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Altamente capacitadas na área de ESG (sigla inglesa para Environmental, Social e Governance), Alice Khouri, Filipa Pantaleão e Rita Rendeiro fundaram o Women in ESG Portugal, movimento cívico que, através da criação de uma lista, pretende construir uma comunidade de mulheres com background nestas matérias, promover a partilha de conhecimento, descomplicar estes temas e lutar pela igualdade de género.
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Em conversa com o Dinheiro Vivo, Alice Khouri, advogada e professora, explica a cronologia que levou ao “momento eureka”. Tudo começou quando foi nomeada para uma lista chamada “Sim, elas existem”, que reunia os currículos de mulheres aptas a ocupar altos cargos na área da energia no Brasil. A iniciativa foi “em resposta a um momento político específico, o facto de Bolsonaro [ex-presidente do Brasil] só ter nomeado homens para a pasta da Energia, em 2019”, explica.
Desde aí ficou com vontade de criar algo semelhante em Portugal, mas o clique deu-se depois de ter voltado da COP27 (Conferência das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas). “Voltei indignada com muita coisa, fui ler uns relatórios e os números assustaram-me, foi aí que lhes liguei para criarmos esta iniciativa”.
O Women in ESG Portugal nasce a 16 de novembro do ano passado, e passados apenas 22 dias já tinha um site funcional, vários embaixadores de peso e uma agenda claramente orientada para “integrar a perspetiva da igualdade de género no dia-a-dia, sem nunca esquecer os temas de ESG”, conta Filipa Pantaleão, engenheira do Ambiente.
A iniciativa surge para colmatar a falta de diversidade em cargos na área de ESG, mas também para eliminar as diferenças salariais entre homens e mulheres que desempenham exatamente as mesmas funções. “Uma mulher que nunca foi discriminada é uma mulher distraída”, atira Alice Khouri.
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Do ponto de vista de benefício económico para as mulheres desta lista, a iniciativa “vai dar retorno a nível de oportunidades de trabalho”, porque se trata de uma comunidade constituída por mulheres que contratam e que querem ser contratadas, “é um ecossistema vivo em termos de negócio”, afirma Alice Khouri.
A lista não tem por objetivo ser um ranking nem algo elitista, é antes “a expressão da vontade de criar uma comunidade de mulheres ativas nestas áreas e potenciá-las”, explica Rita Rendeiro, operating partner do fundo Maingreen Capital Partners e presidente e co-fundadora da Associação Direito Mental.
A participação não será limitada aos cargos de topo ou a formações académicas, “quanto mais diversificada for a comunidade, mais rica vai ser pela partilha de conhecimento”, afirma.
Ao contrário do que aconteceu no Brasil, esta lista não é a resposta a um momento, mas sim, “uma preparação cívica para acelerar a agenda ESG em Portugal e a igualdade de género”, sublinha Khouri.
É também uma meta imposta pela União Europeia na diretiva Women on Board, aprovada a 22 de novembro, que estabelece que até 2026 as empresas devem ter uma quota de 40% do sexo sub-representado entre os diretores não executivos, e 33,33% entre todos os diretores.
Quotas: solução ideal ou mal necessário?
De acordo com o estudo “A diversidade de género nas empresas em Portugal”, lançado pela Informa D&B em março de 2022, o setor ligado à energia e ao ambiente é ainda dominado por homens. Aliás, 82% dos cargos de gestão nestas áreas são ocupados por homens e apenas 18% por mulheres, demonstrando uma clara disparidade de género.
“Dizem que as mulheres não gostam de ocupar cargos de direção, que não querem essa responsabilidade”, mas o Women in ESG Portugal é o movimento cívico que vai permitir que as pessoas ouçam de viva-voz que “sim, elas querem e têm competências”, afirma Rita Rendeiro.
É por isso que considera que as quotas são “um instrumento de aceleração”, não são a solução ideal, mas “um mal necessário”, porque há pessoas muito boas a ficar pelo caminho, sublinha. “A diretiva europeia com os 40% não administrativos já existia e não foi suficiente.” Para Alice Khouri, as quotas são como o antibiótico necessário para combater a infeção e o sistema de meritocracia “só vai fazer sentido quando as pessoas partirem de condições iguais”, reforça.
Filipa Pantaleão já teve uma opinião diferente sobre as quotas: “Se me perguntassem há dez anos, diria que não precisamos, mas a verdade é que há mais mulheres formadas que homens. O que é que está errado? A formação ou a igualdade de oportunidades?”
Apesar das evidentes desigualdades de género na área de ESG e no mercado de trabalho em geral, esta tríade de mulheres de energia não perde a esperança e acredita que Portugal vai atingir as metas em 2026. “Somos sonhadoras, acreditamos que trazer luz sobre o assunto vai tornar cada vez mais difícil criar desigualdades”, dizem.
Por um futuro mais igualitário
Alice Khouri, Filipa Pantaleão e Rita Rendeiro criaram uma iniciativa de mulheres para mulheres, um projeto financiado com recursos próprios e uma agenda recheada para descomplicar o ESG em Portugal.
A 2 de março vão oficializar o projeto com um evento de lançamento com uma masterclass, vão promover talks ligadas aos temas de ESG e igualdade de género durante o primeiro semestre de 2023 e, depois do verão, pretendem realizar uma conferência que permita o networking e a partilha de experiências e conhecimentos.
Para futuro, idealizam um mundo onde a cooperação seja o catalisador para o desenvolvimento da sociedade e para o bem comum e onde as mulheres não se limitem. “A sociedade já nos limita o suficiente com os seus rótulos, exijam igualdade”, rematam.
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