Ainda antes de declarar o “estado de alerta” em todo o país por causa da pandemia do novo coronavírus, na última sexta-feira de madrugada, o governo decidiu avançar dias antes com medidas de “mitigação” para aliviar a vida das empresas nesta crise.
Uma delas é a possibilidade de os empresários poderem, de forma “simplificada” e rápida, reduzir o horário de trabalho do pessoal ou, no pior dos casos, suspender temporariamente o trabalho dos funcionários. O lay-off assume estas duas formas, basicamente.
No entanto, estas medidas excecionais decretadas ao abrigo da luta contra os efeitos destruidores do vírus na economia e no emprego já estavam a ser profusamente usadas pelos empresários portugueses e de forma mais intensa em 2019. Ainda que não nesta forma simplificada que o governo vai pôr agora ao dispor das companhias.
De acordo com um levantamento feito pelo Dinheiro Vivo dos dados oficiais consolidados anuais, o número de pessoas em lay-off na modalidade de redução de horário disparou 35% em 2019, naquele que é o maior aumento desde 2012, o segundo ano do programa de austeridade da troika e do governo PSD-CDS.
O Ministério do Trabalho e da Segurança Social indica que, no ano passado, foram registados 3306 casos de redução de horário, o maior valor desde 2014. Este número foi compensado pela quebra para 656 casos na modalidade da suspensão temporária de trabalho em 2019, que é a opção mais radical.
No entanto, agora que o governo anunciou a agilização do recurso ao lay-off (ainda não há diploma, mas estará para breve), já há empresas a anunciar que o vão fazer mesmo. É o caso da companhia de transportes coletivos Auto-Viação Feirense, de Santa Maria da Feira, que também opera viagens turísticas internacionais.
De acordo com a Lusa, a transportadora anunciou ontem “a suspensão temporária do contrato laboral de 195 dos seus funcionários, 30 dos quais retidos no estrangeiro”. A administração da empresa diz que o lay-off acontece “pelo facto de o seu serviço de transporte turístico para grupos internacionais, que constitui a principal área de negócio, estar parado desde o final de janeiro”.
Os mesmos dados do ministério de Ana Mendes Godinho mostram ainda que o número de empresas a recorrer a lay-off (redução de horário e suspensão de trabalho) também aumentou em 2019, para 154 casos. É o primeiro agravamento desde 2012, indicam as séries cronológicas.
E agora, como referido, o governo vem simplificar ainda mais o recurso a este regime, mas o ambiente de crise laboral já se estava a instalar mesmo antes de chegar a pandemia.
Uma crise que já fermentava antes da pandemia
Tal como já noticiou o Dinheiro Vivo, mesmo antes desta crise grave do coronavírus, já existiam inúmeros sinais de degradação das condições da economia e do mercado de trabalho.
A taxa de desemprego portuguesa terminou o ano a subir de forma pronunciada após muitos trimestres de queda. Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), o peso do desemprego na população ativa agravou-se de 6,1% no terceiro trimestre para 6,7% no último trimestre do ano passado. Isto fez com que o número de pessoas sem trabalho aumentasse pela primeira vez em mais de seis anos entre o último trimestre de 2018 e igual período do ano passado.
Os despedimentos coletivos também voltaram em força, mesmo antes da chegada do vírus. O número de pessoas que ficaram sem trabalho subiu em 2019, pelo segundo ano consecutivo, até aos 3616 casos.
A região mais fustigada (em 2019) foi o Norte, onde 123 empresas conseguiram concluir os respetivos processos de despedimento coletivo, tendo ficado sem trabalho 1506 pessoas, mais 80% do que em 2018.
O que anunciou o governo
Esta semana, o governo decidiu avançar com um “regime de lay-off simplificado para as empresas que vejam a sua atividade severamente afetada devido à epidemia, por via do qual os trabalhadores terão a garantia de retribuições ilíquidas [ordenados brutos] equivalentes a dois terços do salário até 1905 euros, 30% suportado pelo empregador e 70% pela Segurança Social, até um máximo de seis meses”.
A ministra do Trabalho explicou que para aceder a este mecanismo “terá de existir uma quebra de vendas superior a 40% e, nestas situações, teremos um regime simplificado de lay-off ao qual se pode acumular também um processo especial de formação dos trabalhadores”.
Ana Mendes Godinho disse ainda que se prevê “a possibilidade extraordinária de, durante o período de lay-off, as entidades empregadoras ficarem isentas de Taxa Social Única (TSU)”. No caso dos patrões, essa taxa é 23,75% do salário bruto do trabalhador.
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