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O fim do segundo confinamento acabou com a paz social que reinava nos transportes públicos há mais de um ano. Desde o início de maio não há semana sem greve de 24 horas, parcial ou ao trabalho extraordinário. A federação de sindicatos do setor exige ao Governo a subida dos salários.
O ministro das Infraestruturas admite que não pode “resolver tudo”. Nas próximas duas semanas são esperadas mais greves a nível nacional e nas regiões de Lisboa e do Porto.
A CP é a empresa mais visada: nos últimos 45 dias, teve duas semanas de greve ao trabalho extraordinário e mais cinco dias de paralisações de 24 horas. A transportadora ferroviária sofreu ainda com as greves na Infraestruturas de Portugal (IP), da qual depende para pôr os comboios a circular.
Afeto à CGTP e filiado na federação de sindicatos dos Transportes e Comunicações (FECTRANS), o Sindicato Nacional dos Trabalhadores do Setor Ferroviário (SNTSF) tem sido o principal protagonista destas paralisações.
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Ao Dinheiro Vivo, o coordenador da federação, José Manuel Oliveira, explica como os salários dos trabalhadores dos transportes estão cada vez mais próximos do salário mínimo nacional, de 665 euros.
“Há uma evidente desvalorização dos trabalhadores. Há categorias profissionais com diferentes responsabilidades e que estão a ficar com o mesmo salário de funções menos valorizadas e com menos qualificações”, alerta.
O dirigente lembra que, em 2000, estes trabalhadores “ganhavam 1,8 vezes o valor do salário mínimo no nível de entrada; em 2021, é apenas 1,2 vezes. O salário mínimo nacional tem aumentado mas não não tem sido recompensado o trabalho de nível técnico.”
Greves marcadas
Para as próximas duas semanas, está prevista a greve de três horas por turno na quarta e na quinta para a Transtejo/Soflusa; na semana seguinte, dia 24, o Metro de Lisboa não vai circular na hora de ponta da manhã e mesmo para o feriado de São João há um pré-aviso de greve para o Metro do Porto. A próxima semana termina, dia 25, com mais uma greve de 24 horas para a CP e a IP.
Afastando uma ligação entre as greves e as eleições autárquicas, o dirigente sindical admite o momento “mais intenso, que corresponde ao adiamento de medidas que o Governo tem evitado avançar. O aumento dos salários para recuperar dos níveis de 2009 não foi cumprido”.
“Não podemos resolver tudo”
Em fevereiro do ano passado, na véspera da pandemia, o ministro das Infraestruturas conseguiu novos acordos de empresa com todos os sindicatos da CP, resolvendo um impasse que durava há praticamente duas décadas. Mais de um ano depois, Pedro Nuno Santos admite que não será possível resolver todos os problemas de imediato.
“Temos muito respeito por quem trabalha nas empresas públicas, na CP e IP, e levamos muito a sério a contestação e a insatisfação dos trabalhadores. […] “O país está a enfrentar dificuldades transversais a toda a economia, infelizmente não podemos resolver tudo, em Portugal ganha-se muito pouco e isto é um dos problemas que todos temos”, referiu na semana passada o ministro, citado pela Lusa.
O sociólogo Elísio Estanque lembra que os transportes públicos “são um dos setores mais sensíveis e onde há mais dificuldade em lidar com a situação pelas autoridades para impedir um impacto tão grande” das greves. Ao Dinheiro Vivo, o investigador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra assinala que “a vontade de marcar a agenda laboral e reivindicativa” é a razão para esta sucessão de greves.
Elísio Estanque defende que, mesmo que “a economia ainda não tenha condições para responder a todas as reivindicações”, que “mais cultura democrática e política poderia conter” a contestação. Ou seja, “os atores e instituições que governam não podem cortar os canais de diálogo e de negociação porque a greve é a continuação da negociação por outros meios”.
Governo e sindicatos voltam a reunir-se na próxima semana para tentar corresponder às expetativas dos trabalhadores e tentar retomar a rota da paz social.
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