//Trabalhadores da Cultura discutem novo estatuto com o governo

Trabalhadores da Cultura discutem novo estatuto com o governo

O governo volta a reunir-se esta terça-feira com o sector da cultura para discutir a criação de um estatuto profissional para um dos sectores com maior impacto da crise pandémica e que reclama maior proteção social e nos vínculos de emprego. Será a terceira reunião para discutir um estatuto próprio para os trabalhadores, previsto no Programa de Estabilização Económica e Social (PEES) aprovado este verão.

A reunião, marcada para o Palácio da Ajuda, é liderada pela ministra da Cultura, Graça Fonseca. O grupo de trabalho integra ainda a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, e o secretário de Estado para os Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, além de vários organismos destas tutelas, sindicatos e associações que representam os vários sectores da cultura.

A convocatória às organizações do sector não traz um documento para análise, mas as expectativas são altas para a resolução da situação de centenas de trabalhadores precários e informais que, devido à pandemia, ficaram sem apoios ou acesso a subsídio de desemprego.

A definição de um estatuto próprio permitiria um novo enquadramento de proteção social para um sector que vive numa “falsa sensação de independência” alimentada a recibos verdes, diz Rui Galveias, da direção do Sindicato dos Trabalhadores de Espetáculos, do Audiovisual e dos Músicos (CENA-STE), uma das organizações que integram o grupo de trabalho.

Contactado pelo Dinheiro Vivo nos últimos meses, o Ministério da Cultura não deu conta do que poderá vir a representar este novo estatuto em termos de enquadramento laboral ou na Segurança Social. “A Ministra da Cultura considera que o trabalho para a elaboração do Estatuto do Trabalhador da Cultura é uma peça decisiva para o futuro do setor, tal como consta do PEES aprovado em Conselho de Ministros”, referiu apenas o ministério de Graça Franco.

Também o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, que prepara um Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho com a questão dos trabalhadores das plataformas digitais na agenda, não indicou até aqui se poderá haver articulação destas matérias que envolvem grupos marcados por relações de trabalho mais indefinidas e menor proteção social. Questionado pelo Dinheiro Vivo em agosto, não respondeu até aqui.

No caso dos trabalhadores da Cultura, o CENA-STE lembra que estes “foram toda a vida trabalhadores de alguém e ficam completamente desprotegidos”. “É o resultado desta normalização do recibo verde”, entende, defendendo como prioridades assegurar o acesso aos subsídio de desemprego e ao subsídio de doença de forma adequada para estes percursos marcados por forte irregularidade nas carreiras contributivas. Rui Galveias afirma que se “80% dos trabalhadores se tivessem contrato de trabalho normal hoje não estariam na situação em que estão”.

“O trabalho independente aplica-se a meia dúzia de pessoas do sector. A maior parte dos técnicos e profissionais que montam e fazem espetáculos em Portugal, inclusivamente atores, não são independentes. Têm local de trabalho. Pode estar sempre a mudar de sítio, mas têm alguém que lhes dá um horário, ferramentas para trabalhar e uma organização de vida muitas vezes muito complexa que não é o trabalhador que decide”, defende.

Para o CENA-STE, a solução para os trabalhadores reside em boa parte num aumento dos apoios da Direção-Geral das Artes para que as companhias portuguesas possam ter condições de contratar efetivamente o pessoal com que trabalham. “Resolveria grande parte dos problemas”, diz Rui Galveias.

Além disso, o sindicato pede uma solução para que muitos trabalhadores informais do sector possam reatar com a Segurança Social – onde, em muitos casos, deixaram dívidas. E, por fim, “é preciso garantir que haja condições para a contratação, que isso seja a norma, e que o recibo verde seja uma escolha”.

O sindicato lembra também que o governo se comprometeu com um mapeamento dos profissionais do sector ao longo de três anos e com a realização de um questionário aos mesmos a partir de setembro, sem os quais considera difícil haver um novo estatuto profissional. “Para criar um estatuto que implica uma especificidade, que tem que ver com as questões profissionais, com o tempo de trabalho, o tipo de contratação, era importante conhecer”, diz Rui Galveias.

Além do CENA-STE, integram o grupo de trabalho do governo a Associação Portuguesa de Realizadores (APR), o Agrupamento Português de Técnicos do Audiovisual (APTA), a Associação de Produtores de Cinema e Audiovisual (APCA), a Associação de Produtores Independentes de Televisão (APIT), a PLATEIA, a Rede – Associação de Estruturas para a Dança Contemporânea, a PERFORMART – Associação para as Artes Performativas em Portugal e a Acesso Cultura.

De acordo com o Ministério da Cultura, para além das entidades que fazem parte do grupo de trabalho, estão em curso as audições de entidades representativas do setor, até ao final do ano.

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