a perder o braço de ferro e precisa de uma ideia de génio, ou de louco, para continuar em jogo e ao comando da Tesla.
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