Patrões e sindicatos da construção já acordaram sentarem-se à mesa em setembro para renegociar a contratação coletiva. O objetivo é, 40 anos depois, fazer uma revisão completa, designadamente dos 150 níveis e subníveis profissionais existentes na construção, reduzindo-os e diferenciando-os salarialmente. As associações patronais parecem estar disponíveis para uma atualização mínima de 10%, mas que pode chegar ao triplo nos trabalhadores qualificados. Hoje o salário base é de 606 euros, igual para todos; as empresas estão dispostas a subir para 800 euros para os operários qualificados, um aumento de 194 euros. Os sindicatos querem mais.
Ao nível dos princípios, patrões e sindicatos concordam que é preciso repor a diferença, que rondava os 80 euros, entre os operários qualificados e os não qualificados, gap que desapareceu por via do aumento do salário mínimo nacional. Nesta lógica, da parte das empresas há uma abertura para que a nova tabela possa contemplar um salário base de 660 euros para os serventes. O que, aplicando o tal princípio da diferenciação de especialização, empurraria para os 720 e os 800 euros, respetivamente, o vencimento dos operários de segunda e primeira categoria (pedreiros, eletricistas, carpinteiros, etc, com mais ou menos anos de experiência).
O aumento de 60 euros para os serventes parece agradar ao sindicato da construção, mas Albano Ribeiro, o presidente, não esconde que pretende ir mais longe, fixando um mínimo de 900 euros para os operários de primeira. “Só assim poderemos contribuir alguma coisa para diminuir a emigração e para dignificar e valorizar os trabalhadores da construção”, argumenta.
Estes valores são meramente indicativos e estão até, em muitos casos, já desajustados da realidade. “Ninguém paga menos de 800 euros já hoje a um carpinteiro ou a um pedreiro, até porque não os há. E no caso dos eletricistas e montadores de ar condicionado estamos a falar de salários já perto dos mil euros”, garante um empresário.
Os números do INE parecem confirmá-lo, apontando para uma remuneração bruta mensal regular por trabalhador na construção de 785 euros. Um ano antes estava nos 765 euros e há três nos 743 euros. O sindicato alerta para o facto de este ser um valor global, que inclui as categorias mais bem pagas, como os engenheiros e os arquitetos, e, por isso enganador.
Mas a falta de mão-de-obra disponível é uma realidade – estima-se que haja 70 mil profissionais em falta – e inflaciona os vencimentos. Mas é, sobretudo, um travão ao crescimento da indústria, defendem as empresas. Albano Ribeiro aponta o dedo à precariedade e aos angariadores de mão-de-obra. “O trabalho clandestino na construção ultrapassa os 40%. Há milhares de trabalhadores estrangeiros, sobretudo brasileiros, indianos e africanos, que chegam através de angariadores e que não estão registados em lado nenhum, nem descontam para a Segurança Social, nem recebem férias ou quaisquer outros direitos”.
Para o sindicalista, é urgente promover uma “aproximação dos salários nacionais aos europeus”, de modo a permitir reter os mais qualificados. “Cada dia que passa os bons profissionais emigram porque vão ganhar três vezes mais lá fora. Mais 300 mil desses operários deixaram o país, porque vão à segunda e regressam à sexta para França ou para a Alemanha e ganham três mil euros ao mês”.
Albano Ribeiro lamenta a falta de sensibilidade dos eurodeputados portugueses para esta realidade. “Lançámos, recentemente, um desafio aos cabeças de lista dos vários partidos às eleições europeias para que viessem ao Porto debater o tema dos salários. Queríamos que eles, que ganham tanto como os eurodeputados alemães e franceses, levassem uma proposta ao Parlamento Europeu de aproximação de salários à média europeia para travar a emigração. Lamentavelmente, só o PS respondeu positivamente. Não admira que a abstenção às eleições europeias tenha sido de 70%”.
Albano duvida que o Programa Regressar, através do qual o Governo atribui um incentivo de 6500 euros aos emigrantes que estejam disponíveis a voltar, tenha grande adesão no segmento da construção. “Os que estão a trabalhar na Alemanha ganham 36 mil euros por ano. Aqui, receberiam 7000 ou pouco mais do que isso. Claro que não vêm. Concordo com a iniciativa, mas é completamente insuficiente”, considera.
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