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A tendência já vinha de trás, mas com a aceleração digital impulsionada pela pandemia, as fronteiras entre indústrias estão cada vez mais esbatidas. Na área das comunicações, este cenário representa uma ameaça ao negócio tradicional das operadoras, mas para aquelas abertas à mudança, é também uma grande oportunidade.
“São poucas as entidades melhor posicionadas que um operador de comunicações para servir de plataforma a esta digitalização de forma estruturada, recorrendo a um ecossistema de parceiros que deve incluir, para além dos integradores de sistemas e fornecedores de equipamentos, também os mesmos disruptores digitais que se apontam como concorrentes”, afirma Eduardo Fitas, vice-presidente da Accenture Portugal, responsável pela área de Comunicações, Media e Tecnologia.
Estes disruptores digitais são empresas como a Microsoft, Google ou AWS, mas também outras, com modelos digitais puros, que até nascem fora das comunicações, como, por exemplo, aponta Eduardo Fitas, a japonesa Rakuten, que começou no retalho.
Para as empresas tradicionais de telecomunicações só há um caminho a seguir para lidar com esta nova ameaça: fugir à chamada comoditização, ou seja, a uma situação em que a diferenciação para o cliente assenta apenas na qualidade da oferta e no preço. “Estamos claramente numa fase em que os operadores ou cooperam e ambicionam um posicionamento diferente, mais natural no mercado, ou tentam concorrer diretamente com estas entidades e assumem um papel cada vez mais de gestor de uma infraestrutura, preparando-se para um negócio comoditizado”, sublinha Eduardo Fitas.
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As operadoras, com a sua “base de clientes notável sobre a qual têm muita informação, e que ao contrário do que se comenta frequentemente, e de acordo com os estudos do setor, apresenta níveis de satisfação elevados”, sublinha o responsável da Accenture, estão numa situação privilegiada para dar o salto de telco para techo. “O primeiro passo e talvez o mais difícil na evolução de uma telco para uma techo é precisamente querer fazê-lo. Apesar de ser evidente que os custos de estagnar no modelo atual são mais que reais e da posição ímpar que assumem no mercado para arrancar com este processo de transformação do seu modelo de negócio, a inércia das organizações, uma cultura de aversão ao risco, que infelizmente nos caracteriza, e a pressão para os resultados imediatos, impedem muitas vezes estas decisões”.
Este novo modelo de negócio “passa por definir uma estratégia e por criar um modelo de plataforma para operar no mercado, alicerçado na utilização inteligente e intensiva da tecnologia atualmente disponível. Para isso é necessário transformar em conhecimento toda a informação que se tem sobre os clientes, para desenvolver os produtos que necessita e entregá-los através de uma experiência única e diferenciadora e no momento exato”, diz ainda Eduardo Fitas. “Cada vez mais um cliente não compara ofertas entre operadores de comunicações quando procura ajuda para transformar o seu negócio ou para selecionar um produto para a sua casa. Compara um operador de comunicações com empresas como a Google, AWS ou Microsoft quando decide o que fazer com a sua infraestrutura tecnológica ou com Netflix, Disney ou Amazon, por exemplo, quando decide onde investir para aceder a conteúdos”.
“E no caso de cada um de nós, cada vez menos a ligação de banda larga e cada vez mais quem é que nós queremos que nos ajude a “conectar” a nossa casa com acesso a conteúdos, mas também com domótica, fornecimento de energia ou serviços de segurança. Tudo isto obriga a uma diversificação e extensão dos negócios”.
5G, mudança de paradigma
A quinta geração móvel bem mudar as regras do jogo, associada a outros desenvolvimentos tecnológicos. “Por si só o 5G já tem capacidade para criar uma disrupção no mercado, mas se o juntarmos à virtualização das infraestruturas (cloud), às capacidades de inteligência artificial, ao aumento da rapidez de processamento de informação, às capacidades analíticas, ao IoT ou à robótica para referir algumas das tecnologias que atingiram níveis de maturidade elevada nos últimos tempos, o potencial é de facto disruptivo”.
O atraso no arranque desta tecnologia em Portugal não traz vantagens, sublinha Eduardo Fitas, mas “o problema pode ser ainda maior pela forma como serão feitos os investimentos que permitem a sua rentabilização”. Em concreto, o responsável da Accenture aponta o investimento que será necessário fazer-se por entidades públicas e privadas, “e que idealmente deveria ir muito além de disponibilizar a conectividade. Por exemplo, a criação de uma plataforma que suporte ensino ou medicina à distância vai exigir um investimento inicial que será recuperado posteriormente com a prestação de um serviço”.
E avisa: “Se os operadores de comunicações veem a sua capacidade de investimento impactada pelas alterações resultantes do atraso, pelos custos de acesso a espetro ou pela forma como se gere o lançamento do 5G em Portugal, obviamente a sua motivação ou mesmo os meios disponíveis para suportar a criação destas plataformas será significativamente menor. E este é um tema que, a somar aos atrasos, também nos deve preocupar”.
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